Sábado, 2 de julho de 2022 - 10h52
Mulheres, meninas, avante! Que últimos dias horríveis
passamos. Confesso que me sinto mal, irritada, à flor da pele, e extremamente
enojada com tanto desrespeito ao que nos é tão caro, precioso, o respeito ao
nosso corpo e à privacidade, à nossa segurança. Especialmente desrespeito
contra nossas conquistas. Continuaremos avançando, mas precisamos estar unidas,
contra esses (e infelizmente, algumas “essas”) escroques que ainda não viveram
ou entenderam como é exatamente a realidade de nossa existência
Os mesmos mentores de gente tão desqualificada para cargos
públicos de tanta importância e poder se arvoram em tentar mudar leis para as
conquistas nas quais verdadeiramente sangramos, tantas morreram, dedicaram suas
vidas. A violência contínua tentando barrar o nosso crescimento e capacidade de
atuação na sociedade como um todo, nossa liberdade assusta e eles reagem
tentando nos massacrar e conter de alguma forma. Onde erramos e deixamos essa
turba agir – e tão abertamente?
Tanta ignorância junta. Às vezes acho que eles, por
exemplo, acham que nós, mulheres, adoramos fazer sexo, engravidar e abortar,
jogar fetos fora, como se isso não fosse nada, fosse uma simples decisão. Fazem
desse momento tão delicado na vida de qualquer mulher um tenebroso festival de
tortura, perigos, ilegalidade. Na verdade, querem – e esse querem é ainda de
toda uma sociedade conservadora e masculina - nos impor a maternidade a todo e
qualquer custo, mesmo até que ela tenha sido proveniente de um estupro, e o que
ocorre diariamente com mulheres de todas as idades, inclusive meninas-criança,
meninas com toda uma vida a passar, como assistimos horrorizadas em dois casos
tornados públicos esses dias.
Ah, como infelizmente conheço na pele muitas dessas imposições.
Esse papo de que mulher é moldada à maternidade, que é menor se não tiver um
homem em seu comando. Decidida desde muito cedo a não casar e a não ter filhos
só não sofri, e agradeço muito isso, pressão da minha própria e pequena
família. De resto, externamente, até hoje de alguma forma sou vista - assim
como várias outras mulheres que conheço e que tomaram a mesma decisão em algum
momento – como espécies femininas de segunda classe. Barquinhos à deriva. Isso,
e mais, para não expressar aqui outros termos ouvidos com frequência,
diretamente ou à boca pequena, pelos cantos.
No meio profissional, não há mulher que negue isto se for
sincera, acham até que nos fazem algum favor quando nos assediam, como se
devêssemos agradecer termos sido as escolhidas entre outras para aguentar
alguma chantagem por ascensão profissional, na forma de apertos, passadas de
mão, palavras indelicadas, convites indecorosos. Antes que me chamem de
radical, ao que também já me acostumei, leia de novo. Não estou me referindo à troca
de charmes e flertes obviamente existente entre os sexos, ao uso da sedução que
nos é peculiar, uma de nossas armas de poder. Estou falando de imposição, e
mais, afirmando o quanto ela é comum em todos os meios profissionais, cada vez
mais, com a entrada de mais mulheres no ambiente, seja qual for, crescente,
exponencial, capacitado, e claramente o que para eles é mortal: definitivo, sem
volta.
Nesses últimos quatro anos, com a chegada ao poder desse
grupo inescrupuloso, machista, arrogante, que Deus (e nós, votando) há de
defenestrar daqui a três meses, mesmo que com tão poucas opções apresentadas, a
situação piorou muito. Digo que piorou porque cansamos de ouvir da boca do tal
presidente e companhia alusões e ataques, indiretas, palavras e gracinhas desconfortáveis,
além das inaceitáveis tentativas de grave retrocesso em nossas ainda parcas
conquistas. Demonstrações chulas, inclusive sobre a própria filha e a invisível
primeira dama. Pelo menos aqui e ali ele é punido por isso, como no caso, esses
dias, da vitória obtida pela excelente jornalista Patricia Campos Mello nas
hostes judiciais, mesmo que ainda um dos desembargadores ainda tenha tido a
audácia de votar contra o pedido de indenização solicitado.
Quando são descobertos em suas tramoias ficam putos, e
agressivos, já não que não podem ir contra as verdades reveladas em
reportagens, e foi essa, mais uma vez, a questão. Assim como agora, com o
estouro do escândalo envolvendo o agora ex-presidente da Caixa Federal, e do
qual ainda veremos muitos desdobramentos e novas revelações. Algumas mulheres
já começam a não temer aparecer, uma puxa a outra. O legal nesse caso é que ele
chega a ser didático para várias mulheres que ainda talvez tenham dúvidas
quanto ao caráter dessa turba. O tal Pedro Guimarães, ou Pedro Maluco, vejam
que apelido mais objetivo, já vem aquela famosa cara de culpado.
E intuição feminina, meus caros leitores, não costuma
falhar.
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MARLI GONÇALVES – Jornalista, consultora de comunicação,
editora do Chumbo Gordo, autora de Feminismo no Cotidiano - Bom para mulheres.
E para homens também, pela Editora Contexto. (Na Editora e na Amazon).
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