Domingo, 13 de maio de 2012 - 13h03
Olhei pra trás e vi uma imagem ao mesmo tempo bela e assustadora. Minha mãe corria atrás de mim com o buchão de quase nove meses pulando junto com os peitos. As canelas de pés descalços tão ágeis quanto o meus de nove anos. Zangada, braba mesmo, gritava para que eu parasse. A corrida na vereda, que começava ao lado da nossa casa e ia se acabar nas águas limpa do igarapé, ficava cada vez mais escorregadia. Olhei mais uma vez para trás. O rosto dela estava transtornado, o cabelo desgrenhado solto ao vento. Não dei dez passos e minha pernas se entremearam num rebolo jogado por com precisão. Antes que levantasse, um pé pousou com força no meu pescoço. Uma mão parecendo uma garra de gavião segurou e não largou meu braço. Era o acerto de contas.
Dona Zuleide, filha da índia tapuia Salomé com cearense branco e loiro de olhos azuis de nome Abdon, não escondia seu lado selvagem. E foi com esta força primitiva que criou os oito filhos que teve com o flandeiro, fotógrafo e magarefe Jonas. Sozinha, após perder o marido para uma sirigaita mais nova. Quebrou coco, lavou roupa para fora, fazia bolos e pirulitos que eu e meus irmãos vendíamos porta a porta para sustentar a família. A força daquela mulher pequena, frágil, de menos de metro e meio, pele cor de bronze e cabelos de graúna, não tinha limites.
Nunca cogitou de dar os filhos. E nunca os deixou sem o de comer, sem o de vestir, sem o de calçar. Analfabeta e sem profissão, negou-se a ser puta. Pôs os filhos na escola. Tinha o respeito e a consideração dos que a conheciam. Jovem e bela, com sua enorme cabeleira cuidada a suco de babosa, dava gosto vê-la a caminho da igreja cercada pelos filhos. Todos vestidos com roupas humildes, mas limpinha, bem engomada e cheirosa. Guardo estas imagens com um carinho que não consigo descrever.
Lembro de minha mãe talvez com vinte anos quando eu tinha sete, banhando-se nos riachos e igarapés após lavar toda a roupa e pô-la para corar ao sol. Junto com as outras mulheres, brincavam nuinhas jogando água umas nas outras. Belíssima, esguia, peitos empinados. Era uma Mãe d’Água muito bonita. Brincava tal qual fazia nos águas da aldeia dos seus pais. Naqueles instantes mágicos era tão criança quanto eu e os outros meninos. Nos ensinava a bater tambor nas águas. Emitia um som surdo, gutural, primitivo. Não havia pecado nem angústias e nem sofrimento naquele paraíso. A felicidade era plena. E o encantamento continuava a caminho de casa. Trouxa de roupa limpinha na cabeça e as mãos segurando as minhas ou de meus irmãos e irmãs.
Todos os filhos carregam marcas dos castigos que receberam. Tenho os meus até hoje. Me orgulho deles. Nos colocaram na caminho da honradez, do respeito, da ética. Nos ensinou a levar pra casa somente o fruto do nosso trabalho. Estabeleceram limites instransponíveis entre o teu e o meu. Todos vivos a caminho da melhor idade, premiaram-lhe com muitos netos, bisnetos e trinetos. Ainda forte com razoável saúde para sua idade, continua a cuidar, com joelhos no chão e as súplicas aos céus, de cada um de nós.
Nunca ouvir de nenhum de meus irmãos e irmãs qualquer queixa registrando um mínimo sinal de trauma ou qualquer laivo de tristeza pelos castigos recebidos. Ao contrário. Todos agradecem às medidas tomadas por aquela guerreira tapuia, mulher forte do norte, que nos colocou no caminho certo. Feliz Dia das Mães.
Osmar Silva
Sr.osmarsilva@gmail.com
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