Quarta-feira, 3 de outubro de 2012 - 13h47
Na manhã em que o céu se fez moldura, seu José procurou se engalanar com o paletó para datas especiais. Não era batismo ou casamento. Era o dia das eleições municipais. José não queria deixar de participar da escolha do destino da cidade. Por isso, precisava usar o seu traje mais elegante. Depois de alguns ajustes, olhou-se no espelho e aprovou a vestimenta. Conferiu os documentos e colocou a carteira no bolso. Seguiu sereno para o destino.
José morava próximo da escola na qual votaria e logo chegou ao local de votação. Não demorou e era a sua vez de votar. Após apresentar o documento pessoal para o mesário, José foi ao córner de votação. Digitou o número do seu candidato e a musiquinha tocou. Sorriu e deu alguns passos em direção à porta e, antes de sair da sala, profetizou: “Para quem ainda duvida, sou bastante realista, por isso, o impossível vai acontecer”.
Outros josés, marias, joaquins, franciscas também votaram imbuídos do mesmo ânimo. Sabiam que o destino da cidade deveria ser decidido naquela data. Não podiam adiar para não se sabe quando a felicidade coletiva. Era o dia do acerto de contas. Nesse clima de maturidade política, a eleição transcorreu sem maiores complicações. Agora, era hora de aguardar a apuração das urnas para saber a decisão do Povo.
Quando o resultado da primeira urna foi encaminhado por meio eletrônico à central de apuração, o técnico responsável pela conferência informou ao conselheiro eleitoral uma ocorrência relevante: “Doutor, aconteceu algo estranho com os dados dessa urna, algo muito estranho”. A autoridade, meio que espantada com essas palavras, retrucou: “Por favor, que fato estranho é esse?”. “Senhor, por incrível que pareça, essa urna tem 100% dos votos para o candidato Curupira”. Todos se olharam sem saber o que dizer. De repente, o telefone interrompeu o silêncio: “Alô, alô, aconteceu alguma coisa com a zerésima da minha urna, só apareceu voto em favor de um tal de Curupira...”.
De modo sistêmico, os mesários de todas as seções informaram à central que os votos foram dirigidos ao mesmo candidato. Pela primeira vez, em uma eleição, um candidato havia conseguido um percentual absurdo de voto. Praticamente 100% dos votos foram para o Curupira. Em razão desse fato, o conselho eleitoral se reuniu às pressas para deliberar sobre o insólito caso. A boataria e a especulação circulavam pelos corredores. A reunião reservada do conselho daria o veredicto para a eleição. E todos do lado de fora queriam ouvir o que se discutia lá dentro.
Enquanto isso, a liga da injustiça aguardava o resultado das eleições com tranqüilidade. O tio patinhas calculava como recuperaria o investimento feito e pensava em construir um cofre maior. A super-poderosa foi ao banheiro para retocar a maquiagem e, nesse intervalo, aprendeu mandarim e participou de uma teleconferência sofre física quântica. O lanterna-verde preparava o anel de energia para transformar a cidade num passe de mágica, assim como ele fez nos mundos em que viveu e nada fez. A medusa ensaiava o discurso para dissimular a sua amizade com o monstro que destruiu a cidade. O hipócrates se refestelava com um espetinho e estava a pensar como saciaria a sua fome de discurso. Os anões discutiam sobre as secretarias que receberiam para apoiar os maiorais. E todos eles nem imaginavam o que estava por vir.
Quando a reunião começou, o presidente do conselho foi enfático: “Não tenho dúvida de que esse fato, apesar de ser totalmente surreal, é uma realidade que nós deveremos enfrentar. Quase 100% dos votos foram para o Curupira. Conversei com os técnicos de informática e o acontecimento não tem causa interna ou externa. Não se trata de um vírus ou de uma programação equivocada da urna. Fizemos testes há poucos minutos com as urnas e elas não apresentam nenhum defeito. Não tenho dúvida de que o Povo votou conscientemente no Curupira". Depois dos debates, os outros conselheiros foram unânimes: “Devemos anunciar a vontade do Povo”.
Depois de quase uma hora, o conselheiro presidente foi ao átrio para o pronunciamento oficial: “Boa-noite, senhoras e senhores, representantes dos partidos e imprensa. Venho aqui em nome do conselho anunciar o resultado final das eleições. Tivemos um caso insólito nestas eleições. Já verificamos todo o sistema e afirmamos com certeza de que não houve nenhuma espécie de erro ou de problemas nas urnas. Depois da apuração de todas as urnas, proclamamos o candidato Curupira como vencedor, com quase 100% dos votos válidos. Essa é a vontade do Povo”.
A liga da injustiça teve um verdadeiro ataque epilético ao saber do resultado oficial. Cifrões se desmancharam ao chão. Maquiagens foram quebradas. Da cartola mágica, saíram lebres e anéis de lata. A cabeça da medusa se desprendeu do corpo e o monstro destruidor fugiu com medo de ser petrificado. Outros fugiram e não pagaram o espetinho. Os anões decidiram pedir asilo político em um circo. E, por incrível que pareça, estava desfeito um ciclo pernicioso para a história desta cidade.
Seu José, ao assistir ao noticiário, sorriu e olhou para sua esposa que tecia grandes esperanças. Ele disse com ar de satisfação: “Minha querida, sabe uma coisa? Eu aprendi nesses longos anos de vida que, quando as autoridades acham útil dizer a verdade, é porque elas não conseguem encontrar uma mentira melhor. Acredito que o Povo finalmente teve coragem para dar um fim a uma época de destruição da cidade e de dilapidação da coisa pública. Creio que nossa cidade, agora, vai deixar de viver no final dos tempos”.
Nas ruas, a população numa efusão de esperança e mudança se preparava para uma nova aurora chamada respeito. Curupira, já ciente da revolução que acontecera, saudou o renascimento da cidade e elogiou seus concidadãos: “Parabéns para nós que escolhemos sem medo de acertar”. "O Povo, ao dizermos não aos que sempre se preocuparam em desrespeitar esta cidade, transformamos o impossível em realidade". Nossas matas, tudo enfim... de volta às mãos do Povo: cantava a população.
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