Quinta-feira, 13 de outubro de 2016 - 19h02
Alexandra Vieira de Almeida,
escritora e doutora em Literatura Comparada (UERJ)
No mundo contemporâneo, um clique vale mais do que um abraço. O afeto se revela como uma neurose para muitos, pois o normal seria o olho biônico da internet. Lembrando-me de um dos heterônimos do poeta português Fernando Pessoa, em que a máquina devora o homem numa relação erotizada, o amor se transforma na aparência metálica do tecnológico.
A essência deixou de ser essencial para se fragmentar nos múltiplos hipertextos da internet, que deixando a profundidade do sonho, navega numa realidade mais que costumeira, banal e sem muita riqueza vocabular. A redução de nossa memória, pela memória dos bits do computador tira o homem de sua busca pela utopia de suas noites insones pelo sonambulismo artificial da virtualidade. Esta se alimenta da energia do homem, vampirizando-o a tal ponto que horas e horas que poderiam ser usadas para o processo criativo acabam levando a uma repetição incessante. Como se ruídos fossem da noite mais sombria.
Porém, há o outro lado. Com a tecnologia, podemos ver que não só de noites tempestuosas vive o homem, pois a velocidade da internet se traduz na diferença e na repetição. A partir dela, o ser humano também pode criar, imaginar e “navegar” no mar do novo, com descobertas no desconhecido laço que nos une, não pelos afetos carnais, mas pelas afinidades intuitivas de uma tecla, que em poucos minutos pode produzir uma rede de fraternidade digital.
No universo cibernético, as pessoas reproduzem textos e ideias com perguntas, respostas, réplicas e tréplicas. A consequência é a “produção” de conhecimento, um conhecimento que não pode durar nas redes, mas que perdura nos corações dos seres em comunhão internética.
Os sonâmbulos da internet se afinam com uma outra maneira de se inventar, despertam para a aurora movente da tecnologia não fabricada, mas criada pelos sonhos mais criativos. O sonambulismo se reinventa e desaparece, deixando em seu rastro o despertar de uma manhã nascente que costura novos jogos computacionais de maneira lúdica.
Navegar na web se torna uma necessidade visceral, não uma obrigação. A rede leva as pessoas para outros horizontes, em que as linhas se tocam e os abraços não se partem, criando-se uma afinidade virtual.
Essa mágica técnica faz de todos uns artistas cheios destas virtualidades viscerais com o contato das palavras. Porém, a mão da máquina se torna uma extensão de nossos pensamentos mais imaginativos. A tela do computador se torna um quadro da arte mais bela, em que as ideias se costuram entre si criando um mosaico caleidoscópico.
Portanto, a mão do homem toca a tecla, sua amante não tão distante. A máquina não devora o homem, como diria Pessoa, mas tanto o ser quanto o computador se tocam suavemente para a criação dos pensamentos mais infinitos em que como espirais se expandem no leito desta navegação artística. Na web se produz arte, a ideia se cria pelo dom e pela inspiração de mentes tocadas pelo artificialismo e o ser humano se deita nestas águas plenas ao navegar no mar desconhecido do belo reproduzido em múltiplas formas.
Joyce Nogueira
joyce@drumond.info
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