Quarta-feira, 18 de junho de 2014 - 11h01
Guido Bilharinho
A criatividade artística humana constitui processo contínuo e surpreendente. Centenas ou milhares de obras (musicais, literárias, cinematográficas e plásticas) surgem constantemente, de variados graus de qualidade estética, temas e ângulos de abordagem.
Muitas mais poderiam aparecer se fossem dadas iguais oportunidades de existência e atuação a todos os indivíduos e, ainda, se a sociedade estivesse estruturada de maneira diversa e valorizasse o saber, o conhecimento e a arte.
Um dos filmes de estreia consistentes é Viagens (Voyages, França, 1999), de Emmanuel Finkiel.
Diferentemente dos produtos comerciais, não foi realizado para diversão e passatempo. Como filme autoral, representa ponto de vista do cineasta sobre a problemática humana em duas de suas mais dolorosas manifestações, reunidas para expressar-lhes as peculiaridades.
No caso, o cineasta enfoca simultânea e principalmente a monstruosidade do holocausto judeu pelos nazistas e a dor permanente das vítimas diretas e indiretas.
As personagens são judeus que perderam os seres mais queridos na referida voragem assassina, desde pais a irmãos.
Nada mais pavoroso, por exemplo, para uma criança, do que ela e sua família serem arrancadas do lar e levadas em comboios ferroviários como gado humano a caminho do desconhecido, completamente a mercê de tirânicos e armados carrascos, que depois ainda as separam, em geral para sempre.
Se a criança sobrevive, resta marcada permanentemente pela tristeza, a amargura, a perda das alegrias e ilusões infantis e o encontro (e conhecimento) da crueldade humana. É algo incompreensível e inatingível para quem não passou por tragédia análoga.
O cineasta consegue plasmar essa mágoa cristalizada pelo tempo e guardada no fundo do ser como num crisol, que não permite seja esquecida ou superada. Constitui cicatriz moral e emocional inapagável e insuscetível de remoção.
Para fixar semelhante drama, Finkiel cria três situações protagonizadas por mulheres vitimadas pela sanha assassina dos nazistas, seja numa visita a campo de concentração, cemitério e gueto judeu na Polônia, seja no ressurgimento de pretenso pai de outra delas após décadas de desaparecimento, seja na chegada de uma terceira a Israel.
Em cada uma dessas ocorrências expõe, não visão turística na primeira, regozijo na segunda ou, na terceira, jubiloso encontro com a terra sagrada dos judeus. O que focaliza é o conteúdo real do sentimento de cada uma delas submetido ao fluxo contínuo da vida que liga passado e presente, ambos problematizados.
Num caso, a dor da lembrança e o relacionamento do casal, no outro a estranheza e a dúvida sobre a identidade do desconhecido e, finalmente, a realidade de Israel, que faz a personagem considerar seus habitantes não mais como judeus, mas, israelenses.
A condução cinematográfica dos dois primeiros casos é efetivada de maneira que a dor e a angústia apresentam-se tão entranhadas nos seres humanos quanto expostas nos vincos das faces. Já no último, o que se mostra é a tenacidade dos judeus frente às dificuldades e ao desamparo, nunca sendo tomados de desespero e exasperação, características muitas (ou todas às) vezes encontradas nos povos jovens que não sofreram.
Se há filmes aventurosos, alegres, exuberantes e outros tantos, Viagens é a tristeza filmada como reflexo direto da silenciosa melancolia das personagens, ao fixar a verdade humana, seu conteúdo e significado e não a mera aparência.
Nos interstícios e refolhos do tema central ainda revela particularidades do convívio humano em situações diversas, desde as relações conjugais até a solidariedade humana, além da distância, no tempo e nos costumes, do passado sepultado em cemitério polonês e a trepidante e convulsionada vida da Israel moderna, cujas origens, fundamentos e atuação devem ser motivo de questionamento e não apenas de adesão ou oposição apaixonadas e incondicionais.
Aliás, os aspectos do país mostrados no filme pautam-se pela objetividade e isenção, outro dos atributos do filme.
(do livro A Segunda Guerra no Cinema. Uberaba,
Instituto Triangulino de Cultura, 2005)
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Guido Bilharinho é advogado atuante em Uberaba, editor da revista internacional de poesia Dimensão de 1980 a 2000 e autor de livros de literatura, cinema, história do Brasil e regional, entre eles, Brasil: Cinco Séculos de História, inédito.
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