Terça-feira, 8 de outubro de 2013 - 09h06
Lembro direitinho a última vez que o vi. Estava sentadinho num banco de ponto de ônibus na avenida José Vieira Caula. As pessoas esperando a condução em pé, ao seu redor, não se davam conta da importância histórica daquele homem simples, sentado ali, como qualquer trabalhador a caminho do serviço. Não sabiam que se tratava de Reynaldo Galvão Modesto, ex-senador da República, membro da primeira bancada parlamentar de Rondônia eleita em 1982 pelo PDS para representar o estado no Congresso Nacional.
Na modéstia das vestes, na simplicidade dos movimentos e da fala, não dava mesmo para suspeitar que aquele senhor de bigodinho e cabeleira negra, num rosto precocemente amadurecido, fosse o todo poderoso Modesto, coordenador especial do Incra do final dos anos 70 e começo da década de 80. O homem que representava a esperança de milhares de migrantes vindos de todas as partes do Brasil para ocupar e desbravar a última grande fronteira agrícola no Norte do país.
Aquele cidadão ali, ignorado por todos que passavam à sua frente em seus carrões, já tivera o domínio de carrões e aviões e o poder de influir para o melhor ou o pior na vida de muita, mas muita gente mesmo. E fez isso, até onde eu saiba, para melhorar a vida de quantos pode.
Como repórter e proprietário do O Parceleiro, acompanhei de perto o seu trabalho. Pessoalmente, levei algumas demandas para sua apreciação em favor de comunidades há muito perseguidas por poderosos latifundiários. Foi assim com o moradores do Paca Assada, comunidade que vivia em conflito com os donos da Fazenda Nova Vida. Muitos já tinham sido expulsos de seus pedaços de terra. Outros verteram o sangue sobre ela. E muitos morreram sob a mira dos fuzis dos jagunços. Mas os que aguentaram até sua chegada, alcançaram a vitória e receberam, de suas mãos, o tão sonhado título definitivo de sua propriedade. Guardaram as espingardas para as onças e foram criar seus filhos em paz.
Galvão Modesto era homem do Teixeirão. Escolhido para implantar a infraestrutura fundiária do estado que estava nascendo. O homem certo para recepcionar e assentar os milhares de migrantes que chegavam diariamente por todos os meios. A maioria, vinda do Sul no lombo da União Cascavel. Ele queria, como o Capitão Sílvio de Farias e Assis Canuto, um modelo diferente, sem grandes concentrações de terra nas mãos de poucos. Preferiu dividir Rondônia em assentamentos de reforma agrária que privilegiasse o pequeno produtor. E foi o que fez.
O frenesi do trânsito à sua frente era o resultado do estado que criou. Todos que passavam e os que no seu entorno também esperavam ônibus, vivem da consequente estrutura fundiária que, todo ano, aumenta sua capacidade de produzir riquezas que, agora, toda aquela gente usufrui. Galvão Modesto implantou as bases produtivas do único estado da federação onde, de fato, se fez reforma agrária com justiça social. Não era moda falar de agricultura familiar, bem mais tarde popularizada por Lula e seus seguidores. Mas aquele homem simples, ali sentado, foi o verdadeiro criador e implantador da agricultura familiar de Rondônia. De lá pra cá, ninguém fez mais que ele. Para desespero da esquerda, já que Modesto foi combatente representante da direita.
Logo que assumiu a coordenação do Incra, mandou me chamar em Ariquemes para uma audiência em seu gabinete em Porto Velho. Fiquei preocupado. Amigos me aconselharam a não ir. Finalmente, argumentavam, ainda era didatura militar. E O Parceleiro era muito liberal e democrático. Temi, mas fui.
- O senhor reconhece as matérias publicadas neste jornal? Perguntou-me do outro lado da mesa enorme do seu gabinete.
- Sim, reconheço. Respondi encarando-o.
- Este jornal é seu? Quis saber.
- Sim, é meu . Confirmei.
- E foi o senhor quem escreveu essas matérias? Interrogou Modesto.
- Fui eu mesmo, por ser um pleito justo. Justifiquei.
- E o senhor não teve medo?
- Tive não doutor. É dever da minha profissão, assegurei.
- Pois você venceu! Você ganhou! E virando-se para um assessor ordenou: mande um rádio agora mesmo para o nosso escritório do Jaru e diga para tirar a cerca da área do Incra.
E ali, naquele ato, acabou o sofrimento do povo do Jaru que tinham que contornar toda a área do Incra – era área de segurança nacional – para se deslocar para qualquer parte do cidade. O Parceleiro vinha há tempos realizando uma campanha em favor do direito de ir e vir dos cidadãos de Jaru. Esse fato está registrado em exemplares do jornal contidos dentro da pedra fundamental da Igreja Matriz do Jaru. Foi a forma que a sociedade encontrou para agradecer a defesa feita por esse repórter. O povo já havia derrubado aquela cerca várias vezes. Mas ela sempre era erguida.
A ninguém parecia. Mas aquele homem simples sentado ali naquele banco do ponto de ônibus da avenida Caula, é personagem da nossa história que os meus e os seus netos verão nos livros escolares.
Osmar Silva
é jornalista – sr.osmarsilva@gmail.com
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