Quinta-feira, 9 de novembro de 2023 - 11h15
Tainá Reis[1]
O ano de 2023 foi o que
apresentou mais ataques a escolas no Brasil desde 2002. A informação vem do
Instituto Sou da Paz, que monitora esse tipo de ataque nos últimos vinte anos. Foram
sete casos em 2023, seis em 2022 e três em 2019, período com maior número de
episódios. Desde 2002, foram registrados 25 casos, com 139 vítimas; 46, fatais.
Em 48% dos eventos foram usadas armas de fogo, responsáveis por 76% da
letalidade dos casos[1].
Enquanto a sociedade
busca respostas para esses ataques no âmbito da saúde mental dos responsáveis,
ou buscando entender a dinâmica das relações entre professores e alunos, com
foco em eventuais casos de bullying, pretendo propor uma abordagem a partir da
Sociologia da Educação. A compreensão de um fenômeno social não pode se dar
dentro dos limites do próprio fenômeno, é necessário olhá-lo de maneira ampla,
com suas interconexões e diferentes camadas. Assim, não é olhando apenas para
dentro da escola que entenderemos tais ataques, mas, talvez – é o que proponho –,
entendendo-se a relação escola-educação-sociedade.
Como ponto de partida,
temos que a escola é um espaço de reprodução das relações sociais de poder
vigentes em cada sociedade. Tal perspectiva pode ser respaldada por uma
variedade de autores; destacamos aqui Émile Durkheim, Karl Marx e Pierre
Bourdieu. Longe de pretender dar conta da teoria desses intelectuais, vou
apenas pinçar de suas teorias elementos para o debate sobre o crescimento da
violência escolar no Brasil. A ideia é tratar não apenas da escola, mas
reforçar que ela não é estanque às dinâmicas sociais.
A educação – e aqui não
só escolar – é responsável pela formação do ser social. Isto é, um indivíduo
quando vem ao mundo nada sabe sobre o comportamento adequado ao seu contexto
(como se portar, como pensar, sentar, vestir, comer). É nas relações sociais,
primeiro, familiares, depois, escolares, que se aprende as normas, valores e
regras sociais. Tais valores e normas já estão naturalizados no comportamento
dos sujeitos das gerações adultas, e constituem a vida moral. É essa vida moral
que é transmitida de geração para geração, dos mais velhos para os mais novos,
nos mais diversos ambientes sociais, inclusive, e especialmente, na escola. A
educação é o grande elemento de socialização dos indivíduos (Durkheim).
A formulação durkheimiana
apresentada acima via na educação um meio para a manutenção da coesão social.
Por meio da educação as sociedades reproduziriam as representações sociais para
manter a unidade do grupo. Contudo, para além da noção de unidade social,
podemos analisar o papel da educação e da escola a partir da noção de dominação.
Em uma sociedade capitalista, a dominação burguesa se faz não só por sua base
material, mas também intelectual. Nesse sentido, a educação não é neutra, pois
está a serviço da reprodução do capital.
A educação unilateral –
com seus sistemas de ensino e escolas - é voltada às necessidades da divisão
social do trabalho e da geração de mais valia. Ou seja, a função política da
escola seria a formação de força de trabalho para o mercado capitalista, com um
preparo técnico e disciplinar, denotando a ideologia burguesa que a subjaz. Nesta
abordagem, entende-se que a construção daquilo que a escola vai oferecer aos
alunos tem a ver não com uma base educacional neutra, mas orientada
ideologicamente (Marx). E essa ideologia é o que forma o ser social.
O sistema de ensino
institucionalizado busca inculcar os valores e as regras sociais dominantes
(burguesas), naturalizando-as de forma que possam ser socialmente reproduzidos.
Trocando em miúdos: a escola, que forma o ser social, reproduz as relações
socias de poder vigentes e, desse modo, os indivíduos em seu processo formativo
já crescem aprendendo como natural um conjunto de valores que tem a ver com a
dominação burguesa. Esses valores que mantêm as classes dominantes no poder
serão reproduzidos ao longo de suas vidas (Bourdieu). Se somos condenados a
reproduzir esses valores para a eternidade ou não, outros autores poderão dizer.
Mas, retomando a questão inicial do texto, como usar essas reflexões para
entender a ascensão dos ataques escolares?
Atualmente assistimos a um
cenário de crise do capitalismo com consequências em diversos setores sociais,
desde a questão propriamente econômica com a recessão batendo à porta de
diversas nações (Argentina e Alemanha, para citar dois casos)[2], até a questão climática e
ambiental. Tal crise se mostra também na esfera da ética e da moral. Se
pensarmos na manutenção – e, por que não, incitação – de guerras recentes para
alimentar a indústria da Guerra, somada à ação ideológica e interessada da
mídia nesse tema, o que sobrou daquela coesão social desejada por Durkheim no
século XIX? De todas as normas sociais apreendidas pelas crianças,
naturalizadas e reproduzidas pelos adultos, o que tem constituído o ser social
na contemporaneidade?
Não que se trate de uma
relação direta de causa e efeito, até porque os fenômenos sociais não se
movimentam de modo linear; a presente análise se esforça em fugir do
positivismo. Contudo, entendendo que a educação e a escola não estão fora da
sociedade, ou numa bolha dentro da mesma, e se, pelo contrário, entendemos que
a escola reproduz os valores sociais justamente para formar indivíduos que
façam o mesmo, entendemos também que a ascensão da violência escolar pode estar
ligada não só a questões internas à escola, mas ao desmantelamento da coesão
social (pensando à lá Durkheim). Ou, ainda, podemos entender que é justamente
porque o capitalismo se encontra neste ponto de sua crise – econômica,
ambiental, social, moral – que as escolas de alguma forma reproduzem isso, como
se a violência fosse o extravasamento de um padrão social que é violento com as
pessoas.
Tais afirmações são hipóteses.
O que se sabe é que, no Brasil, o aumento dos casos a partir de 2019, que
também representou o aumento da letalidade, especificamente pelo uso maior de
armas de fogo, indica que a flexibilização do acesso a armas facilita esse tipo
de crime. Então temos já um indício. Outra questão é o perfil dos agressores,
são meninos e homens, alunos e ex-alunos: entre 10 e 25 anos, em sua maioria na
faixa entre 13 e 15 anos[3].
Nesse
sentido, trata-se de um fenômeno relacionado ao universo masculino, o que abre
questões sobre a construção do tema do gênero nas escolas. A compreensão do
aumento dos ataques às escolas no país requer uma análise cuidadosa, mas, acima
de tudo, e contando com os princípios da Sociologia da Educação, uma análise
que leve em consideração o papel político da instituição escolar. O que ocorre
dentro da escola não é diferente do que ocorre fora dela.
A educação
que não se direciona à emancipação do indivíduo produz qual tipo de ser social?
[1]
Disponível em: https://www.andes.org.br/conteudos/noticia/2023-ja-e-o-ano-com-mais-ataques-em-escolas-diz-oNG1.
Acesso em: 07/11/2023.
[2] Disponível em: https://www.poder360.com.br/internacional/relatorio-da-onu-projeta-recessao-economica-global-em-2023/.
Acesso em 07/11/2023.
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