Quarta-feira, 12 de fevereiro de 2025 - 14h59
Vivemos uma crise climática cujos
reflexos colocam em risco a própria sobrevivência dos moradores do planeta
Terra. O principal responsável pelos desastres climáticos que assolam todos
continentes é o aquecimento global, provocado pelo uso dos combustíveis
fósseis, maiores emissores de gases de efeito estufa (GEE’s), e pelas mudanças
de uso da terra, o que significa a destruição dos recursos naturais, das
florestas, pela ação humana, que prioriza o lucro em detrimento do meio
ambiente.
A inexistência de uma governança
mundial com foco na proteção ambiental e falta de responsabilização histórica
dos países desenvolvidos e das corporações, por serem os maiores emissores de
GEE’s, acabam dificultando e criando obstáculos para as ações apontadas pela
ciência como necessárias ao enfrentamento da crise climática. É importante,
também, contrapor a macabra aliança entre os
interesses ligados ao petróleo, gás natural, carvão mineral e o agronegócio
predatório e ganancioso.
É condição necessária e urgente
banir o uso dos combustíveis fósseis e alcançar o desmatamento zero com
mudanças substanciais no modo de vida da sociedade, de como produz e de como
consome. Constata-se que foram boicotados, ineficazes e insuficientes os
discursos, os acordos (Paris) e compromissos assumidos pelas nações para
atender as metas de redução dos GEE’s.
No Brasil, a Constituição
Federal, no artigo 23, estabelece a co-responsabilidade entre União, Estados,
Distrito Federal e Municípios com a proteção ambiental. O que implica que todas
as esferas do Poder Público devem promover o equilíbrio ambiental como garantia
de que as gerações futuras poderão desfrutar do planeta. Portanto, o papel dos
municípios é fundamental no desenvolvimento e implementação de políticas
públicas ambientais no contexto da emergência climática.
É nos municípios que a vida se
desenvolve, que a realidade está presente, onde as pessoas vivem, moram, os
adultos trabalham, as crianças estudam, e onde os serviços públicos são
prestados aos moradores das áreas urbanas e rurais. Também, é neste território
que os efeitos mais perversos das mudanças climáticas afetam os moradores.
Alarmante foi o resultado de
recente levantamento da Confederação Nacional dos Municípios que destacou: só
dois em cada dez municípios estão preparados para enfrentar os impactos das
mudanças climáticas. Situação que impõe a intensificação de estratégias e ações
urgentes para reverter este sinistro resultado, evitando assim que populações
mais vulneráveis, mais pobres, continuem a ser as mais castigadas.
Segundo o IBGE o país conta com
5.570 municípios, sendo 1.477 no semiárido (Conselho Deliberativo da Sudene,
resolução no 176 de 03/01/2024). Reconhecido como o mais populoso do
mundo, o semiárido conta com 28 milhões de habitantes, divididos entre zona
urbana-62% e rural-38%, ocupando 11% do território nacional. Abrange os estados
de Alagoas (42 municípios), Bahia (287), Ceará (175), Maranhão (16), Minas
Gerais (217), Paraíba (198), Pernambuco (142), Piauí (216), Rio Grande do Norte
(148), Sergipe (30), Espírito Santo (6). A maior parte localizada no Nordeste e
uma pequena parte no Sudeste.
Um dos fatores mais preocupantes
e emergenciais do semiárido é, sem dúvida, a significativa expansão de áreas
áridas, relacionadas à redução de chuvas, efeito mais dramático das mudanças no
clima neste bioma. Solos severamente degradados (desertificados) têm-se
expandido, assim como áreas semiáridas, devido a perdas de áreas do Agreste.
O efeito combinado do
desmatamento e do aumento da temperatura tem expandido mais ainda a condição de
aridez na região. A desertificação coloca em risco a segurança alimentar, pois
reduz a produtividade agrícola, levando à fome e à desnutrição. Com a falta de
água a situação é agravada. A perda de terras férteis causa o desemprego e a
migração forçada, verificada nos últimos Censos do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE) com a população rural.
Transformações do Bioma Caatinga,
levou à recente identificação do primeiro clima árido (falta crônica e
permanente de umidade) no país. Estudos realizados pelo Centro Nacional de
Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) e o Instituto Nacional
de Pesquisas Espaciais (Inpe), revelaram que se tornaram efetivamente áreas
áridas quase 6.000 km2, localizadas no centro-norte da Bahia,
atingindo os municípios de Abaré, Chorrochó e Macururé.
É assustador a perda da cobertura
vegetal no Bioma Caatinga ao longo dos anos, de forma persistente e
ininterrupta. Segundo a organização MapBiomas, na bacia Hidrográfica do Rio São
Francisco a área desmatada de 2019 a 2022, foi de 6.383,38 km2,
próximo ao tamanho do município de Juazeiro, na Bahia. Os vetores do
desmatamento estão relacionados à expansão da agricultura monocultural e da
pecuária extensiva, da mineração, da instalação crescente de grandes complexos
eólicos e de usinas solares de grande porte.
Diante do quadro descrito, em que
as mudanças climáticas aumentarão a vulnerabilidade das populações do
semiárido, cabe aos municípios a obrigação de levarem a cabo ações locais de
enfrentamento da emergência climática e suas consequências e, assim, proteger
os mais vulneráveis, os mais pobres. A atuação pode ser de: mitigação,
buscando reduzir as emissões de poluentes que causam o aquecimento global, e de
adaptação, que serve para adaptar os municípios a nova realidade,
tornando-os resilientes a eventos extremos como inundações, secas e ondas de calor.
As estratégias, que podem ser
implementadas pelos municípios para mitigar os efeitos das mudanças climáticas,
estão agrupadas em 5 tópicos: Redução do desmatamento, Maior uso de fontes
renováveis de energia, Práticas sustentáveis e apropriadas para a agricultura
familiar, Educação e conscientização, e Políticas públicas.
A seguir algumas sugestões para
as gestões municipais do semiárido:
· Construção do Plano Municipal de
Enfrentamento às Mudanças Climáticas (PMEMC). Identificar problemas e
medidas de mitigação e adaptação. Construção de instrumentos de adaptação local
consoantes com o Plano Nacional de Adaptação à Mudança Climática (PNA)
e com a Política Nacional sobre Mudança do Clima.
· A Educação ambiental a nível municipal é
um caminho para a conscientização/mobilização sobre a crise climática. Criação
de Conselhos Municipais de Educação Ambiental e Mudanças Climáticas.
Adotar ações nas escolas para crianças e adolescentes sobre o aquecimento
global. A mídia local (rádio, blogs, ...) têm um papel relevante contribuindo
com a divulgação de informações. Promover capacitação para diferentes públicos.
· Redução do desmatamento. Identificar ações
de prevenção, proteção e recuperação ambiental para a conservação do bioma.
Proteger a Caatinga deve ser um compromisso de toda a sociedade.
· Reflorestamento com plantas nativas
(recaatingamento) e frutíferas. Apoiar a criação de viveiros de mudas.
Distribuição de mudas para a população.
·Criação de Unidades de Conservação Municipal
deve ser prioridade. A Caatinga é um dos biomas menos protegidos do país,
somente 1,5% da área do Bioma está protegido com unidades de conservação de
proteção integral.
· Combater as fake news, o negacionismo
climático. A ciência em primeiro lugar. Importante que nas redes sociais do
governo municipal, executivo e legislativo, tenham espaço para combater as
mentiras divulgadas.
· Incentivar a agricultura familiar com
distribuição de insumos, fortalecendo práticas agroecológicas. Uso de
tecnologias apropriadas para a agricultura familiar (mini turbinas eólicas,
usinas solar de pequeno porte, biodigestores, reuso da água, irrigação
localizada, ...). Incentivos aos setores como energia renovável, agroecologia e
economia solidária, podem garantir novas oportunidades para a população.
· Fortalecimento do Programa de Aquisição de
Alimentos (PAA) do Governo Federal, permitindo que os produtores rurais
pequenos e médios, comercializem seus produtos de maneira direta e com valores
justos, ampliando a oferta de alimentos baratos, saudáveis e nutritivos.
· Construção de Planos de contingência,
mapeamento das áreas de riscos.
· Atender às melhorias reivindicadas pelas
populações rurais, incentivando a permanência no campo (iluminação, recuperação
de estradas, transporte, internet, saneamento, lazer, ...).
· Criar, fortalecer e potencializar os Conselhos
Municipais de Defesa do Meio Ambiente.
· Fortalecer a governança e a gestão dos bens
comuns da natureza, do financiamento, proteção e recuperação dos mananciais.
· Garantir recursos no planejamento
orçamentário para a gestão hídrica e do meio ambiente, com ampla participação e
controle social.
· Fundamental para o êxito das medidas a serem
adotadas é a Articulação das secretarias municipais, Saúde, Educação,
Infraestrutura, Agricultura, Meio ambiente e Assistência social com
organizações da sociedade civil, fortalecendo a agenda climática no município.
Estas sugestões, desde que
seguidas, comprometem e permitem um maior engajamento dos municípios no combate
à crise climática, preparando e adaptando aos cenários presentes e futuros.
A sociedade civil do município,
sindicatos, igrejas, associações profissionais, organizações patronais,
comerciários, têm um papel essencial em cobrar, pressionar governos e corporações
a agirem com a urgência necessária no enfrentamento da emergência climática. A
história mostra que mudanças significativas só ocorreram quando houve pressão
popular, movimento de rua, e outras iniciativas; demonstrando assim o poder da
mobilização coletiva.
A luta continua!!!
___________________________________________
* Professor associado aposentado da Universidade Federal de
Pernambuco, graduado em Física pela Universidade Estadual de Campinas
(UNICAMP/SP), mestrado em Ciências e Tecnologias Nucleares na Universidade
Federal de Pernambuco (DEN/UFPE) e doutorado em Energética, na Universidade de
Marselha/Aix, associado ao Centro de Estudos de Cadarache/Comissariado de
Energia Atômica (CEA)-França.
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