Segunda-feira, 19 de janeiro de 2015 - 05h14
Por Marli Gonçalves
Se for ir pelo "ele sabia", vai ter gente aqui no Brasil se contorcendo toda de medo de ter 12 homens apontando uma arma para eles, e você sabem de quem estou tratando. De quems.
Me lembrei muito daqueles programas de auditório onde um grupo de pessoas escolhe uma das respostas e todos juntos se aglomeram debaixo dela. Aí o apresentador dá outra pista e esse mesmo grupo muda de ideia e corre para a outra alternativa. Ou também me lembra cabeças chacoalhadas. Lulu Santos comporia novamente "como uma onda".
Amo que as coisas não sejam estáticas, esclareço logo. Mas há questões - e as morais estão entre elas - que ou se é, e isso significa aguentar os trancos, ou não se é, e as redes sociais misturam ambas. A argumentação lógica e minimamente racional é tratada a sopapos e a beligerância empesteia o ar. Esses dias os Charlies enlouqueceram a ponto de muitos deles tentarem justificar a barbárie do fuzilamento na Indonésia, que matou um, matará outro, outros, sob o bovino olhar de beneplácito da humanidade.
Justificativas parecidas com a de uma certa Sheherazade quando o menino ladrão quase foi linchado. Esse esquadrão da morte de anjos celestiais acha sempre que os caras fizeram por merecer, e parecem se colocar a si próprios vestes de juízes, como mais puros, honestos, limpos e legalistas do que os outros. Até o Papa andou falando em distribuir umas bolachas caso alguém falasse de sua mãe! Estou esperando agora o Dalai Lama aparecer com a faca nos dentes.
Essa castidade de quinta categoria acaba justificando também o que de mais pavoroso pode haver, que vai desde a menina estuprada porque "provocou" à mulher assassinada porque "traiu".
Protestos agora são envelopados - nunca tinha visto isso, coisa que chamam de liberdade para protestar, cercada de policiais armados com escudos e gases até os dentes, desafiadores. A beligerância sempre acaba mal, e os mascarados, baderneiros, sejam o que forem, que estragam a festa, estarão sempre lá, já que uns justificam os outros. E gastamos gente, bombas, balas, queimamos gasolina para viaturas e helicópteros, cansamos (e irritamos) os soldados. Os senhores da guerra são sempre os que sairão lucrando. Impressionante.
A ignorância atrasa a Humanidade. Espalha o medo. Vi gente se comprazendo com o fim de um compatriota, até vangloriando-se como se isso significasse o fim de todos os traficantes do mundo, o fim das drogas, a sanção divina. O exemplo supremo.
E o número de vezes (algumas centenas) que me deparei com pessoas se perguntando por que é que ninguém estava tão chateado com morte de dois mil nigerianos tanto como com a morte dos cartunistas da revista? Ninguém? Você é o quê? Porque se espera sempre dos outros ações e reações, me pergunto? Porque sempre se espera que alguém siga na frente para ser fuzilado antes? Daí virarem heróis ou heroínas, esquecidos minutos depois? A opinião própria não tem mais sentido? Não há mais personalidade?
Também vi gente que anda tão com a cabeça virada pelo petismo que está achando até que a pesquisa internacional que constatou que 2014 foi o ano mais quente de todos foi desencavada pelos jornais por interesse em amenizar a situação da água e a vida dos tucanos em São Paulo. O calor por aqui está mesmo infernal, mas também ouvi uma senhora dizendo que usaria um leque só porque alguém disse na televisão que era a boa - antes ela tinha vergonha.
Lembrei muito de minha mãe, quando falávamos que tal amigo tinha feito tal coisa e não entendíamos por que nós não podíamos fazer o mesmo e ela dizia: ah, se ele for se atirar da ponte, você também se atira?
São Paulo, derretendo, 2015.
Marli Gonçalves é jornalista - Se o ano continuar nessa balada será bem difícil ficar em casa parado, só vendo pela tevê os "outros" protestarem, pelo menos aqui nas ruas desta quatrocentona capital, e nas avenidas e praças glamorosas deste mundo afora.
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