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Viviane Paes

As outras, aquelas mulheres que vestem farda!


PM Jaqueline - Foto: rede social - Gente de Opinião
PM Jaqueline - Foto: rede social

No final de maio, em uma das muitas madrugadas insones, pós-estudos, alongamentos, meditação e orações sou vencida por aquele hábito mais que condenável de “dar uma última olhada no celular”. Começo pelo noticiário internacional, passo pelo nacional e chego finalmente nas notícias de Rondônia. Para meu desconforto mental, eu buscava algo relax para finalmente dormir, vejo a notícia da inauguração de um novo batalhão da polícia militar do Estado, o BPTAR – Batalhão de Policiamento Tático de Ação e Reação ao Crime Organizado, especializado no combate ao tráfico internacional, de drogas extorsão e outras atividades criminosas que afetam a segurança pública.

Na verdade não era nada assustador ou comumente retratado, no horário do almoço, dos programas policiais locais, me perdoem os colegas jornalistas que estão à frente dessas atrações, é que para mim não dá! Não sou exatamente a última florzinha da delicadeza, ou alienada da realidade em que vivemos – resido na ZL, dita zona leste, só 35 anos, então... Vamos dizer que só posso evitar não consumo essas notícias em todos os horários.

Enfim, apesar do melindre consegui dormir até rápido e logo pela manhã, mais matérias sobre o novo batalhão, sua importância na estratégia da segurança pública só que dessa vez consegui ver o rosto de alguns dos militares, apesar da boina que usavam. Uma policial se destacava na fileira, por ser bem mais alta que os colegas homens e por ser mulher mesmo!  A partir daí, a repórter de rua que caça notícias, voltou com tudo. Comecei a pesquisar na internet até achar matérias sobre mulheres no efetivo da Polícia Militar de Rondônia.

Uns dias depois assistindo a matérias antigas de uma emissora local, encontrei aquela policial do BPTAR, sendo entrevistada no Dia da Mulher. Ela destacava a relevância das mulheres nas forças táticas da PM e tive certeza que ela seria um personagem interessante para um artigo. Consegui encontra-la, através de conhecidos em comum, vantagens de Porto Velho city ainda ser uma cidade “pequena”, apresento: Jaqueline Rodrigues, a tátiqueira, denominação dos policiais especialistas nas forças táticas.

Administradora de Comércio Exterior

Mineira, de Belo Horizonte, residente em Rondônia há mais de oito anos, Jaqueline não tinha o sonho de ser policial. Na adolescência conheceu uma mulher policial que frequentava a loja da mãe, se tornaria sua amiga, no entanto, não foi algo que despertou seu interesse para o futuro profissional. Cursou Comércio Exterior, na Pontífica Universidade Católica – PUC/MG e durante 12 anos exerceu a carreira nessa área.  Foi convidada para administrar uma empresa, em Ji-Paraná, onde iniciou um relacionamento amoroso de seis anos.

Com o fim do relacionamento, Jaqueline retornaria para Minas Gerais para poucos meses retornar para Rondônia. Havia prestado concurso público da PM em 2019 e foi aprovada. Iniciou o treinamento básico, com muita convicção e um pouco de pirraça, o ex-marido lhe dissera que não conseguiria concluir o curso, era despreparada, não tinha perfil! Foi o suficiente para ela focar todas as forças nesse desafio, e felizmente durante a academia descobriu que gostava de todas as atividades: tiro, luta, legislação e o temido TAF.

Na solenidade de formatura, sua mãe e aquela amiga já na reserva da PM/MG vieram prestigiar sua conquista. A administradora aposentou os scarpins, ao menos durante os plantões, e assumiu o coturno.

Força Tática

Dois anos depois ingressou no II CFT – Curso de Força Tática da PM, uma especialização já atuava nesse batalhão. De 50 candidatos inscritos, sendo policiais militares dos estados do Acre, Rondônia e Roraima e um oficial, da Aeronáutica. Apenas 21 alunos concluíram o curso, confirmando o quão difícil é esse treinamento que prepara policiais para missões que exigem não apenas força física, mas mental e muita resiliência. A PM Jaqueline, única mulher participante do II CFT estava entre eles. Aquela lá que o ex disse que não tinha perfil para policial!

“Eu dormia, três horas no máximo por dia, nos 53 dias de curso intensivo. Morando sozinha, tinha que me virar para lavar a farda, cozinhar, estudar para o dia seguinte, evitar situações que poderiam me desclassificar como uma simples gripe” (lembrando em 2022 ainda estávamos na pandemia da Covid-19, apesar da vacinação).

A Tatiqueira Jaqueline será promovida a Cabo até o final desse ano e foi convocada a integrar o BPTAR por sua experiência e vontade constante de aprendizado. Nesse ano, ela tinha planejado fazer mais um treinamento operacional, não deu certo. A meta para 2025 e continuar se aperfeiçoando na parte operacional. Não é uma luta contra o tempo, tem apenas 37 anos, e bastante tempo para se preparar para futuros desafios profissionais!

Com voz embargada relembra uma das ações mais marcantes de sua curta, entretanto consistente carreira, o resgate de um bebê, na zona leste de Porto Velho. “Uma mãe desesperada parou a viatura pedindo socorro. Ela me viu entre os meus colegas e entregou seu filho, sem perguntar qual eram nossos nomes, aonde o levaríamos, apenas o colocou no meu colo e confiou que o salvaríamos. Eu não consigo esquecer esse dia!”, afirmou a PM Jaqueline.

Os números não mentem

A carreira militar para mulheres ainda é um tabu, igual ao das mulheres na Ciência. Segundo levantamento do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) de 2023, o país contava com 796 mil profissionais de segurança pública, desses 404 mil eram militares e 114 mil policiais civis e  peritos.

Do efetivo das PM estaduais, apenas 12,8% é composto por mulheres. A porcentagem é menor, por exemplo, que a representação feminina da Câmara dos Deputados, no mesmo período, 14.8%.

É preciso chamar atenção também para isso, o quanto que a falta de diversidade de gênero está concentrada nas instituições militares. O que está relacionado com uma percepção de segurança pública muito equivocada que preza por uma ideia de que a segurança tem que ser feita pelo enfrentamento, pelo uso da força. E aí, são dois equívocos, essa ideia em si e a ideia de que as mulheres não têm condições de fazer esse tipo de trabalho”, afirmou Giane Silvestre, representante do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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