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Opinião: A banalização do título de doutor


Sílvio Mellon*

O Brasil é o país dos doutores. Mas há uma exceção relativa ao domínio pessoal do título: grande parte dos agraciados pela honraria jamais escreveu uma tese de doutoramento, regra única para o uso legítimo da deferência. Mesmo assim, as letras DR estão grafadas nas fachadas de escritórios, consultórios médicos e sucedâneos. Num fórum, “doutor” é a pronúncia mais ouvida pelos corredores e salas de audiência o que denota por parte de muitos a atração pelo uso do título acadêmico.

Da mesma forma, para o povo simples, o delegado, o engenheiro, o veterinário, o político de envergadura e até mesmo, um simples munícipe abastado, dono de posses materiais são admirados e tratados pelas duas letras da nobreza acadêmica. Nas minhas andanças pelas cidades de Rondônia já me deparei até com enfermeiras-padrão e optometristas se autointitulando doutores.

O jornalista Contardo Calligaris diz que seu uso para os médicos é por consideração especial e, distante da excelência acadêmica, serve para significar uma distância social. Ademais, justifica-se um privilégio: se é “doutor merece ser rico! É “um sintoma constante em todas as sociedades em que formas arcaicas de domínio desvirtuam as formas modernas da diferença social”, analisa o colunista da folha.

Na área de direito, são poucos os advogados, juízes e promotores não-doutores que usam o que lhes é de direito, o título de bacharel. Documentos dos mais variados timbres estampam o “doutor” aos borbotões antes da firma do signatário. Os próprios jornalistas em programas midiáticos abusam de reverenciar autoridades com este tratamento nobre. De acordo com o Prof. Dr. Marco Antônio Ribeiro Tura, “os profissionais, sejam quais forem, têm de ser respeitados pelo que fazem de bom e não arrogar para si tratamento ao qual não façam jus. Isso vale para todos.”

E continua: “para os profissionais do Direito é mais séria a recomendação. A tradição faz com que os chamemos de Doutores. Mas isso não torna Doutor nenhum médico, dentista, veterinário e, mui especialmente, advogados.” Segundo o Prof. Marcos Tura tudo começou no período colonial. Escreve ele: “Naquela época, a história que se contava era a seguinte: Dona Maria, a Pia, havia "baixado um alvará" pelo qual os advogados portugueses teriam de ser tratados como doutores nas Cortes Brasileiras. Então, por uma "lógica" das mais obtusas, todos os bacharéis do Brasil, magicamente, passaram a ser doutores”.

Não é necessária muita inteligência para perceber que deve ser levado em conta o atraso educacional do Brasil durante séculos, o difícil acesso pela formação profissional, a ausência de políticas educacionais dos sucessivos governos que garantissem níveis intelectuais satisfatórios na inclusão do povo rumo ao conhecimento.

Nas inúmeras cidades interioranas, até então, o estudo era objeto de consumo restrito à pequena elite burguesa, criando assim um abismo entre as camadas proletárias e os donos do poder de mando, não restando alternativa aos pobres e desvalidos, senão capricharem no tratamento doutoral aos que na terra de cego possuíam um olho. Entendo que a vaidade que invade quem recebe este tratamento seja tentadora e irresistível, entretanto, vamos traduzir o óbvio:ninguém pode e nem deve exigir o tratamento de Doutor ou apresentar-se como tal se não possui titulação acadêmica para tanto.

*O autor é historiador formado pela UFRN e mestrando em educação na UNIR.

Email: silviomellon@hotmail.com

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