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Política é interesse? - ou é interessante?


João P. Magalhães - estudante de filosofia/UFSCar  - Gente de Opinião
João P. Magalhães - estudante de filosofia/UFSCar

O tema proposto enfatiza aquilo que seria propriamente do povo, isto é, popular. Por causa disso, é válido partirmos do próprio entendimento comum, ou, do senso comum, para responder a uma questão mais ampla: “Quando a sabedoria popular retrata um preceito”. Como nos indica, o ponto de partida é um problema epistemológico que se denomina em nosso dia-a-dia como sabedoria — a saber: uma linha de raciocínio acerca de um objeto em vista —, que pode ser apresentada de pessoa a outra de diversas formas, seja oral, seja escrita.

Não há dúvidas de que o conhecimento, assim como tudo que está inserido nessa lógica neoliberal, é hierarquizado. Essa hierarquização é transmitida, coerentemente e não contrariamente, até pelo próprio ambiente acadêmico, onde o único tipo de conhecimento realmente respeitado é aquele com respaldo científico. Espera-se que aqui não haja uma má compreensão a ponto de s3 interpretar essa tese como um apelo ao negacionismo. De maneira nenhuma esse pensamento anti-ciência deve ser passado adiante. Isso é apenas mau caratismo intelectual declamado atualmente pela extrema direita que domina o bras8 e outros países.

Para melhor esclarecer é preciso compreender que, para além da academia, o conhecimento transita de pessoa para pessoa no viver do seu dia-a-dia. Empiricamente, sabemos que o choque entre duas bolas de bilhar gera movimento, não sendo necessário Hume e Newton nos apresentar isso com embasamento filosófico e científico. O respaldo científico nunca foi necessário para compreendermos o fato de que o contato entre duas bolas gera energia (atrito) e movimento. Pergunte a qualquer “tiozão” do bar sobre causalidade e inércia que ele possivelmente irá divagar, mas, ao mesmo tempo, sua coleção de troféus de sinuca nos mostra que ele, de certa forma, possui ciência. Isto é, definitivamente, um conhecimento popular aplicado com estratégia, cálculos, naquela mesa do bilhar.

Agora, para não focarmos apenas na física, a sabedoria popular reporta diversos tipos de conhecimento cinetífico, como a sociologia. Durkheim nos mostrou o que é um fato social, já o povo — inclui-se aqui o sociólogo, pois ele também faz parte da sociedade — é quem sofre a ação desse fato sem ao menos saber sua definição. Prova- disso é que o fato social é anterior à escrita do Durkheim, que conceitualizou e descreveu a respeito desse fenômeno. E que, sem dúvidas, o fez de maneira exemplar. Dito isso como exemplo: um indivíduo sabe que se não levar um presente a uma festa de aniversário é descordial e ao mesmo tempo ele pode não ter ciência de que isso é um fato social, ele apenas segue o que foi empiricamente lhe apresentado no seu viver cotidiano.

Do mesmo modo funcionam os ditados populares. Por mais que eles sejam muitas vezes taxados como clichês, seu conteúdo pode trazer demasiada veracidade. “De grão em grão a galinha enche o papo” nos mostra a importância de realizar pequenas tarefas todo dia para que alcancemos a realização de uma tarefa maior. Nesse caso, a sabedoria popular trata de um preceito sociológico, pois o ciscar da galinha se refere ao trabalho humano.

Finalmente, feito esse caminho, podemos compreender melhor aquilo que lá em cima foi exposto: “Quando a sabedoria popular retrata um preceito sociológico”. Certificado que a sabedoria popular retrata um preceito sociológico, então, seria essa sabedoria a solução para uma sociabilidade duradoura e pacífica? Ora, o conhecimento popular, como é explícito nos próprios termos, é muito mais disseminado do que um conhecimento de fato científico. A capacidade de transitar do primeiro é, claramente, superior. Isto seria motivo suficiente para depositarmos nossa fé? É essencial lembrar-nos que a sabedoria popular não está isenta de equívocos e até absurdos. Definitivamente limão e própolis não curam a covid como acreditaram as tias e os tios do zap. No entanto, nos concentremos mais naqueles conhecimentos populares realmente efetivos.

Assim como “de grão em grão a galinha enche o papo”, “violência gera violência” e “respeito gera respeito”. Em um mundo “[...] cada vez mais interconectado (tecnologicamente) e desconectado (socialmente)  [...]”, é preciso pregar respeito para que assim gere mais respeito. Somos humanos e está em nossa natureza ser sensível àquilo que nos é exterior. Assim como sentimos o fogo queimar e, num ímpeto, retiramos a parte do corpo que queima, sentimos as palavras do outro e agimos a partir delas. A partir disso, temos que o Outro é potencialmente transformador e que o simples contato entre as pessoas pode vir-a-ser revolucionário.

Ao escrever esse texto, lembro-me de um causo que me ocorreu quando viajava para as montanhas mineiras: um defeito no carro surgiu durante uma leve batida embaixo por causa das sinuosas e trepidantes estradas de terra. Bastou uma leve e proveitosa conversa com dois simpáticos senhores que trabalhavam no parque da Canastra para que o problema fosse resolvido. Foi, possivelmente, por causa de respeito e empatia que aqueles dois senhores sequer cobraram de nós o conserto do carro. Aliás, eles nos disseram para que, da próxima vez que voltássemos, parássemos no parque para terminamos nossas conversas! Talvez, sejam nas simples ações do nosso cotidiano que está essa revolução: no simples ato de dialogar com um igual.

Disso, podemos tirar que uma solução para um mundo extremamente tecnológico e globalizado, todavia, socialmente isolado ou até mesmo desolado — o neoliberalismo prega imperativamente o individualismo que muitas vezes nos aflige —, esteja nas coisas simples do mundo, como nos mostra Manoel de Barros em suas poesias.

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