Sábado, 16 de março de 2024 - 08h00
Aqui Agora, lembro bem, o telejornal dos Anos 90
que, diziam, espremia sangue na tevê. Com apelo popular mostrava barbaridades e
requintes de crimes, sempre com doses de novelas radiofônicas. Pois bem:
vivemos o Aqui Agora na pele todos os dias, e o noticiário geral hoje não nega.
O medo e a violência ao nosso lado, e em um segundo sua vida pode não valer é
nada. Precisamos falar sobre isso. Aqui, agora, já.
Na última quinta-feira, fraquinha, ainda me recuperando do
esgotamento de energia de um resfriado daqueles (sim, fiz o teste – negativo)
peguei minha sacolinha e como costumeiramente rumei para a feira. Tudo bem
normal. Já no final das compras, na barraca de flores, que já contei para vocês
jamais deixo de ter em casa, escolhia entre gérberas e antúrios. Não foram mais
de dez segundos. A pouco mais de um metro, aos berros de sai, sai, sai, um
homem enorme e com a cara toda ensanguentada, arma na mão, monta na moto de um
entregador que acabara de estacionar para uma entrega. Outro, também enorme,
monta na garupa e saem, derrapando, quase caindo; se alguém estivesse à frente
não teria tido tempo de pular. E tudo ali virou um perigoso rebuliço. Pertinho
das sempre povoadas barraquinhas de pastel.
Uma manhã como qualquer outra, mas algo mais poderia ter
dado errado. Soube depois que o ensanguentado tentara antes roubar alguém e,
flagrado, tomara capacetadas na cabeça. Na fuga, e como disse, ele não agia
sozinho, o comparsa na garupa, pegaram a moto e se foram, velozes. Não é o
primeiro assalto ou roubo que presencio, mas sei bem quais poderiam ter sido as
suas consequências e desta vez eu estava lá, dentro delas. Uma lágrima rolou,
sem jeito. A vida seguiu. Graças.
Mas é como se todos estivéssemos sendo visados o tempo
inteiro. Uma moto, duas motos, as cenas se repetem com as pessoas sendo
perseguidas, e suas coisas recolhidas. Não tem mais hora, nem lugar, rico ou
pobre, velho, mulher ou criança - parecem seguir ordens de um demônio qualquer,
obrigados talvez a cumprir metas de coleta, como se estivessem em empresas,
como os que aterrorizavam coletando impostos. Não são pobres trombadinhas,
moleques, são gente grande, bem grande. Tão cedo não esquecerei o olhar de ódio
do ensanguentado.
Nunca se ouviu tanto em todos os lados os verbos agredir,
atacar, ferir, desferir, roubar, bater, surrar, matar. Por qualquer coisa,
aliás, armas espalhadas como objetos de morte, se mata. O funcionário da
empresa de energia. O maluco que fugia ele próprio da morte por sua organização
criminosa que toma o ônibus e faz reféns no Rio e atira a esmo fazendo vítima
alguém que apenas iria viajar. A briga no trânsito. O feminicídio. A bala
perdida. A força policial descontrolada, e justamente por tudo isso somando
pilhas de cadáveres em suas procuras.
Tem ainda outro tipo de arma não controlada. Os motoristas
bêbados na direção de carros e caminhões desgovernados que podem até entrar no
seu quarto, enquanto dorme. Todas as horas e lugares parecem errados para a
gente. Até dentro de casa. Em um segundo, um átimo, a vida pode mudar ou acabar.
Que sociedade é essa que vivemos, que estamos criando?
Violência urbana. E rural. Cidades grandes, e nas pequenas também. Não há
caminho de fuga. Temos os “tradicionais” bandidos, ladrões e criminosos, e
gente que de um segundo para outro vira assassino, como se aquilo estivesse
guardado ali dentro de si, despertado por um estalo. A polícia declara que
investiga, pede que se registrem as ocorrências, mas é comum chegar às
delegacias, não ter atendimento ou você mesmo preencher o B.O.
E tudo fica, em geral, por isso mesmo. Me digam se pode
haver investigações reais de todos os casos com os efetivos que temos, muitas
vezes demonstrando total despreparo. Com o poder político contaminado, sem
resolver o assunto, mais preocupado em criminalizar de vez do que pensar em
legalizar algo que – cá entre nós – sentimos o cheiro verde queimando
tranquilamente no ar. E não é esse o foco da violência, os rastafaris diriam.
Notícias populares. E impopulares. Aqui, agora.
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MARLI GONÇALVES – Jornalista, consultora de comunicação,
editora do Chumbo Gordo, autora de Feminismo no Cotidiano - Bom para mulheres.
E para homens também, pela Editora Contexto. (Na Editora e na Amazon). Vive em
São Paulo. marligo@uol.com.br / marli@brickmann.com.br
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Com tantos sustos como os que todos estamos passando nesse fim de ano até o próprio Espírito de Natal, creio, chamou as renas pelo aplicativo e está
Cérebro. Duvidando até da sombra.
Em quem acreditar, sem duvidar? De um lado, estamos como ilhas cercadas de golpes por todos os lados. De outro, aí já bem esquisito, os cabeças-dura
Não chama a polícia. Ela pode apavorar, te matar, te ferir. Não sei se é um surto, se são ordens ou desordens, mas estes últimos dias fizeram lembra
Stress, o já aportuguesado estresse. Até a palavra parece um elástico que vai, estica e volta, uma agonia que, pelo que se vê, atinge meio mundo e n