Sábado, 22 de dezembro de 2007 - 12h25
MONTEZUMA CRUZ – Hoje faz 19 anos que o líder seringueiro Francisco Alves Mendes Filho, o Chico Mendes, foi assassinado a tiros no quintal de sua casa, em Xapuri, no Acre. Ele morreu em 1988, quando diversos proprietários rurais, inconformados com a possibilidade de uma reforma agrária e a criação de reservas extrativistas, organizaram no estado a União Democrática Ruralista (UDR).
Chico lutava por uma vida digna no campo e nos seringais, no entanto, passadas quase duas décadas de sua morte, o sonho não se concretizou: a miséria campeia na Amazônia, em cujas fazendas ainda existe trabalho escravo e líderes sindicais e religiosos são mortos em tocaias.
A própria família dele continua vítima de uma situação inadmissível, se forem considerados os feitos de Chico e a repercussão mundial obtida na época pelos empates de derrubadas promovidos pelos seringueiros liderados por ele. Até hoje, a viúva llzamar Gadelha Mendes e os filhos do casal, Elenira e Sandino, lutam para conseguir uma pensão do INSS. A causa vem sendo defendida pelo advogado Pedro Paulo Castelo Branco, em Brasília.
No chamado nortão mato-grossense, conforme a Agência Amazônia noticiou recentemente, promotores de justiça estudam uma forma de punir o excesso de queimadas, desta vez, por causarem a lotação de hospitais com vítimas de infecções respiratórias.
"A Amazônia está ocupada. Em todos os cantos, há populações indígenas, há pessoas que trabalham, que colhem o látex e, ao mesmo tempo, lutam pela conservação da natureza. Enquanto houver indígenas e seringueiros na Floresta Amazônica, há esperança de salvá-la", pregava Chico. Nesse aspecto, a previsão do líder se concretizou: o País possui 35 reservas extrativistas com população aproximada de 26 mil pessoas em 7,16 milhão de hectares, segundo dado o Centro Nacional de Desenvolvimento Sustentado das Populações Tradicionais (CNPT). Algumas dessas reservas resultaram da luta de outra população da Amazônia: os ribeirinhos.
Novas frentes, mais fogo
Combater queimadas era uma das preocupações de Chico Mendes / DIVULGAÇÃO |
São as queimadas que indicam a expansão ou retração das atividades pecuárias, de produção de grãos ou de exploração de madeira na Amazônia. Entre janeiro e dezembro de 2005 foram detectadas 161.374 queimadas na Amazônia Legal. No ano anterior, 166.429. Houve um decréscimo de 3,04%. Não estabilizou. Áreas nas quais houve aumento, diminuição ou manutenção na intensidade de queimadas em 2005 podem ser analisadas por estados.
A situação do Acre e do Amazonas é explicada pelo surgimento de pelo menos dez novas frentes pioneiras de agricultura e exploração florestal, além de mudanças no uso das terras. Entre os problemas destacam-se a ampliação de áreas de pastagens e as ocupações especulativas de terras a partir da consolidação da ligação rodoviária entre o Acre (no município de Assis Brasil) e o Peru (em Inãpari).
O monitoramento por satélite mostra que, entre 1978 e 2005, o desflorestamento da Amazônia ultrapassou 500 mil quilômetros quatrados, prosseguindo no início do século XXI a um ritmo médio superior a 20 mil quilômetros quadrados por ano. Dados do IBGE também indicam que a produção madeireira florestal gera renda de R$ 5 bilhões, 127 mil empregos diretos e 105 mil empregos indiretos.
Saúde precária
A oferta de leitos nos hospitais do Sistema Único de Saúde (SUS) na Região Amazônica é a pior do Brasil. No Estado do Amazonas, por exemplo, só há 1,6 leito a cada mil habitantes. No interior dos Estados, em vilas e seringais, é praticamente impossível o acesso aos serviços médicos. A população se vê obrigada a longas e perigosas viagens para buscar socorro médico. No início do seu mandato, o senador Tião Viana (PT-AC), que é médico, revelou ter colaborado para que mais de 30 profissionais cubanos se estabelecessem no Acre. Também faltam médicos em Rondônia, no Amazonas e Mato Grosso.
E Darly volta para casa
Fazendeiro Darli Alves foi condenado como mandante /DIVULGAÇÃ |
Alega-se que Darly está com gastrite crônica e necessita de cuidados médicos especiais. Desde agosto do ano passado, ele cumpria pena no Presídio Estadual de Rio Branco, a pedido da Justiça Federal de Santarém (PA), onde fora condenado a dois anos e oito meses de prisão e ao pagamento de multa por uso de documentos falsos em um empréstimo feito no Banco da Amazônia (Basa), no período em que ficou foragido, entre 1993 e 1996.
A prisão domiciliar de Darly será cumprida integralmente na Fazenda Paraná, na estrada de acesso a Xapuri, onde foi tramada a morte de Chico.
FOCOS 2004 FOCOS 2005 EVOLUÇÃO VARIAÇÃO (%)
AC 905 4.745 3.840 424,31
AM 1.842 4.939 3.097 168,13
MA 18.302 24.877 6.575 35,93
RO 13.205 17.816 4.611 34,92
A resistência fortalecida com os empates
BRASÍLIA – Os seringueiros do Acre fizeram resistiram ao avanço do latifúndio da pecuária. Organizaram-se e, em 1975, colocaram em prática a estratégia dos empates, uma reunião na qual impediam o desmatamento por meio do diálogo e do seqüestro de motosserras e de outros instrumentos de trabalho dos peões a serviço dos fazendeiros.
O Acre viveu uma série de conflitos, que se repetiram em outras regiões da Amazônia. Em 1980 mataram o presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Brasiléia, Wilson Pinheiro. Oito anos depois, mataram Chico Mendes.
Gergório Filho, Chico Mendes (C) e Marina Silva durante encontro em Xapuri /DIVULGAÇÃO |
O projeto inovador passou às mãos do Conselho Nacional dos Seringueiros, criado com a missão de articular e assessorar grupos interessados na organização e reconhecimento de reservas extrativistas em toda a Amazônia. Um ano após a morte de Chico, em 1989, sob a ameaça da desertificação – da qual já se falava naquela década – surgiu a Aliança dos Povos da Floresta, entre povos indígenas e os povos extrativistas. Ficou conhecida como a aliança entre o cocar – representativo das culturas indígenas – e a poronga – representativa da vida dos seringueiros.
No começo do terceiro milênio, são os ribeirinhos amazônicos que empreendem uma nova luta. Querem a regularização fundiária das terras de ilhas e várzeas. E estão se fortalecendo.
Realidade social da Amazônia em números
▪ A expectativa de vida na Amazônia é de 68 anos; três anos a menos do que a média nacional.
▪ As crianças de até 7% de idade constituem 20% da população (14% no restante do Brasil).
▪ Menos de 40% dos partos são precedidos do necessário pré-natal; 30% das mulheres ficam grávidas com menos de 20 anos.
▪ Mais de 13% da população ainda não é alfabetizada.
▪ A maioria das comunidades do interior não tem acesso a todas as séries do Ensino Fundamental.
▪ Um grande número de famílias vive com até meio-salário mínimo. Essa situação atinge, por exemplo, uma em cada três famílias no Tocantins.
{mosgoogle}▪ A Amazônia está incluída entre as áreas nas quais os casos de AIDS têm crescido assustadoramente. É alarmante, também, o crescimento de casos de hanseníase, de malária, de febre amarela e alta mortalidade infantil.
▪ 14% da população não têm moradia.
▪ Até 2003, mais de 1 milhão de domicílios, na área rural, não tinham acesso à eletricidade.
▪ Apenas 11,70% dos domicílios do Norte são atendidos por redes de esgotos.
▪ 78,5% são atendidos por coleta de lixo; no Brasil, o índice é de 83,3%.
▪ Só 59,80% das casas têm água tratada. A Amazônia concentra 80% dos 20% de água doce superficial que o Brasil detém.
Fonte: Montezuma Cruz - Agênciaamazônia é parceira do Gentedeopinião.
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