Quarta-feira, 5 de novembro de 2008 - 05h52
Da taberna para o shopping é o mesmo que da caverna para o pop.
Já somos cultura de massa: temos, enfim, a nossa pomposa Catedral do Consumo. O Haiti não é aqui, porque agora já somos sudeste. Enquanto o mundo se descabela com a crise econômica que assola as bolsas de valores, a civilização Guaporé dá o bote e chega ao primeiro mundo da noite pro dia. É o milagre econômico à moda karipuna. Não temos um teatro é verdade -, mas temos ruínas arqueológicas do que seria um teatro, ruínas da melhor qualidade, mantidas incólumes na Esplanada das Secretarias pelo governador Ivo Cassol e isso já é alguma coisa.
O consumo, e não o Ser, impõe-se como o grande problema existencial da província cândido-mariana. Esse senhor, todavia, tem apenas a patente de sacerdote do templo, posto que a Divindade mesmo o Mercado, onipresente, onisciente e onipotente -, como toda eminência parda, é como orelha de freira: existe, mas ninguém vê, pairando, como alguns monstros sagrados do teatro brasileiro, acima do bem e do mal.
A mega obra mercantilista mudou para sempre a história de Porto Velho. Os historiadores da Unir deverão utilizar, daqui pra frente, as designações AS para antes do Shopping, e DS, para se referir a fatos Depois do Shopping. Está inacabado e foi inaugurado nas coxas ninguém pode negar -, mas não importa. Mais vale o mito que o rito, e reza que a transubstanciação da hóstia no corpo do Salvador. O delírio, já diria Galvez, o Imperador Acre, é a nossa sina, ou a nossa crina de cavalo baio que fuja a galope, marchando José, José para aonde...
O trânsito da urbe enlouqueceu de vez. O prefeito nomeou uma comissão de notáveis para discutir o caos. O problema, entretanto, não é a mão única da Calama, sim a lama da calada da noite em que as nossas vozes foram usurpadas sorrateiramente. E já que nada dissemos, nada temos a dizer. Não somos mais os donos da voz. Resta-nos a voz do dono.
Um shopping não é apena um shopping, é uma entidade complexa e envolvente, um modo de vida, um sistema, uma cultura, um sonho ou construção ideológica que embasbaca gregos e bolivianos, seduzindo as massas na mesma proporção que o maior sucesso da banda Calcinha Preta.
À simples notícias de que teríamos nestas barrancas esse ícone do tribalismo urbano, Porto do Velho entrou em polvorosa. Embratel e Pedacinho de Chão na hora reajustaram o valor de seus imóveis em pelo menos 80%. Em seguida, teve início a queda-de-braço entre o shopping dos Canadenses e o grupo Calixto, e a cidade passou a viver momentos de febril ansiedade e indefinições. As especulações passaram a jorra em cascatas; a comunidade política fragmentou-se em alas pró contra o shopping dos Canadenses, político acusou prefeito, prefeito processou político, e todos tomaram partido da situação, envolvendo desde os empresários da Fiero e da Associação Comercial aos pés-inchados do mercadinho do Quilômetro Um.
Porém não foi a dúvida cruel sobre quais as grandes lojas se instalariam no templo consumista que tomou conta do imaginário popular, e sim uma certa serraria, feinha por sinal, que ousou dizer não à majestosa edificação. E quanto mais a construção avançava, mais desconcertante e contrastante ficava a situação. As pessoas torciam o nariz para decepção de ter um shopping bacana com uma velha serraria encravada nas barbas da Renner e da C & A. Esse povo tem lá suas razões. Por outro lado, seríamos a única capital a ter um shopping com serviço de beneficiamento de pernamanca, mourões e balaústra para cerca de quintal de pobre. Para uns, o japonês (logo o descobriram que o dono do empreendimento é um japa) só sairia dali morto, como herói dos novos tempos; para outros, o oriental ensinava aos nativos que não lutaram para preservação do antigo Mercado com quantos paus se faz a canoa da resistência cultural. Uma outra turma, entregando a rapadura, espalhou boatos que o japa, Kikushi de batismo, queria 3 milhões para lavar da área, e não a merreca dos dois milhões de reais ofertados pelos canadenses. Aí a imagem heróica do nisei ficou feia na foto. Mas fazer o quê, se habemus shopping! Somos dopping!
Fonte: Antônio Serpa do Amaral Filho
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