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Montezuma Cruz

ACREANA APANHA CALADA


E pela primeira vez o Plano Plurianual de Investimentos reserva R$ 5 milhões para tratar da saúde da mulher violentada.


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Eva Evangelista: impunidade é gritante /M.CRUZ
MONTEZUMA CRUZ
montezuma@agenciaamazonia.com.br


BRASÍLIA – Lá dos confins da selva, a voz firme e o jeito ligeiro de falar da desembargadora Eva Evangelista foram interpretados como ultimato aos poderes constituídos, para que socorram as mulheres amazônicas e brasileiras. A corregedora do Tribunal de Justiça do Estado do Acre denunciou no Plenário 6 da Câmara dos Deputados que a mulher do Acre ainda apanha calada, enfrentando a violência com dificuldades. Faltam-lhe recursos, como também faltam instrumentos às delegacias de polícia para receber a mulher agredida, no Acre e nas regiões Norte e Nordeste.

"A impunidade de crimes praticados contra a mulher não pode mais ser tolerada. No Acre, estamos em falta de juízes, promotores e delegados de polícia", ela desabafou na sala lotada no Seminário Lei Maria da Penha: aplicação, desafios e perspectivas, organizado conjuntamente pelas comissões de Segurança e Combate ao Crime Organizado, e de Direitos Humanos e Minorias.


Eva Evangelista l
embrou que 42% dos processos em Rio Branco têm origem na Defensoria Pública. Otimista, mas sem diminuir o tom enérgico com o qual tratou a questão, anunciou: "Felizmente, entre janeiro e fevereiro de 2008 vamos instalar o Juizado da Violência Doméstica Contra a Mulher, em Rio Branco; foi numa iniciativa do Conselho Nacional de Justiça".

O retrato dessa mazela social acreana: em julho deste ano apenas 16 réus estavam presos por ordem dos juízes das quatro Varas Criminais de Rio Branco, depois de agredirem mulheres ou companheiras. D
os 1.002 processos em tramitação naquele mês nas quatro Varas Criminais, para aplicação da Lei Maria da Penha, apenas 16 resultaram em condenações.

O baixo índice de cumprimento de pena, a morosidade na tramitação dos processos e o atendimento às mulheres vítimas de violência doméstica e familiar estão mobilizando entidades de defesa da mulher. Na 1ª Vara Criminal tramitavam naquele período  185 processos e quatro réus cumpriam prisão. O recorde de agressões à mulher estava registrado na 2ª Vara: 308 casos, com cinco réus presos. Outro volume alto de processos tramitava na 3ª Vara: 300, com apenas três réus condenados. 

 
Dependência financeira
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Santiago: agora há recursos para socorrer mulher agredida /M.CRUZ
Eva distribuiu cópias de uma matéria da Tribuna do Juruá, de Cruzeiro do Sul, na qual, a coordenadora da Delegacia da Mulher, a advogada Nélida Argimon, avalia como positivos os 14 meses de vigência da Lei 11.340, que coibiu a violência contra a mulher no País.
No entanto, Nélida alerta que nas classes menos favorecidas a mulher está apanhando calada. "Porque a lei pune com rigor os maridos agressores e, como muitas vezes, elas são dependentes financeiramente deles e, em alguns casos, com muitos filhos, preferem manter o silêncio para não perder o companheiro, que é o provedor do lar".

Após esse relato entristecedor, o deputado Paulo Rubem Santiago (PDT-PE) tirou a atenção do seu blog — com o qual cobriu em tempo real o seminário — e levou ao plenário a novidade: pela primeira vez em três décadas o
Plano Purianual (PPA) 2008-2011 reservará R$ 5 milhões para o atendimento de saúde a mulheres vítimas de violência. Segundo ele, os recursos serão provenientes de emenda de sua autoria acatada pelo relator do PPA, deputado Vignatti (PT-SC), a quem ele elogiou. Aproveitou para se queixar de que a Lei Maria da Penha é prejudicada pela falta de orçamento para implementar as ações nela previstas, entre as quais, a criação de varas especiais para julgar processos sobre violência contra a mulher. "Há prefeitos que se recusam a contratar defensores públicos em razão das restrições da Lei de Responsabilidade Fiscal".

O representante do Ministério da Justiça, Roger de Lima Lorenzoni, informou que o Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci) será um dos aliados no combate à violência contra a mulher. "Serão criados 11 juizados especiais voltados para o atendimento específico às mulheres vítimas de violência nas principais áreas metropolitanas do País", disse.
Ainda conforme Lorenzoni, para minimizar a situação, o Ministério da Justiça firmou acordo de cooperação técnica entre o Departamento Penitenciário  e a Secretaria Especial de Políticas Para a Mulher, liberando R$ 1 milhão para o setor. Há mais R$ 1,5 milhão para serem liberados.

Desinteresse do Estado

O
promotor de Justiça do MP do Distrito Federal e Territórios, Fausto Rodrigues de Lima, defendeu o desarquivamento de processos judiciais contra agressores. "Tudo indica que o Estado não tem interesse em esclarecer e punir crimes dos quais são vítimas mulheres indefesas", acusou.

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Amine Hadad: apoio de hospitais e universidades /M.CRUZ
Dos 3,5 mil procedimentos criminais em trâmite 1ª Vara Especializada em Violência Familiar e Doméstica Contra a Mulher em Cuiabá, apenas 35 são de homens reincidentes. As denúncias de violência após o vigoramento da LMP triplicaram. As informações são da juíza titular Amine Hadad Campos. Um a
udiovisual expôs com imagens de mulheres vítimas da violência e de homicídios bárbaros em Mato Grosso e no mundo. Falou em pé, caminhando e foi muito aplaudida.

Segundo a juíza, a problemática de gênero em Mato Grosso ganhou maior visibilidade a partir da revelação de estatísticas, dos convênios firmados pelo Poder Judiciário com universidades e hospitais e da força da televisão. "Precisamos da formação humanística das equipes de trabalho e conseguimos melhorar sempre olhando para o artigo 30 da Lei, que prevê o encaminhamento da mulher, dos seus dependentes e do agressor". O apoio reivindicado por Amine Campos é para a rede de atendimento à mulher e se baseia no tripé: projetos, acompanhamento público e cursos de capacitação.

A delegada titular da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher em Goiânia, Mirian Aparecida Borges de Oliveira, queixou-se de que as delegacias precisam ter todas as condições para prestar um atendimento digno às vítimas e punir os agressores. Em Goiânia, segundo apurou, foram registrados quase 700 autos de flagrantes de agressão à mulher, "com menos de 2% de reincidência". Cerca de mil inquéritos abertos foram entregues ao Poder Judiciário.

"Contudo, a aplicação da lei não deve se limitar somente às capitais, mas em todo o interior", alertou. Para Miriam de Oliveira, delegados e delegadas precisam oferecer boa acolhida à mulher nas repartições e no Instituto Médico-Legal, do contrário, eles vão lá uma vez e não voltam mais. No momento, os recursos materiais são ainda insuficientes no que diz respeito a medidas protetivas de urgência. Desde a reforma de viaturas à nomeação de policiais e outros servidores.


Gente de OpiniãoINIBE, MAS NÃO ACABA

■ O presidente da Associação Brasileira de Mulheres de Carreira Jurídica, Herilda Balduíno de Sousa, afirmou que a LMP pode inibir a violência contra mulheres, mas não vai acabar com ela. Ela cobrou do poder público a formulação e a implementação de políticas públicas que reduzam a pobreza, fator, que em sua avaliação, é determinante na ocorrência de violência doméstica. "Sem emprego, moradia, alimentação, educação, o homem e a mulher viverão eternamente em conflito", disse.

FALTAM DELEGACIAS

■ Números fornecidos pela gerente de Projetos de Enfrentamento da Violência Contra a Mulher, Taís Cerqueira: das 399 delegacias especializadas no atendimento à mulher violentada, a maioria está na Região Sudeste. Um alento: 57% dos pedidos feitos nas ligações ao telefone 180 se referem à Lei Maria da Penha. 

HOMENS NA CAMPANHA

Segundo o coordenador da organização não-governamental Instituto Papai (PE), Benedito Medrado, o envolvimento dos homens no combate à violência contra a mulher é uma estratégia importante. Segundo ele, a violência contra a mulher é um problema amplo e deve ser enfrentado por uma multiplicidade de ações. A proposta já fora feita pelo deputado Fernando Melo durante audiência pública em Recife, no mês de julho.

REEDUCAÇÃO DE AGRESSORES  

A representante da Articulação de Mulheres Brasileiras (AMB) Tassiana Lima Alves criticou a destinação de recursos para a reeducação de agressores de mulheres, prevista na legislação. "Nem todos são violentos fora do espaço familiar; eles não são doentes", afirmou sobre maridos que espancam mulheres. Para ela, os recursos deveriam beneficiar a sociedade como um todo.

COMPUTADORES NÃO FUNCIONAM


O deputado Paulo Santiago lamentou à Agência Amazônia que estão vagos cerca de 5 mil cargos de delegados, escrivães e agentes em Pernambuco. Numa viagem a Petrolina ele constatou que, por falta de computadores, escrivães levavam para casa rascunhos de denúncias contra a violência à mulher. 

COMISSÕES PARLAMENTARES


■ O 1º vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, deputado Pedro Wilson (PT-GO), sugeriu a criação de comissões parlamentares para acompanhar a implementação da LMP de outras regulamentações de interesse da sociedade. Na opinião dele, a falta de eficácia da lei pode favorecer a impunidade de homens. Ainda segundo Pedro Wilson, a violência contra as mulheres poderia ser reduzida se a comunidade tivesse coragem de denunciar violações à lei, o que nem sempre acontece. 

PODER JUDICIÁRIO EM FOCO

■ A presentante do Observatório de Monitoramento da Implementação e Aplicação da LMP, Sílvia de Aquino, afirmou que o Poder Judiciário vai estar no foco de atuação da instituição. Segundo ela, a entidade pretende criar um banco de boas práticas para destacar ações que ajudem na implementação da lei e também um canal para divulgar as instituições que não aplicam as medidas legais.

Fonte: Montezuma Cruz - Agenciaamazonia é parceira do Gentedeopinião

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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