Terça-feira, 30 de julho de 2024 - 16h02
Vinício
Carrilho Martinez (Dr.) – UFSCar
Carlos
Montes (Dr.) – Juiz de Direito
Vinícius
Scherch – doutorando/PPGCTS-UFSCar
Este texto foi motivado por discussões
incompreensíveis em grupo de WhatsApp, com indivíduos que, teoricamente, não
deveriam externar valores conflitantes a alguns dos argumentos aqui expostos –
sobretudo, quando se tem a lisura e a honestidade intelectual em mente, quando
a “militância” não extrapola o Bom Senso e o dever ético para com a ordem
constitucional democrática.
Não haveria porque dizer-se isso, no
entanto, escrevemos uma “lição escolar” com o intuito de que não se confunda
“militância” com Luta pelo direito e, assim, que possamos contribuir a fim de
que não ocorra tergiversação com os pressupostos e princípios do Direito
Público, da Política e que a própria Ética seja um guia da reflexão/ação
político-jurídica.
Com isto em mente, lembremos que muitas
são as situações desafiadoras que enfrentamos atualmente – duas guerras com
possibilidade de escalarem a conflitos regionais, poluição, desmatamento,
aquecimento global, miséria humana –, e, sem contar o giro interminável das
saídas autoritárias (ao menos obscuras) contra a democracia, no exemplo último
da Venezuela, no Brasil, temos o de sempre: elites perigosas, perniciosas,
cavilosas, predatórias, autocráticas, patriarcais, com alianças à extrema
direita (Fascismo).
Não fosse
por tudo o mais, isto bastaria para engendrarmos longos diálogos, ensinamentos,
debates, oficinas, leituras, reflexões (ações) em torno de temas e de questões
óbvias – mas, isto deveria ocorrer todos os dias, em casa, nas escolas, como
parte vibrante de uma Autoeducação política para a descompressão do “povo
pobre, negro e oprimido”.
Alguns desses temas seriam: transparência,
clareza, responsabilidade, eficácia, previsibilidade, proporcionalidade. Assim
como os eixos a nos nortear, desde a tenra infância, tratariam (em aulas e
livros, ou em brinquedotecas) de assuntos como: Ética, Direito Público e
Política – e seus desvios: politicagem, corrupção, malversação dos recursos
públicos, apadrinhamentos, populismos, nepotismos.
Hoje, como
contribuição, traremos umas poucas linhas sobre este mencionado “eixo
temático”.
Ética, Política e Politicagem: O que os princípios de Direito
Público podem ensinar?
Estabelecer
uma discussão sobre ética, Política e politicagem situa-se em uma zona nebulosa
de argumentação científica, pois trata-se da aplicação de conceitos objetivos e
também de algumas características subjetivas. É um entrelace de aspectos da Filosofia
e das Ciências Sociais, da cultura e da sociedade que, em certa medida, moldam
a apreensão do indivíduo (político) acerca dos deveres que possui no espaço
público.
Na
dinâmica das condutas públicas e dos deveres que as pessoas assumem frente aos
compromissos políticos, os princípios de Direito Público podem ajudar na
compreensão do tema, a fim de se evitar desvios da Ética e na Política.
Nessa perspectiva
jurídica, o art. 37, caput, da Constituição Federal de 1988 estabelece
que a administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes dos entes
que compõem a Federação deverá obedecer aos princípios da legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.
Com relação
especificamente à moralidade administrativa, diz-se que o administrador público
deve se comportar como a mulher de César, não bastando apenas ser honesto,
devendo, além disso, parecer ser honesto.
Nesse contexto, o que
se denomina de improbidade administrativa constitui, em verdade, segundo o
jurista José Afonso da Silva, um “ato de imoralidade qualificada”.
A
ética na política, por sua vez, refere-se ao conjunto de valores e de
princípios que orientam a ação dos agentes públicos, a fim de que suas decisões
e comportamentos sejam justos, transparentes e voltados para o bem comum. Na
democracia, a ética é essencial para a construção de um espaço de discussão
pública e para alcançar o processo civilizatório.
Quando
se escreve a Política – diferente da política – tem-se a expressão da ação
humana baseada no processo civilizatório e na construção da Polis.
Tratando
da politicagem, caracteriza-se pelo uso de estratégias e de práticas desonestas
ou imorais (“jeitinho brasileiro” também), visando interesses particulares em
detrimento do interesse público. A politicagem tem potencial para descreditar
instituições democráticas e prejudicar o funcionamento eficaz do Estado. A
politicagem é contrária a ética e à Política.
Os
princípios de Direito Público, mencionados anteriormente, representam mais que
as boas intenções do constituinte, configurando verdadeiros mandamentos
fundamentais que norteiam a atuação dos agentes públicos, visando assegurar que
todas as ações estejam em conformidade com a lei, que as decisões não sejam
influenciadas por interesses particulares, que as ações sejam moralmente
aceitáveis, que a transparência das atividades públicas seja garantida e que o
melhor uso dos recursos públicos seja efetivado.
O
cumprimento desses princípios é capaz de prevenir práticas de corrupção,
nepotismo e favorecimento, contribuindo para a construção de uma administração
pública mais íntegra e eficaz. Ademais, a ética na Política não se limita apenas
ao cumprimento da lei, mas alcança uma práxis afeta à Justiça Social e ao
bem-estar da coletividade.
Por
fim, indicamos uma suscinta referenciação bibliográfica – e que, obviamente,
demanda muitas outras.
Breves
indicações de leitura
– para a casa, para a rua, para o ambiente de trabalho, para o grupo de amigos
e amigas
ARENDT, Hannah. A condição humana. Rio de Janeiro :
Forense Universitária, 1991.
BOBBIO, Norberto. O
futuro da democracia: uma defesa das regras do jogo. Rio de janeiro : Paz e
Terra, 1986.
CANOTILHO, José Joaquim
Gomes. Estado de Direito. Lisboa : Edição Gradiva, 1999.
COMPARATO, F. Konder. A afirmação
histórica dos direitos humanos. São Paulo: Saraiva, 2001.
FILHO, Roberto Lyra. O que é direito. São Paulo: Brasiliense,
2002.
SILVA, José Afonso. Curso
de Direito Constitucional Positivo. 22ª ed. Malheiros Editores Ltda: São
Paulo, 2016.
SUNDFELD, Carlos Ari. Fundamentos
de Direito Público. Malheiros Editores: São Paulo, 2004.
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