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As cores de meu país


Nosso arraigado patriotismo é tão profundo que dura menos que um mês. É pré-datado. A culpa é da cor de nossa bandeira, verde e amarela, tão condizente com nossa história. Tudo nela nos foi dado pela natureza, não construído por nossas honras e glórias. O amarelo traduz mais a vergonha histórica de todos os ‘grandes homens’ da Inconfidência terem abandonado à própria sorte o ‘soldado raso’ Tiradentes, que o ouro que representaria nossa memória em momento síntese da nação. Representa mais a vergonha de ter feito Teófilo Otoni, o aclamado Ministro do Povo, um dos maiores mineiros em todos os tempos, depois de rendido e vencido pelo Exército Nacional, ser levado, prisioneiro, a pé, puxado por cavalo, da revoltosa Santa Luzia a Ouro Preto, capital da Província.

Nosso amarelo não é pelo ouro garimpado e agente construtor de uma nova nação. Mas sim o ouro saqueado com a aquiescência e subserviência dos mineiros e de Portugal. Mais ou menos o que acontece nos dias de hoje com a floresta amazônica e com o mineiro de ferro de Minas e do Pará, tudo doado, trezentos anos depois, sem nenhuma inconfidência. Essa é a nossa orgulhosa Estrada Real, que para nós era o caminho do saque, a estrada pavimentada pela exploração e pelo servilismo.

Sem revoluções e sem heróis, o majestoso Hino Nacional evoca e traduz a verdade que não vivemos, o Brasil que dividimos, todos nós, todos os dias, deitados eternamente em berço esplendido. Por isso o entoamos tão alto, com a confortável justificativa de não repeti-lo mais durante todo o ano.  

Quando andamos pelas ruas de nosso imenso país, vemos nossa verdade estampada em tapumes, nossa vergonha exposta e emoldurada. De norte a sul é assim: é preciso nos protegermos de nós mesmos. Temos mais a esconder que mostrar. Por isso maquiamos tão bem os caminhos tortos por onde irão passar as seleções e os turistas, deixando-os bem policiado, limpos e sinalizados, bem diferentes de nossa pobre vida diária.

Em campo, os heróis nacionais, tão distantes da realidade de seu país que foram cooptados a viver bem longe dele. Fazem sua história fora, assim como todas as nossas riquezas, desde sempre. Talvez por isso nos identificamos tão pouco com nossa Seleção.

Servilmente, clamando por um naco da atenção do mundo, vamos construindo estádios no lugar de construirmos uma nação, vamos construindo aeroportos, no lugar de construirmos um povo, vamos fazendo a batucada da festa enquanto os estrangeiros e o povo que vive de circo e de muito pouco pão, dançam, alegremente. A ignorância é sempre protetora.

É tão fácil aquinhoarmos gente e produzirmos uma festa... Impossível é reunirmos pessoas e erguemos uma nação.

Daqui a algumas horas, enrolaremos nossas bandeiras, esqueceremos nossa fé, guardaremos a nossa esperança. Peço, apenas, como bem sintetizou o poeta, que “se temos a febre da festa, tenhamos também a lucidez da ressaca”.  

Petrônio Souza Gonçalves é jornalista e escritor

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