Segunda-feira, 21 de outubro de 2019 - 11h41
É preciso combater as fake news, e isso não é novidade. São incalculáveis os estragos que elas têm causado para a democracia e para a cidadania nos últimos anos. Está mais que claro que a desinformação constante, a manipulação e os volumosos recursos colocados na rede para pulverizar mentiras têm sido alguns dos principais desafios para o cenário social. Mas como conter o compartilhamento?
Em meio a uma série de receitas prontas para se precaver contra as notícias falsas na internet e nos aplicativos de mensagens, a pergunta está longe der ser retórica e é mais que necessária. Analisar quem é o emissor, avaliar a forma como o texto é escrito (se de forma séria ou não), se tem erros de digitação ou de português e, ainda, conferir as datas de publicações são alguns dos passos indicados por vários especialistas no assunto para tentar identificar as fake news. Mas em todos esses casos, o sucesso é sempre resultante da intensidade de um aspecto: o olhar atento de quem consome a informação.
Oras, há décadas que dicas de segurança percorrem e-mails, sites e milhares de materiais de alertas impressos de bancos e de instituições de segurança digital sobre como não cair em armadilhas de ladrões e estelionatários. Sempre confira quem envia as mensagens, analise o texto para verificar se há erros de formatação ou de língua, e por aí vai. As regras de precaução são quase as mesmas, mas no fim o efeito prático é pouco resultante. Veja, não significa que não são válidas, mas a cultura de avaliação de risco e análise de segurança na rede não está instalada de fato em nossa formação de base.
Isso mesmo. É na formação educacional que podemos encontrar uma série de etapas que colaboram para desembocar na cultura do aprendizado digital e da linguagem que fortalecem as formas de encontrar informação de qualidade em meio a um mar de dados. Ou seja, muito mais que culpar a tecnologia, é a forma de uso que devemos responsabilizar. Dar subsídios para que as pessoas possam se orientar na rede e conseguir sua autonomia na navegação é o que se propõe com uma educação digital.
Um primeiro ponto a se consolidar é o conhecimento dos aparatos tecnológicos. Aqui escolas particulares e boa parte das escolas da rede pública municipal e estadual — ao menos se colocarmos em evidências as capitais — cumprem os requisitos, mesmo que superficialmente. A formação tecnológica é o alicerce desse processo e introduz os estudantes a um universo sob orientação da própria escola. Dá um significado didático formativo ao aparelho.
Um segundo passo seria a linguagem de navegação. E aqui podemos tanto imaginar a linguagem das pessoas que navegam, a forma do texto, da arquitetura da informação, quanto a linguagem da máquina. Ultrapassar o design da página e ler os códigos que sustentam cada base de dados e que liga os mares de informações são os itens que restam para o futuro. A linguagem de programação logo será básica e introdutória para conhecer a rede e os computadores. Conhecer a linguagem é obter as ferramentas para entender o desvio de padrão e as armadilhas contidas no código.
Uma terceira etapa é a criação e o fortalecimento de dispositivos legais de repressão, de responsabilização e de criminalização. Enquadrar e tipificar de forma clara a criação e o compartilhamento de fake news fornece ferramentas para os próximos passos, que são a fiscalização e a repressão ao boato e às notícias falsas. Considerando o impacto negativo que elas podem ter para o regime democrático e para a segurança de dados dos cidadãos, um rol de penalidade e uma fiscalização efetiva são necessárias.
Por fim, é de se esperar que a última etapa seja a da cultura da criminalização e repreensão da criação e compartilhamento de notícias falsas. Uma vez instaurada a cultura de reconhecimento e de combate logo na formação inicial, fica insustentável manter práticas demagógicas como as encontradas em instâncias superiores judiciais e políticas, em que figuras que ou se beneficiam das fake news ou são compartilhadoras contumazes de notícias falsas colocam-se como baluartes da moralidade no combate à desinformação. O hábito e a institucionalização da cultura de investida podem resultar em ações individuais responsáveis e diárias, quer seja pelo espírito cidadão, quer seja pelas penas e pelos constrangimentos sociais e legais.
Trazendo para a base educacional a preocupação com a informação de qualidade, é possível dar subsídios para que cada indivíduo possa se orientar e avaliar os riscos da sua navegação. Terceirizar essa educação, postergá-la para o começo da vida adulta ou relegar seu aprendizado a um conhecimento técnico voltado para o mercado são erros. Quanto antes o conhecimento se estabelecer e a familiaridade com a linguagem se fizer presente, maior será a capacidade de perceber que existe um ato de responsabilidade no compartilhamento da informação.
Autor: Alexsandro Ribeiro é professor nos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda do Centro Universitário Internacional Uninter.
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