Quarta-feira, 21 de agosto de 2024 - 14h03
A Reforma Tributária, que vem sendo analisada no Senado pelo Projeto de
Lei Complementar PLP 68/2024, prevê a substituição de cinco tributos (ICMS,
ISS, IPI, PIS e COFINS) por três: o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), a
Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e o Imposto Seletivo. O primeiro
relatório deve ter seu parecer apresentado no dia 22 de outubro, segundo o
senador Izalci Lucas (PL-DF), coordenador do grupo de trabalho que analisa sua
regulamentação.
A proposta do Governo prevê uma série de mudanças significativas para a
Zona Franca de Manaus (ZFM), criada pelo Decreto-Lei nº 288/67, uma área
estratégica que oferece diversos incentivos fiscais com o objetivo de promover
o desenvolvimento industrial na região amazônica, tornando-a competitiva frente
às demais regiões do país. No entanto, as mudanças propostas na reforma
tributária levantam preocupações sobre o futuro desses incentivos,
particularmente em relação à cobrança do Imposto sobre Produtos
Industrializados (IPI).
Historicamente, a isenção do IPI para os bens produzidos na ZFM tem sido
um dos principais instrumentos para atrair indústrias à região. Este mecanismo
permitiu que a produção no local se tornasse economicamente viável, compensando
os desafios logísticos e outros custos adicionais associados à operação em uma
área remota como a Amazônia. A alíquota do IPI aplicada aos produtos fora da
ZFM sempre teve um papel crucial: quanto maior a alíquota, maior a vantagem
competitiva para as empresas localizadas na ZFM.
Contudo, o atual texto da reforma tributária implementa uma mudança
importante ao prever que as alíquotas de IPI serão zeradas a partir de 2027,
exceto para os bens produzidos na ZFM. Isso cria um cenário de incerteza para
as empresas de outras regiões, que precisarão monitorar constantemente a lista
de itens fabricados na ZFM para saber se seus produtos estão sujeitos ou não ao
IPI. Esse novo modelo de tributação pode complicar ainda mais o ambiente de
negócios, gerando dúvidas sobre a viabilidade de novos investimentos na região
e sobre a manutenção da competitividade das indústrias já estabelecidas.
A introdução do Projeto de Lei Complementar nº 51/2024, que busca
regulamentar o diferencial competitivo da ZFM, adiciona mais complexidade ao
cenário. Este PLP propõe que o IPI incida apenas sobre artigos com produção
relevante na ZFM, representando dois terços da fabricação nacional em 2023, e
prevê uma revisão quinquenal dessa lista de produtos. Embora essa abordagem
híbrida permita uma certa flexibilidade, ela também introduz incertezas sobre a
aplicação futura dos incentivos fiscais, especialmente em relação à dinâmica do
mercado e à capacidade das empresas de planejar suas operações de longo prazo.
Outro ponto de preocupação é a autonomia da lei complementar para
disciplinar as questões relativas ao IPI na ZFM. Os incentivos fiscais
previstos no DL nº 288/67, em especial a isenção do IPI, têm sido tratados como
“imutáveis” pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Agora, a dúvida que paira é se
o Judiciário reconhecerá a autonomia da LC para ajustar ou até mesmo reduzir o
papel do IPI como instrumento indutor de produção na ZFM.
Essas mudanças propostas na reforma tributária podem ter consequências
significativas não apenas para a economia da ZFM, mas também para o
desenvolvimento sustentável da Amazônia como um todo. A redução da
competitividade poderia levar à desindustrialização da região, com impactos
socioeconômicos profundos, incluindo a perda de empregos e a diminuição de
investimentos em áreas críticas para o progresso regional.
Como parte das mudanças, foi instituído o Fundo de Sustentabilidade e
Diversificação Econômica do Estado do Amazonas, que visa mitigar eventuais
perdas de receita decorrentes das alterações tributárias e fomentar novas
atividades econômicas na região.
Assim, a reforma tributária, tal como está, deixa muitas perguntas sem
resposta e cria um ambiente de incerteza que pode afetar a atratividade da ZFM
como polo industrial. Para que esta continue a cumprir seu papel estratégico no
desenvolvimento da Amazônia, será necessário um debate mais aprofundado e uma
regulamentação que leve em conta as especificidades da região e a importância
dos incentivos fiscais para a sua sustentabilidade econômica.
* Dr. Ivson Coêlho
é advogado especialista em direito tributário – drivsoncoelho@nbpress.com.br
Sobre Dr. Ivson Coêlho
Dr. Ivson Coêlho é advogado, Procurador do Município de Manaus,
Pós-Graduado em Direito Tributário pelo CIESA, mestre e doutoramento em Direito
Constitucional pela Universidade de Fortaleza, Pós-doutoramento pela
Universidade de Salento, na Itália. Já exerceu os cargos de Procurador-chefe da
Procuradoria do Contencioso Tributário, Subprocurador-geral e Procurador-geral
do Município de Manaus. Confira mais em: https://ivsoncoelho.adv.br/site/ e https://br.linkedin.com/in/ivson-co%C3%AAlho-17b857146.
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