Quinta-feira, 16 de julho de 2015 - 13h08
Andrey Cavalcante
O fim pode, afinal, justificar os meios? O raciocínio equivocadamente atribuído a Maquiavel e muito provavelmente oriundo do manual de ética “Madulla Theologiae Moralis”, escrito no século XVII pelo teólogo jesuíta Hermann Busenbaun, que sentenciou: “cum finis est licitus, etiam media sunt licita ("quando o fim é bom, também são os meios") parece orientar o raciocínio dos parlamentares que integram a CPI da Petrobrás. Todo esse voleio filosófico se presta a esclarecer que, embora aplauda entusiasticamente as iniciativas e ações voltadas para o combate à corrupção endêmica que assola o país, a OAB jamais irá admitir qualquer afronta aos princípios constitucionais. Não apenas no julgamento, mas em todas as fases do inquérito. Policial ou parlamentar.
A pretexto de esclarecer a atuação da defesa especialmente no caso do tal bilhete escrito por Marcelo Odebrecht, preso na Operação Lava-Jato, suas excelências convocaram para depoimento a advogada Beatriz Catta Preta. Não é possível concordar com a iniciativa. Acredito que definitivamente os fins jamais haverão de justificar os meios por maior que seja a nobreza de que possam estar estes revestidos. É igualmente nesse sentido o teor do ofício encaminhado pela OAB Nacional à CPI da Petrobras. A entidade pede a dispensa da convocação de Catta Preta, uma das advogadas da Operação Lava-Jato, para depor aos parlamentares ou, caso mantida a convocação, que a advogada não seja pressionada a responder perguntas cobertas por sigilo profissional.
O presidente nacional da Ordem, Marcus Vinicius Furtado Coêlho esclarece no documento que o estatuto da OAB, constitucionalmente estabelecido, “prevê o dever de sigilo e a confidencialidade na relação cliente/advogado e autoriza o profissional a não depor como testemunha sobre o fato que constitua sigilo profissional". Com forte repercussão na imprensa, o ofício assevera que é “ilegal, antijurídica e inconstitucional a quebra do sigilo profissional entre cliente e advogado, e não se pode tratar quem atua na advocacia como informante para o combate de delitos”. Encaminhado ao presidente da CPI da Petrobras, deputado Hugo Motta (PMDB-PB), o documento questiona ainda investigações sobre pagamentos feitos aos defensores de acusados na operação “lava jato”.
Nesse mesmo diapasão está o texto publicado pelo respeitado articulista Reinaldo Azevedo: “Continuo inconformado com a convocação da criminalista Beatriz Catta Preta para depor como testemunha na CPI da Petrobras. É claro que advogados não têm licença para cometer crimes. Eles têm, e devem ter, prerrogativas para defender seus clientes da pretensão punitiva do estado. O nome disso é democracia. Não gostou do que leu? Tente provar que estou errado”.
O certo é que exatamente por jamais ter se afastado, ao longo da história, da linha de conduta ética e do mais absoluto respeito à constituição, às leis, às instituições e ao estado democrático de direito, a OAB é uma das instituições com maior credibilidade junto à população brasileira. Constatação de pesquisa Datafolha em 135 municípios brasileiros. Entre 14 instituições avaliadas, a Ordem ficou atrás somente das Forças Armadas. A Igreja Católica figura na terceira posição, seguida pelo Poder Judiciário e, em quinto, a imprensa. Em último lugar ficaram os partidos políticos, logo depois do Congresso.
Há que registrar, e elogiar, contudo, por equanimidade, os acertos do Congresso. O Senado acaba de aprovar o projeto de lei que cria regime especial de atendimento no contexto do Estatuto da Criança e do Adolescente a jovens que cometerem crimes hediondos. Sem desconsiderar a inconstitucionalidade da redução da maioridade penal, o presidente Marcus Vinicius Furtado Coêlho elogiou a decisão do Senado pela aprovação da proposta originalmente apresentada pelo senador José Serra. “A redução da maioridade penal é inconstitucional, além de um atentado contra nossa juventude. A revisão do ECA, defendida há anos pela OAB, é o melhor caminho quanto aos crimes graves cometidos por menores de idade. A atuação equilibrada dos senadores comprova, mais uma vez, a importância desta casa no processo legislativo” – disse o presidente da Ordem.
O texto estabelece que o regime especial deverá alcançar jovens na faixa dos 18 aos 26 anos que estiveram envolvidos, quando menores, em crimes graves. Nesses casos, o período de internação poderá durar até dez anos e ser cumprido em estabelecimento específico ou em ala especial, assegurada a separação dos demais internos. O projeto assegura o acesso à aprendizagem e ao trabalho para o adolescente privado de liberdade, além de aumentar a pena de quem cometer crimes acompanhado de menor de 18 anos ou induzi-lo à prática. Resta esperar que a providência do Senado possa sepultar de vez a discussão oportunista, eleitoreira e ideológica em torno da redução comprovadamente inócua da maioridade penal. O Brasil precisa exatamente disso: seriedade. Como princípio, meio e fim.
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