Sexta-feira, 23 de maio de 2014 - 08h33
Recentemente, Rodrigo Mezzomo, no blog do Instituto “Liberal”, defendeu a “remoção” das favelas como necessidade urbanística para o Rio de Janeiro. De acordo com o autor, as favelas são símbolo de “desordem e ilegalidade”, resultado de “invasões e ocupações desordenadas”. Além disso, os moradores das favelas são “cidadãos superiores, que não estão submetidos à ordem constitucional do país, pois não são obrigados a cumprir os mesmos deveres dos demais brasileiros que vivem no asfalto”. Por isso, para ele, “remover é preciso”.
É lamentável que Mezzomo não esteja disposto a chamar o que ele defende daquilo que realmente é: a expropriação violenta dos moradores das suas posses legítimas. As favelas são “irregulares” apenas por uma formalidade jurídica. Apesar de alguns tímidos esforços de legalização fundiária urbana, os favelados ainda são considerados invasores e criminosos por definição, embora tenham se apropriado de terrenos virgens.
Isso deve explicar por que Mezzomo não está tão ansioso para deixar sua casa e ir morar nas favelas, embora os favelados sejam considerados “cidadãos superiores”: a verdade é que os moradores das favelas, longe de serem privilegiados, são considerados cidadãos de segunda classe, indignos de garantias básicas, excluídos de direitos de propriedade, privados de suas liberdades individuais.
Os moradores das favelas convivem com a opressão diária da própria polícia (que não reconhece seus direitos individuais e impõe um estado de sítio permanente sobre a população), com o perigo constante imposto pelos traficantes de drogas (extremamente armados e que utilizam as favelas como trincheiras), com a ameaça constante de expropriação (seja por motivos de “segurança” contra enchentes, por exemplo, ou por motivos urbanísticos), com a insalubridade constante do ambiente (tomado por lixo e esgoto a céu aberto) e com a prestação precária de serviços (em muitos locais, a própria distribuição de água e energia é inexistente). Viver em favelas claramente não é o mar de rosas descrito por Mezzomo. A favela não paga IPTU, mas acho que poucos favelados consideram que a troca seja justa.
É sintomático que Mezzomo tenha mencionado que o bairro da Tijuca tenha se “desvalorizado” no Rio de Janeiro após a ocupação de diversas áreas por favelas. Era uma área “nobre”, que perdeu após a chegada das favelas e, presumivelmente, dos indesejados. O problema é que as favelas, enquanto construções irregulares, não são resultado da liberdade urbanística, mas são a consequência cruel de anos e anos de intervenções violentas nas cidades, de planificações urbanas e da proibição da ocupação de terrenos perfeitamente viáveis para a aquisição.
A tentativa de expropriação dos pobres que moram nas favelas é particularmente criminosa, pois remove os cidadãos dos centros urbanos, onde há oportunidades, e os desloca para a periferia, longe dos olhos e das sensibilidades dos ricos.
Para Mezzomo, as “remoções” são assunto tabu dentro da política do Rio de Janeiro e do Brasil de forma geral. Mentira. As remoções são sancionadas e praticadas como política de estado e aprovadas pela classe média metropolitana. No Rio de Janeiro, mais de 20 mil famílias já foram removidas desde 2009. Estima-se que 250 mil pessoas possam ser despejadas com os preparativos para a Copa, embora não existam dados precisos.
O programa Minha Casa, Minha Vida, do governo federal, inclusive, trabalha diligentemente para enriquecer empreiteiras e despejar os pobres para morar na periferia.
Sei que não vou convencer a classe média nem os ricos com os argumentos acima, então tenho uma proposta que deve agradar a todos: vamos remover os ricos e a classe média dos bairros nobres, colocá-los na periferia e dar aos pobres as antigas casas e apartamentos do Leblon, de Ipanema e Copacabana. Que tal?
Erick Vasconcelos é jornalista, coordenador de mídias e associado ao Centro por uma Sociedade Sem Estado.
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