Sábado, 7 de julho de 2012 - 05h05
Depois de vencer de forma surpreendente as prévias do Partido da População Enganada (PPE), nas quais participaram o Saci-Pererê e o Boto, o lendário Curupira é anunciado como o mais novo pleiteante ao cargo de prefeito de Porto Velho. A Floresta, em festa, saudou Curupira pelo seu projeto político de assumir o alto posto no Palácio Tancredo Neves. Pela primeira vez na história karipuna se viu tal efusão de esperança e confiança: a hora da mudança chegou.
O Saci-Pererê, com parcimônia das suas peraltices, elogiou a vitória do seu oponente e sacramentou: “Ai de mim! Tentei. Pulei e sumi. Mas deu curica. Não! Deu Curupira. A Keka tinha razão. É o Curupira mesmo. Vou dizer, para acalmar todos, que não tenho dúvida de que Porto Velho terá um grande prefeito. A história do Curupira fala por si só. Ele nunca abandonou as causas populares e ambientais. Apesar muita gente se assustar com sua sinistra aparência (ele é feio mesmo!), não há maior lutador pela causa do desenvolvimento porto-velhense. O meu velho cachimbo está à disposição para ajudá-lo nessa jornada. Vamos juntos. Ai, ai, ai, sumi...”.
O Boto, conformado com a derrota na convenção, mostrou seu apoio: “É preciso respeitar a vontade da Democracia. Nosso Partido está unido e não medirei esforços para ajudar o Curupira nessa empresa. Nossa terra e nossas águas precisam de gente como ele para gestor. Tiro, com os riscos inerentes, meu chapéu para o Curupira e o parabenizo pela vitória. Foi escolha acertada do Partido. Conclamo todos os botos, sem distinção de cor, e moças para apoiar essa força política que veio para ficar".
Na sua primeira entrevista como candidato oficial do PPE à prefeitura, Curupira foi muito enfático no seu pronunciamento: “Sei que alguns não aceitaram a minha escolha. A esses peço para pararem de encandear suas visões com essa irresignação. Vou seguir firme e forte nessa luta. Queiram ou não. Porto Velho não aceita mais esse cenário decadente. Parabenizo o Saci e o Boto pela lisura do nosso pleito interno. E sei que vamos caminhar juntos na depuração política de nossa cidade".
Curupira, após longa pausa para coçar a barriga peluda, continuou: "Talvez acreditem que minha feição seja um pouco esdrúxula para um candidato a prefeito. Eleger alguém com a aparência 'não padrão' vai a ser a grande novidade dessa eleição. Meu rol de atributos físicos é muito peculiar. Minha voz é grave assobio que incomoda muito. Tenho ciência disso. Mas é verdadeira e não servirá de instrumento para enganar o Povo. Por isso, podem tirar as mãos dos ouvidos... Tanta gente fala com voz de seda e a mentira é o conteúdo de tudo que se pronuncia. Meus pés, virados para trás, apenas mostram que caminho no sentido contrário de todos os outros candidatos. Assim, ninguém vai me seguir ou me encontrar para propor acordos ilícitos. Não trilho o caminho da improbidade: essa é a marcha dos meus pés. Minhas orelhas, grandes e cavernosas, são a certeza de que tenho uma grande e sensível audição para os problemas de meus conterrâneos. Esta cidade tem muitas pessoas com as orelhas bastante limpas. Porém, a consciência delas está cheia de traça da desonestidade".
Emocionado, o Senhor da Mata finaliza sua fala: "Na verdade, feio é ser um ladrão, ainda mais quando o bem é público. Isso eu não serei. Minha feiúra não pode ser confundida com a sordidez política de muitos de meus adversários. Aviso aos caçadores do dinheiro público: vocês não terão mais vida fácil na floresta administrativa de Porto Velho. Por isso, peço aos porto-velhenses que não se preocupem com meu aspecto exterior: meu espírito da mata é um oceano de ética. Eis as minhas palavras”.
Após o discurso inaugural, Curupira cumprimentou todos os que lá estavam presentes. E se embrenhou na Floresta para o descanso diário. Sabia que não seria fácil vencer eleições contra os que vivem a enganar o Povo com mesquinhas facilidades: cal, tijolo, cesta básica, promessa de emprego, remédio, gasolina, churrasco e carnaval.
No outro lado da cidade, os partidos da Oposição e da Situação não ficaram muito satisfeitos com o anúncio da candidatura do Curupira a prefeito de Porto Velho. Os caciques das duas frentes realizaram um encontro urgente para deliberar sobre o acontecimento e divulgaram uma nota: “Em nome do Povo de Porto Velho vimos anunciar o nosso repúdio à candidatura de tão odioso e feio morador da mata. É inconcebível que um ser tão monstruoso pleiteie o cargo mais importante desta Capital. Ainda mais quando se desconfia de que nem pessoa humana esse bizarro ser seja. E mesmo que seja humano não se pode eleger um candidato que tem entre os seus aliados o Saci e o Boto. Há boatos e sacis de que a própria Mula-sem-cabeça é o cabeça da campanha desse candidato do PPE".
Com os olhos marejados de cifrão, o líder da nova velha coalizão política local reafirmou: "Além do mais, o Partido da População Enganada não tem legitimidade para eleger candidato algum, salvo se for um de nós que, do nosso jeito, sempre governamos esta cidade. Ora, nós somos as únicas margens desse rio político que aqui se formou. Eventual terceira escolha não respeitaria a tradição desta Capital. Curupira não tem formação ou competência para administrar os graves problemas desta cidade. Vejam o nosso currículo brioso: o pai do meu tataravô foi vereador, o meu tataravô foi senador, o sobrinho do meu trisavô foi prefeito, etc. Os grandes problemas desta Capital fomos nós que criamos nesses longos anos, mas pretendemos, em outros longos anos, resolvê-los. Nosso compromisso com esta terra não merece dúvidas. Em suma, digam não ao candidato Curupira. Tudo isso em nome da nossa da história de luta por Porto Velho”.
Enquanto isso, na copa de uma velha e sábia castanheira, entre roncos e arrotos, Curupira sonha com uma Porto Velho diferente. Não para o milagre do acontecimento que todos os outros candidatos prometem. O candidato Protetor das Florestas não é tão pobre assim para dar esmolas. Curupira se mostra pronto para gerir as grandes e necessárias escolhas que esta cidade sempre mereceu e que todos os antecessores deixaram para a instância das coisas esquecidas. Curupira enxergava os nossos políticos como eles eram: bichos, presos à teia inebriante e corrosiva da ganância, que semeiam a infelicidade coletiva.
Ação Popular: Respeitem Porto Velho!!!
No infortúnio da solidão atroz, o jeito é quedar-se nu com a mão no bolso, olhando para as impassíveis paredes que miram, espiam a gente até de rabo
Um dia da caça, outro dos “povos novos”, de Darcy Ribeiro
Num primeiro voo de radiofusão para além das plagas amazônidas, a Música Popular de Rondônia começou a ser mostrada na Rádio BBmusic, da cidade Búzi
As lágrimas internacionais que choraram a morte do poeta
A democracia voltou a ser ameaçada no país cujo nome é uma homenagem a Símon Bolívar, o Libertador das Américas. Com essa última quartelada, já são
Os homens do poder sempre passarão; o bom humor, passarim!
Apesar do vazio cultural, da perda irreparável para o humanismo e para a criatividade brasileira e do profundo incômodo emocional provocado pela par