Quarta-feira, 18 de setembro de 2024 - 19h33
A fumaça tóxica das queimadas tomou conta da cidade de Porto Velho, na primeira semana de setembro deste ano. O que vinha se tornando quase parte da rotina do porto-velhense, manhãs com ar carregado e visibilidade comprometida ao ponto de não ser possível enxergar o outro lado da rua, nos meses de julho e agosto virou um pesadelo a luz do dia – se houvesse claridade, para moradores como a dona de casa Kivia Cristina Alves, de 44 anos. Paciente em remissão de um câncer no colo do útero, descoberto em abril de 2023, ela faz parte das pessoas com comorbidades que estão mais vulneráveis aos efeitos da fumaça tóxica das queimadas.
“Eu comecei a sentir muitas dores nas costas e falta de ar, aguentei até quando pude para evitar uma ida ao médico, no entanto, foi impossível”, explica. Pacientes de C.A em tratamento e remissão, só podem ser atendidos no Hospital do Amor, porque as Upas e postos de saúde não estão preparados para recebê-los adequadamente. “Também estava traumatizada com uma queimada que fizeram atrás do hospital, quando estive realizando exames de acompanhamento, em julho deste ano”, reforçou Kivia.
Fato. Em 23 de julho deste ano, a Administração do Hospital do Amor da Amazônia foi obrigada a chamar os bombeiros por conta de uma queimada iniciada na mata que fica atrás das instalações da instituição, localizada a 20 km de Porto Velho. A fumaça tóxica tomou conta do estacionamento e começou a entrar no prédio, onde ficam internados pacientes oncológicos em tratamento em enfermarias, apartamentos, UTI, laboratórios, refeitórios e demais instalações da instituição.
Quando chegou ao Hospital do Amor, em setembro, Kivia foi internada e diagnosticada com uma pneumonia silenciosa, um tipo de condição respiratória que não apresenta os sinais e sintomas comuns da doença, como tosse com secreção e febre alta. Trata-se de uma forma sutil, mas grave, de inflamação nos pulmões, uma vez que o paciente demora a procurar ajuda médica. Esse tipo de pneumonia pode afetar qualquer pessoa, embora seja mais crítica em grupos como idosos, crianças e pessoas com imunodeficiência (imunidade baixa), uma condição na qual o sistema imunológico do organismo não opera de maneira adequada, tornando o corpo mais vulnerável a doenças e infecções, caso dos pacientes em tratamento de câncer e outras enfermidades. A primeira vez que Kivia teve pneumonia foi em 2018, pós tratamento do C.A foram mais seis vezes!
Passados 10 dias da última internação continua em tratamento da pneumonia, ainda sente dificuldade para respirar o ar poluído que tomou conta da capital de Rondônia, não tem apetite e sente muita fraqueza no corpo. Aguarda, como grande parte dos rondonienses, o início das chuvas para minimizar os efeitos da longa e cruel estiagem amazônica de 2024 que ficará certamente na história. “Esse tempo de estiagem e queimadas está adoecendo muitos pacientes como eu! Lá no Hospital do Amor vi dezenas sendo medicados por problemas respiratórios: pneumonia, bronquite que ataca crianças, adultos e os idosos”, explicou.
As queimadas que atingem o Brasil deixaram os níveis de monóxido de carbono na atmosfera altíssimos, segundo a MetSul Meteorologia. O gás cobriu principalmente o sul da região amazônica, o Centro-Oeste, o Sul do país, Rondônia no oeste da região Norte, e São Paulo, no sudeste. Estes dois últimos estados registraram os maiores indíces de poluição de todo o Brasil.
Nota: O Monóxido de carbono (CO) é incolor, inodoro e muito perigoso, pode levar a morte em ambientes fechados, e o gás também é um dos seis principais poluentes atmosféricos. Ele é o resultado da queima incompleta de combustíveis à base de carbono, como carvão, madeira e óleo. O que é obtido em incêndios em vegetação, comuns nas queimadas das florestas.
A poluição mata, sim!
A poluição do ar é a principal causa ambiental de doenças e mortes prematuras no mundo. Partículas finas de poluição do ar ou aerossóis, também conhecidas como partículas finas ou PM2,5 que tem grande potencial inflamatório no corpo são responsáveis por 6,4 milhões de mortes todos os anos. Cerca de 95% dessas mortes ocorrem em países em desenvolvimento, onde bilhões de pessoas estão expostas a concentrações internas e externas de PM2,5 que são várias vezes maiores do que as diretrizes estabelecidas pela Organização Mundial da Saúde - OMS. Um relatório do Banco Mundial estimou que o custo dos danos à saúde causados pela poluição do ar chega a US$ 8,1 trilhões por ano, o equivalente a 6,1% do PIB global.
Penalidade Climática
Um aumento previsto na frequência, intensidade e duração das ondas de calor e um aumento associado de incêndios florestais em consequência das mudanças climáticas neste século provavelmente piorarão a qualidade do ar, prejudicando a saúde humana e os ecossistemas. A interação entre poluição e mudança climática imporá uma “penalidade climática” adicional para centenas de milhões de pessoas, de acordo com a Organização Meteorológica Mundial (OMM).
“À medida que o globo esquenta, os incêndios florestais e a poluição do ar associada devem aumentar, mesmo em um cenário de baixas emissões”, alertou Petteri Taalas, secretário geral da OMM. “Além dos impactos na saúde humana, isso também afetará os ecossistemas à medida que os poluentes do ar se depositam da atmosfera na superfície da Terra.” A afirmação faz parte de uma entrevista sobre o projeto Metroclima no jornal da Universidade de São Paulo (USP), em 07/11/2023, e tem não por acaso uma foto de uma queimada em floresta próxima a Porto Velho abrindo a matéria. Dez meses depois, a população porto-velhense sente no ar tudo o que foi previsto pelos estudiosos, num altíssimo nível de poluição que chegou no último dia, 10/09/2024, a mais de 200, um valor que segundo a empresa suíça IQAir – que monitora em tempo real, a qualidade do ar em todo o mundo, é insalubre e de risco para pessoas saudáveis e extremamente perigoso para os que tem comorbidades diversas, respiratórias ou não.
Os cientistas sabem que a fumaça de incêndios florestais pode exacerbar doenças como asma e Dpoc (síndrome que engloba bronquite crônica e efisema pulmonar) aumentar o risco de ataque cardíaco e derrame, prejudicando a concentração, reduzindo a capacidade do corpo de combater infecções e causar inflamação nos pulmões, rins, fígado outros órgãos.
Nota: A inalação de monóxido de carbono diminui o suprimento de oxigênio do corpo, que pode causar dores de cabeça, reduzir o estado de alerta e agravar a angina (problema cardíaco). Nos pulmões provoca irritação respiratória, falta de ar e piorar doenças em pacientes asmáticos.
IqAir
A manhã de terça-feira, (10/09/2024) não foi normal para os moradores das capitais: Porto Velho e Rio Branco (AC) que sofreram reações diversas no corpo - percebendo ou não - como ardência nos olhos, garganta e nariz ressecados, tosse seca ao inalar um ar com índice maior que 200 de poluentes. Esse Índice de Qualidade do Ar (AQI – na sigla em inglês) é categorizado como muito insalubre, na plataforma da IQAir. Por exemplo, nesse mesmo dia, só na Avenida Calama, que passa por bairros da zona Norte e central de Porto Velho, a qualidade do ar estava em 217, com PM2,5 de 141.9/μg/m³, 40 graus e umidade do ar em 15%, categorizado como muito insalubre com diversos riscos para saúde. Na mesma região, na Rua Jamari, bairro Pedrinhas a poluição registrada alcançou 215, ainda muito perigoso.
Uma chuva prevista para o domingo,15/09, amenizou por algumas horas, a forte fumaça que tomou conta do domingo em Porto Velho, no entanto, no final do dia a temperatura subiu e o céu ficou novamente acinzentado em toda cidade.
Nota: O símbolo μg é a unidade de medida de massa correspondente a 10-9 gramas, nanogramas na da Física, Metrologia.
O AQI mais baixo indica melhor qualidade do ar, por exemplo, cidades com AQI até 50 têm qualidade do ar considerada “satisfatória”, com pouco ou nenhum risco. O AQI mede a qualidade do ar com base em cinco poluentes regulamentados pela Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos, conforme a Lei do Ar Limpo (Clean Air Act).
A IQAir é uma empresa suiça, fundada em 1963, de tecnologia de qualidade do ar, especializada em proteção contra poluentes transportados pelo ar, desenvolvendo produtos de monitoramento e limpeza do ar.
A plataforma foi lançada em 2020, durante o Décimo Fórum Urbano Mundial, realizado em Abu Dhabi, e é resultado da parceria do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), juntamente com o ONU- HabitatUrbano. A iniciativa alcança hoje mais de 15 milhões de usuários e têm mais de 7.000 cidades participantes em todo o mundo, visando sustentar e ampliar o principal banco de dados sobre a qualidade do ar do mundo.
Ela também opera o AirVisual, uma plataforma de informações sobre qualidade do ar em tempo real com mapas, utilizada por governos e veículos de comunicação nacional e internacional para colher informações precisas e imediatas da poluição pelo mundo. Confira no link abaixo, ou baixe o aplicativo IQAIR, no app store:
https://www.iqair.com/?srsltid=AfmBOorYBEoTO4JjLfxnGTnfKfv8FpBKAZg2Kvq7FMPNahEYfhFXvDxg
Em Rio Branco na Avenida Oeste, no mesmo dia, às nove horas da manhã, a população sofreu os impactos da poluição do ar que ficou em 263, índice categorizado pela plataforma como extremamente insalubre, com 32 graus e 62 de umidade do ar. O PM2.5 foi de 188.5μg/m³.
No dia seguinte, quarta-feira, 11/09/2024, na Avenida Rio Madeira, proximidades do bairro Nova Porto Velho, o índice AQI caiu para 156, com PM2,5 de 62.9μg/m³, 36 graus com 26% de umidade do ar, considerado risco para saúde mediano e mesmo assim de alerta!
O episódio rendeu uma matéria especial no portal de notícias da BBC News Brasil, na mesma semana, com o título: Fumaça e alerta vermelho de calor – veja onde qualidade do ar é pior no Brasil.
No último sábado, 14/09, o monitoramento da IQAir registrou 177 da qualidade do ar, na Travessa São Francisco, no município de Cacoal, enquanto que na Estação Ecológica de Cuniã, o índice de poluição ficou em 152.
Uma chuva prevista para o domingo,15/09, amenizou por algumas horas, a forte fumaça que tomou conta do domingo em Porto Velho, no entanto, no final do dia a temperatura subiu e o céu ficou novamente acinzentado em toda cidade.
Nota: O símbolo μg é a unidade de medida de massa correspondente a 10-9 gramas, nanogramas na da Física, Metrologia.
O AQI mais baixo indica melhor qualidade do ar, por exemplo, cidades com AQI até 50 têm qualidade do ar considerada “satisfatória”, com pouco ou nenhum risco. O AQI mede a qualidade do ar com base em cinco poluentes regulamentados pela Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos, conforme a Lei do Ar Limpo (Clean Air Act).
A IQAir é uma empresa suiça, fundada em 1963, de tecnologia de qualidade do ar, especializada em proteção contra poluentes transportados pelo ar, desenvolvendo produtos de monitoramento e limpeza do ar.
A plataforma foi lançada em 2020, durante o Décimo Fórum Urbano Mundial, realizado em Abu Dhabi, e é resultado da parceria do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), juntamente com o ONU- HabitatUrbano. A iniciativa alcança hoje mais de 15 milhões de usuários e têm mais de 7.000 cidades participantes em todo o mundo, visando sustentar e ampliar o principal banco de dados sobre a qualidade do ar do mundo.
Ela também opera o AirVisual, uma plataforma de informações sobre qualidade do ar em tempo real com mapas, utilizada por governos e veículos de comunicação nacional e internacional para colher informações precisas e imediatas da poluição pelo mundo. Confira no link abaixo, ou baixe o aplicativo IQAIR, no app store:
https://www.iqair.com/?srsltid=AfmBOorYBEoTO4JjLfxnGTnfKfv8FpBKAZg2Kvq7FMPNahEYfhFXvDxg
Estudantes dispensados das atividades de 7 de Setembro
Diante do cenário caótico e insalubre provocado pelas queimadas no Estado, o Ministério Público de Rondônia - através do GAEDUC e do GAECIV e 22 promotorias de educação recomendou, em 30/08, a suspensão da participação de estudantes e profissionais da rede pública e particular de ensino de Rondônia, nas atividades alusivas ao 7 de Setembro.
A medida visou proteger a saúde de crianças, idosos e gestantes considerados grupos de vulneráveis.
Ainda em 30/08, o coordenador Especial de Meio Ambiente (GAEMA) do MPRO, promotor de Justiça, Pablo Hernandez Viscardi ressaltou o impacto das queimadas na qualidade de vida das pessoas, além dos prejuízos à flora e a fauna da região, durante uma reunião realizada no Comando Geral do Corpo de Bombeiros do Estado de Rondônia (CBMRO).
“Diante de um cenário de escassez de pessoal e de tamanha quantidade de focos de queimadas que triplicou, nós precisamos agir de forma estratégica “, ressaltou.
Atuação governamental
Em 30 de agosto, o governo estadual de Rondônia decretou estado de emergência considerando fatores ligados às queimadas e a baixa umidade relativa do ar na região. A Secretaria de Educação de Rondônia (Seduc) avisou que as escolas estaduais não participariam da Semana da Pátria, por causa do risco à saúde dos alunos, atendendo a recomendação do MPRO. Os desfiles cívicos em comemoração ao dia 7 de Setembro foram cancelados na capital e em mais 15 cidades do Estado.
Nota: De janeiro a agosto de 2024 foram registrados mais de 6,9 mil focos de incêndios nos municípios rondonienses. O Estado de Rondônia enfrenta a maior quantidade de queimadas em 14 anos.
Já a Prefeitura de Porto Velho emitiu uma nota informativa, em 2 de setembro, alertando a população sobre os cuidados necessários para prevenir problemas de saúde provocados pela exposição à fumaça das queimadas, um documento elaborado pelo Centro de Informações Estratégicas de Vigilância em Saúde (CIEVs). Uma das recomendações foi o uso de máscaras do tipo “cirúrgica”, lenços, panou ou bandanas também podem oferecer alguma proteção contra as partículas maiores do monóxido de carbono, as máscaras N95 que muitos aprenderam a utilizar durante o período da pandemia da Covid-19. Esse acessório básico não é recomendado para crianças abaixo dos dois anos de idade e podem ser encontradas à venda em farmácias por até R$ 35,00 uma caixa contendo 20 unidades, saindo cada uma por R$ 1,75 centavos.
É recomendado o uso único deste tipo de máscara em ambiente hospital. Fora de hospitais o reuso indicado é de no máximo quatro vezes. Acima disso, a proteção se torna ineficiente e pode provocar contaminações, alerta o fabricante.
Queimada urbana é crime
Segundo a Lei nº 9.605/1998 é considerada uma queimada criminosa aquela feita sem autorização ou que está em desacordo com as normas ambientais. A legislação brasileira prescreve que é crime causar qualquer tipo de poluição que possa resultar em danos à saúde humana ou que provoque mortalidade de fauna e flora. Em Porto Velho, cerca de 80% das infrações recebidas são de queimada domésticas. Muitos moradores realizam a varrição de quintais e queimam o lixo, em vez de descartá-lo corretamente. A Secretaria Municipal de Meio Ambiente (Sema) alerta que o crime pode ser denunciado através do número (69) 98423-4092.
Já o governo estadual através do Decreto nº 29.428, de 28 de agosto de 2024, suspendeu a autorização do uso do fogo controlado pelo período de 90 dias. Nesse prazo, todos pedidos do uso de fogo controlado em propriedades rurais, solicitados à Secretaria Estadual de Meio Ambiente (Sedam), não serão atendidos.
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