Sábado, 7 de setembro de 2024 - 12h27
Conforme artigo publicado no dia 30 de agosto último Que
a História Não se Repita, a Memória Cultural e Histórica de Rondônia
parece ser seletiva - com exceção de apenas um vereador, nenhuma outra
autoridade, sequer escritor, ou instituições como o IPHAN, o Instituto
Histórico e Geográfico, nem mesmo, os membros de quaisquer Academias dessas que
"dizem valorizar a Memória Regional" se manifestou até o momento a
respeito da insigne data, celebrada como farsa a cada 30 de agosto
durante as últimas décadas, a ponto de nem mesmo comentarem ou criticarem as
questões levantadas sobre o tema, como que estivessem todos sofrendo de uma
síndrome de Alzheimer coletiva.
Felizmente conforme Edmund Burke, "a função do
Historiador é lembrar a sociedade daquilo que ela quer esquecer". Desta
forma, transcrevemos aqui, mais algumas fontes primárias (algumas centenárias)
que nos permitem ter ideia dos eventos referentes à esta data:
A publicação norte-americana Engineering News[1] do dia 08
de agosto e 1912, na pág.273 menciona o
nome da autoridade que representaria os EUA na referida inauguração:" O
Dr. Albert Hale, da União Pan-Americana, foi escolhido para representar os
Estados Unidos na cerimônia formal da Madeira e Mamoré em 7 de
setembro."(traduzido)
No Jornal O Paiz(RJ) de 8 de setembro de 1912[2] foi
publicada uma mensagem do engenheiro Pinkas, que, no final do séc. XIX fora um
dos responsáveis pelo levantamento do traçado topográfico da futura EFMM. O
referido engenheiro, mesmo estando na cidade no Chile, não quis deixar a data
passar em branco, enviando um telegrama à redação do referido jornal, o qual
transcrevemos ipsi literis: [Do ilustre engenheiro Pinkas, recebêmos o
seguinte telegramma "ANTOFOGASTA, 6 - No dia da inauguração da Estrada de
Ferro Madeira-Mamoré, saudo o Paiz, defensor dos seus estudos há trinta annos
passados."]
Excerto
do Jornal O País(RJ) de 08 de setembro de 1912
No dia 9 de setembro, dois dias após o evento, o jornal The
Christian Science Monitor[3], à pág. 4, além de incluir duas imagens relativas
à EFMM, corrobora a notícia informando que: "A Bolívia tem a sorte de ter
um vizinho a leste tão empreendedor como o Brasil, que, agora que a ferrovia
Madeira-Mamoré foi oficialmente inaugurada em 7 de setembro, fornecerá uma
esplêndida agência de transporte para os bolivianos e também para os
brasileiros ocidentais. Isso deve inspirar a Bolívia a fazer tudo o que estiver
ao seu alcance para promover ainda mais a conexão ferroviária em direção ao
noroeste. Os Estados Unidos demonstraram seu interesse na abertura do
empreendimento Madeira-Mamoré enviando um representante da União Pan-Americana
para os exercícios dedicatórios."(traduzido)
A publicação Engineering News [4] em 26 de setembro daquele
mesmo ano, na pág. p.578 reforça o ocorrido: "Em 7 de setembro de 1912, a
última seção da Madeira & Mamoré Railway foi inaugurada ou formalmente
aberta ao tráfego. Esta seção se estende de Abunã (km. 220) a Guajará-Mirim
(km. 364). A data selecionada para a consumação deste dispendioso
empreendimento é um dos três grandes feriados brasileiros — o trigésimo
aniversário da separação política do Brasil de Portugal. O feliz evento foi
testemunhado por muitos funcionários do governo brasileiro e por vários
representantes da União Pan-Americana, e por um dos engenheiros sobreviventes
da expedição Collins de 1878. A locomotiva Baldwin “Coronel Church”, levada ao
Brasil em 1878, foi usada para puxar o trem oficial."(traduzido)
A
inauguração dos trechos da EFMM, levava sempre as bandeiras dos três países
envolvidos hasteadas
Talvez a dificuldade para reconhecer que a data oficial de
inauguração oficial da EFMM pelos "connoisseurs" locais, se deva às
pequenas notas publicadas nos jornais norte-americanos em língua inglesa, o que
dificulta até certo ponto o acesso às fontes primárias, então, além de
traduzirmos livremente os trechos acima, reproduzimos aqui, outro texto em
português assinado por um colunista que se identifica apenas como
"JOTA", publicado no próprio Jornal Alto Madeira [5], o qual relata
os preparativos para a dita cerimônia, bem como, as questões políticas e
transfronteiriças supostamente envolvidas - mas alertamos: a leitura pode ser
de difícil compreensão para alguns, posto que, a transcrição apresenta-se
conforme as regras gramaticais da época:
"Reminiscencias
Porto Velho d'outrora
Os constructores da Estrada inauguraram-na, á revelia do
consentimento e ordem do governo, sem convite de especie alguma ás autoridades
brasileiras, no dia 7 de setembro de 1912. Partio o trem inaugural, desta
localidade, á 5, chegando de volta na tarde daquele dia, trazendo o sr. dr.
Rodolpho Arauz, delegado do Territorio Nacional de Colonias do Noroeste de
Bolivia, acompanhado por uma banda de musica do exercito boliviano, bem afinada
e numerosa. Seriam cerca de desoito horas quando se ouvio lá pára os lados da
estação os accordes do hymno brasileiro, correctamente executado pela banda.
Acabára de chegar o trem.
Dahi partio em demanda consulado de Bolivia, que
funccionava na casa em que reside actualmente o sr. coronel Prudencio Bogéa de
Sá, onde se hospedou o sr. Arauz, executando bello dobrado americano. Ahi tocou
retreta até cerca das vinte e uma horas. No dia seguinte a Mesa de Rendas e a
Fiscalisação, que estavatam, ao tempo, respectivamente, nas casas em que agora
moram Mr. Brisard e Mr. Craney tiveram aviso de que a musica lhes ia fazer uma
surpresa, realisando em frente dos edificios das duas citadas repartições um
ligeiro concerto, antes de ir tocar no grande baile que a companhia offereceu
aos seus empregados, na casa do gerente.
Mas, a surpresa foi que ella deixou o pessoal das duas
citadas repartições a ver navios, e com grande despesa de champagne e de
cerveja. Que, aliás, não se perderam. Um
dos engenheiros da empresa Collins, que em 1878 tentou construir a Estrada,
tendo trabalhado em Santo, teve a felicidade de vê-la inaugurada trinta e
quatro annos depois, fazendo parte da comitiva dos srs. May, Jekill e Randolph.
A locomotiva que puchou o trem inaugural foi a n. 12, abandonada no anno
supracitado em Santo Antonio, e restaurada em 1911-1912, nas officinas da
Companhia, nesta Villa."
Em memória a essas narrativas históricas apagadas de nossa
Memória, é que esse outro "jota" compartilha em primeira mão aos
interessados (se houverem) os fatos e fontes acima descritos, incluindo os
links para as referidas fontes, ensejando mais uma vez, que a história não
se repita novamente em forma de farsa, mas que seja fiel aos fatos, como em
tese e prática deveria ser.
Joesér
Alvarez, Historiador
Responsável
pela pesquisa histórica do Museu da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré - MEFMM
Coordenador
do Museu Imaterial da Imagem e do Som de Rondônia - MIIS-RO
https://miis-ro.org/memoria-da-ferrovia-madeira-mamore
Referências
[1] Disponível em:
https://archive.org/details/sim_enr_1912-08-08_68_6/page/272/mode/2up?q=MADEIRA+MAMORE+RAILROAD;
[2] Disponível em: https://archive.org/details/1912-setembro-21-sabado-a/1912%20Setembro%2008%20Domingo%20a/page/n1/mode/2up?q=madeira+mamore;
[3] Disponível em:
https://archive.org/details/per_christian-science-monitor_the-christian-science-mo_1912-09-09_4_242/page/n3/mode/2up?q=madeira+mamore&view=theater;
[4]Disponível em:
https://archive.org/details/sim_enr_1912-09-26_68_13/page/578/mode/2up?q=MADEIRA+MAMORE+RAILROAD;
[5]Jornal Alto Madeira de 30 de maio de 1918. Disponível
em: http://memoria.bn.br/hdb/periodico.aspx;
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