Terça-feira, 11 de fevereiro de 2025 | Porto Velho (RO)

×
Gente de Opinião

Artigo

Não agirão com justiça os juizes?


Gen Marco Aurélio Vieira - Gente de Opinião
Gen Marco Aurélio Vieira

[...] de fato, não se consegue imaginar, no seio de uma sociedade, enormidade maior do que esta:                   a LEI tomada como instrumento de injustiça.”

 Frédéric Bastiat, in A Lei, 1850

 

Existem duas maneiras de ser imparcial: a do cientista e a do juiz. Elas têm uma raiz comum, que é a honesta submissão à verdade dos fatos. Entretanto, no Brasil de hoje vivemos um sistemático envenenamento da verdade, distorcida através da rotina erudita, dos dados sem fontes de credibilidade, e das narrativas ideológicas apresentadas como fatos, ou disfarçadas de senso comum.

Muitos de nossos cientistas foram calados na pandemia, taxados de negacionistas porque – mesmo munidos de dados científicos – ousaram discordar da versão alarmista pregada pela ideologia do caos.

E os nossos juízes descambaram para um legalismo ativista de ocasião, prendendo pessoas sem respeitar o devido processo legal, perseguindo adversários políticos, e impedindo a sustentação oral de advogados nos tribunais do júri. Eles estão “descondenando” e libertando condenados em mais de uma instância, liberando traficantes presos em flagrante, devolvendo recursos aos criminosos confessos, censurando redes sociais por crime de opinião, cassando mandatos de parlamentares eleitos por milhares de votos, vendendo sentenças. Alguns de nossos juízes já usam tornozeleira eletrônica.

Nossos juízes querem calar quem se sentir prejudicado pelas decisões em “defesa da democracia”. Em resposta à enxurrada de manifestações contrárias às decisões que restringem as operações de segurança pública nas comunidades do Rio de Janeiro (ADPF 635), visando a “proteção da sociedade” contra os “abusos policiais” no combate aos “cidadãos portando fuzis nas esquinas”, nossos magistrados sugerem criminalizar quem criticar a corte ou a justiça.

O mau real é que as pessoas não têm reagido com o peso da coletividade. E não há manifestação individual que sensibilize uma “democracia relativa”, onde o lamento costuma não passar de simples opinião, e a atenção oficial para opiniões anda escassa, seletiva e perigosa. O que temos feito é reclamar nas mídias sociais, sem mover sequer uma palha na direção de reagir às injustiças. Sem manifestações de protesto, de fato, habituamo-nos a repassar fake news e acreditar piamente em teorias da conspiração salvadoras da Internet. O escritor inglês G.K. Chesterton costumava dizer: “Enquanto continuarmos amaldiçoando o sistema, ele estará são e salvo.”  

Em sua obra “A Desobediência Civil”, o britânico Henry Thoreu ressalta que a desobediência civil é o único caminho a ser tomado quando as leis existentes são injustas, o que, por fim, faz o próprio Estado conduzir o homem ao crime, ou ser conivente com as injustiças. Segundo ele, se a lei não for um instrumento de realização da justiça, seu descumprimento é legítimo. Mas no Brasil de hoje, é possível inclusive uma desobediência civil dentro da lei, porque os atos de juízes estão – SIM – contrariando a lei. Exemplo: existem Oficiais do Exército presos, fora do flagrante delito, e ao arrepio da Lei Nr 6.880 /9 dez 1980 (Estatuto dos Militares), em seu Artigo 74.  

E se o brasileiro comum tem desrespeitado as leis, é porque certamente elas o desrespeitaram primeiro. Na verdade, vivemos um flagelo legal que afronta diariamente nossa inteligência e nosso senso de justiça, ao criminalizar com base em leis inexistentes, censurar “discursos de ódio” de velhinhas da Internet, aplicar penas absurdas aos “atentados violentos contra o estado democrático de direito” com batom.

A alegação de sempre é de que eles – os juízes – estão agindo com justiça.

Na Bíblia, em Gênesis 18: 23-33, vemos Abraão discutir com Deus o destino de Sodoma. Quantos justos haveria na cidade? Cinquenta? Vinte? Concluindo que não havia nem cinco justos em Sodoma, Abraão não pediu perdão ao Senhor pela insistência inconveniente, mas sim, com os olhos voltados para os céus, perguntou ao Pai: “Não agirá com justiça o Juiz de toda a Terra?  Na verdade, Abraão atreveu-se a questionar o Senhor. Em outras palavras, o que Abraão disse foi: O Senhor realmente é o Juiz de fato e de direito de todo o Universo; mas, mesmo assim, me parece que isso não o coloca acima da lei. Estou errado?”

O Senhor não se ofendeu: Abraão não foi admoestado, castigado e nem fulminado por um raio divino, em virtude de sua “desobediência civil”.  Deus não fulminou Abraão por um único motivo: porque ninguém está acima da lei, nem Deus. Abraão tinha perfeita compreensão de sua dúvida, e de que se Deus o fulminasse já não seria Deus, porquanto estaria contrariando sua própria lei. Porque se o Direito for o que o juiz – o soberano ou o presidente de plantão – disser que é, já não será mais Direito, e já não será mais necessário respeitar a lei.

Quando alguma “autoridade” diz o que é a Lei, porque assim a entende e decide, os advogados passam a ser inúteis, e deixamos de viver a legalidade para sofrer o legalismo da aplicação fria dessa lei. Do mesmo modo, quando a Lei deixa de ser a força comum organizada para fazer obstáculo à injustiça, ela se torna o próprio “instrumento da injustiça”, e a Justiça se torna mero justiçamento.

 

Gen Marco Aurélio Vieira

Foi Comandante da Brigada de Operações Especiais e da Brigada de Infantaria Paraquedista

Gente de OpiniãoTerça-feira, 11 de fevereiro de 2025 | Porto Velho (RO)

VOCÊ PODE GOSTAR

O Efeito do Narcisismo em um Relacionamento

O Efeito do Narcisismo em um Relacionamento

O narcisismo é um traço de personalidade caracterizado por uma visão exagerada da própria importância e uma necessidade insaciável de admiração e at

Impactos Tecnológicos: vício em aplicativos e jogos

Impactos Tecnológicos: vício em aplicativos e jogos

A tecnologia está cada vez mais presente na nossa vida e no nosso dia a dia. Entre elas, os aplicativos de jogos se destacam, atraindo todas as idades

 Exercício físico e estilo de vida saudável: um impacto positivo na saúde mental

Exercício físico e estilo de vida saudável: um impacto positivo na saúde mental

A saúde mental tem sido uma preocupação crescente no Brasil e no mundo, especialmente em transtornos como ansiedade e depressão, figurando entre as

Marketing Digital e automação no mercado imobiliário

Marketing Digital e automação no mercado imobiliário

O mercado imobiliário tem passado por grandes transformações nos últimos anos, impulsionado pelo avanço das tecnologias digitais e pela necessidade de

Gente de Opinião Terça-feira, 11 de fevereiro de 2025 | Porto Velho (RO)