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Serpa do Amaral

Adeus ao elegante instrumentista da kizomba Guaporé!


Adeus ao elegante instrumentista da kizomba Guaporé! - Gente de Opinião
Na madrugada de ontem (11/04), calou-se para sempre o cavaquinho de Genésio, o chorão do Villas Bar, parceiro de Bubu Johnson, o Noite Ilustrada de Rondônia; de Nicodemus, mestre em violão de sete cordas, do grande violeiro Norman Johnson Júnior e do baterista Júnior Lopes, no espetáculo Prisma Luminoso. Com esses seletos artistas Genésio viveu intensos momentos de notoriedade, em noites memoráveis vivenciadas no já extinto Villas Bar, localizado na Avenida Carlos Gomes, no centro da cidade.

Ao escolher Rondônia para viver e executar seus inúmeros concertos musicais no mais variados ambientes culturais, Genésio já trazia consigo uma invejável folha corrida de bons serviços prestados à música popular brasileira. Do Rei do Baião a Waldik Soriano, de Reginaldo Rossi a Trio Nordestino, passando por Alípio Martins, Maurício Reis, Fernando Lélis e tantos outros, muitos foram os que provaram do tempero brasileiríssimo da sua guitarra, do seu violão ou do seu sentimental, impecável e ébrio cavaquinho. Genésio era um daqueles migrantes que os nativos deste chão se orgulham de receber nestas plagas karipunas: aquele que vem para efetivamente somar, multiplicar e dividir arte, conhecimento, profissionalismo, talento e poesia. Como um apátrida cigano em perene peregrinação pelos quatro quadrantes do território brasileiro, Genésio era um pássaro arigó que em revoada circense pela amazônia ocidental se encantou com os beiradões rondonienses e por aqui fincou raízes, fez carreira e construiu sua eterna morada. Corria o ano de 1986 quando ele, tocando em tenda de circo, aqui em Porto Velho, se passou para a banda Cobras do Forró, tomou apego pela cidade e desempenhou em seguida a função de professor de música. ébrio cavaquinho.

Adeus ao elegante instrumentista da kizomba Guaporé! - Gente de Opinião

Genésio na Quinta Cultural do BASA, no teatro Banzeiros

Perfeitamente ambientado aos recantos melódicos porto-velhenses, Genésio tinha trânsito livre em todas as tribos culturais, se embrenhando tanto numa pajelança de boi-bumbá do majestoso Corre Campo ou Az de Ouro quanto num desfile de escola de samba; participava com desenvoltura da roda de samba, do pagode, do chorinho chorado, da seresta demodê ou mostra livre de MPB. Todas as torrentes de paixão se harmonizavam no seu coração recheado de talento e espiritualidade musical. Dessa arte foi servo humilde, cativo e seleto. Seus pulmões existenciais tinham na música seu oxigênio predileto e irremediável. Por isso respirava acordes, quadrados, perfeitos ou dissonantes, com sétima ou com nona aumentada, como quem sorve da atmosfera a alegria de viver das doses homeopáticas do bom ar produzido pela floresta amazônica durante os dias de intenso sol. Porém, depois de percorrer em regozijo uma bela escala ascendente, iniciou, forçado pelo câncer, a dolorosa digitação da sua escala descendente até atingir o silêncio absoluto, a não-nota, pausa que embora seja fúnebre, também faz parte da notação musical na grande peça orquestral que é a vida. No céu, pela sua dignidade afro-descendente, pela soberana humildade dos virtuoses e servidão incondicional com que se entregou à arte de fazer o povo sorrir e cantar com seus quindins tônicos e ligeiros, no cavaquinho, Genésio a essa hora está sentado à direita de Valdir Azevedo. 

Cuidamos mal da saúde de Genésio, a sociedade se diverte mas cuida muito mal dos seus fazedores de emoção e arte. Em regra eles vivem à míngua, se contentando com pequenas sobras do banquete bilionário servido ao redor do fazimento das usinas hidrelétricas de Santo Antônio e Jirau. Todavia, apesar dessa ingratidão social, a vida de Genésio entre nós se transformou em sonata da qual não podemos dizer que temos saudade porque ela ecoa todos os dias na caixa acústica de nossos espíritos como um réquiem em culto à alma do homem que encheu a cidade de luz com vagalumes que alçavam vôo de seu instrumento, o cavaquinho, executado com maestria e fineza, como conviria ao mais elegante instrumentista da kizomba Guaporé. A ele, o nosso Adeus!

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Fonte: Antonio Serpa do Amaral Filho / antonio.serpa@trf1.gov.br

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