Segunda-feira, 15 de dezembro de 2014 - 06h10
Por Marli Gonçalves
Já começou. Nos próximos dias vai ser um tal de olhar para trás e lembrar tudo de ruim - coisa boa, pensa bem, foi pouca - que aconteceu nesse ano, que a gente vai ficar enjoado. Acho meio chato sofrer de novo, principalmente com as mortes. Também ando lendo muito sobre troféus Melhores de Alguma ou Qualquer Coisa 2014 e acabo surpreendida: como é que eu nunca tinha ouvido falar nessas pessoas tão famosas, de onde apareceram?
Cada nome. Cada fenômeno. Não sei você, mas eu, às vezes, penso que estou habitando um mundo estranho, que caí num planeta errado, que dormi e acordei em outra dimensão. Essa coisa de ver essas premiações e lembranças de retrospectivas de quem "fez sucesso" este ano surpreende e até o Andy Warhol rebola lá onde estiver, reparando que quinze minutos virou muito tempo. O negócio agora é cliques, por segundo.
Pior é ver que umas praguinhas dessas ainda durarão, perdurarão invadindo o ano que vem. Me incomodo especialmente com as praguinhas musicais, já que delas hora ou outra não escaparemos. Não tem jeito. Em geral ultimamente são aquelas que passam tocando naqueles carros alto-falantes-berrantes que até tremem, e que inundam as nossas ruas - o que nos obriga a encontrar com eles de vez em quando parados no mesmo trânsito que nós; bem perto de nós, aliás, a ponto de ter de parar de conversar ou desligar seu próprio som para que ele, o seu som, não fique traumatizado.
Olha pelo espelho, olha só como o sujeito parece feliz com aquele negócio lhe estourando os tímpanos. Pois este será o sucesso, a grande "criação do ano". São músicas que chamam urubu de meu louro, evocam para dançar, elogiam peitos e bundas com termos que só Deus sabe como foram parar ali, descem na boquinha de alguma coisa; são hip hops que mais fazem lembrar algum soluço desenfreado; ou terríveis músicas de amor, desilusão, ciúmes e fim. Você não sabe se chora porque não pode fugir desse som tenebroso ou se fica arrasado de vez porque seu pezinho foi envolvido e está acompanhando o ritmo ou é seu coração que acaba de se identificar com aquele abandono amoroso que conta a música.
Pois agora soube que essa nova fossa, carente, quase de se apunhalar em praça pública, tem até termo criado, sofrência, e um autor, um tal Pablo. Só aqui mesmo. Só aqui mesmo também que o tal Pablo ganha uma página de matéria de jornal. "Adultos bêbados, crianças, cachorros e até um papagaio parecem ser incapazes de segurar as lágrimas ao ouvir músicas de Pablo, criador de um subgênero do brega, o arrocha", diz um trecho da reportagem que chegou a ir atrás das pessoas que teatralizaram o tal Pablo para o YouTube. "O arrocha pode ser dançado a dois, como um forró lento e rebolado, ou sozinho, com o mesmo gingado e o braço direito de ‘O Pensador’, escultura de Rodin, para refletir a ‘sofrência’ da solidão", ainda informa o texto.
Ah, nunca tinha entendido aquele bracinho na cabeça da dancinha desse povo. Agora, sim! Imita "O Pensador", de Rodin. Preciso dar um jeito de usar essa importante informação.
Assim, dito e aprendido isso, volto às retrospectivas que vão invadir todos os canais, e se a gente assistir vai ficar bobo como ver que aquele que arrasou em janeiro já tínhamos esquecido; que vai parecer que morreu até há mais tempo um monte de gente daquela lista que vão falar; e, se possível já deveríamos estar fazendo abaixo assinados implorando de joelhos para que esqueçam aquele 7 a 1. Ninguém precisa lembrar daquilo. Ninguém merece. Podiam esquecer disso, da eleição/reeleição, e de todos os atos de nossa política externa, por exemplo. Coisas que envergonham e fazem mal.
Corrupção não vai ter jeito, porque campeia e campeou. Pior, campeará, e muito, o não que vem. Senão porque mantida, talvez por mais descobertas que as deixa com o bumbum de fora. Retrospectiva. Tem muita coisa mesmo para se retrospectar, como quem nasceu, viveu, inventou, ganhou, perdeu, ficou famoso. A violência que agora nos mostra diariamente até serial killers e ultrapassa qualquer razão.
É. Até como palavra, realmente gosto muito mais mesmo de pensar na perspectiva. Uma palavra - Perspectiva - que parece de cabeça erguida, forte, corajosa, esperançosa, que vê ao longe; projeta, se aplica como ponto de vista e cada um tem o seu e a sua, a respectiva perspectiva. A minha é primeiro a de tentar me manter no mirante do Morro do Otimismo.
Nossa vida acaba sendo projeto geométrico. Andamos em círculos, vivemos em quadrados, falamos em pontos, fazemos triângulos inclusive amorosos. Atravessamos paralelas e viramos na diagonal. São nossas sofrências, nossas querências.
São Paulo, ainda 2014
Marli Gonçalves é jornalista - Ainda acho que a melhor perspectiva só procurando na bola de cristal. E olhe lá....
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Tenho um blog, Marli Gonçalves, http://marligo.wordpress.com. Estou no Facebook. E no Twitter @Marligo
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