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Vinício Carrilho

Advogados pedem a ditadura militar


             É assustador o crescimento da desrazão de advogados (ou entre bacharéis em direito) que defendem, saudosamente, a ditadura militar de 1964. Não se entende a base lógica em que apoiam esta mentalidade militar. Basta-nos pensar, sob a lógica escolar, que a ditadura é um regime de exceção e que o direito é pautado por regras e não pela exceção. Pragmaticamente, o advogado deve defender o contraditório, mas esses “operadores do direito”, contraditoriamente, defendem regimes de exceção em que não se pode contrariar o poder.

Na ditadura, pelo emprego da lógica mediana, não há contraditório – em nenhum Estado de Exceção que se prese os direitos fundamentais são preservados. Aliás, sem exagero da inteligência jurídica, como não se quer o contraditório também não se fala em direito de ampla defesa. E por que na ditadura não há contraditório? Porque, seguindo a mesma lógica cartesiana, o regime não admite ser contraditado. O contraditório permite que o regime seja contrariado.

O que permite concluir inicialmente que o advogado que defende os regimes de exceção – a exemplo da ditadura militar de 1964 – está dando um tiro no pé; está dizendo claramente que ele, advogado, é desnecessário, uma vez que os advogados só podem atuar no exercício pleno de suas prerrogativas e estas só são admitidas no regime democrático. É só na democracia que se permite a existência da contradição no interior do mesmo sistema de normas – na democracia existem partidos, grupos, camadas e classes sociais que se contradizem constantemente. Mas, mesmo contradizendo-se, sobrevivem os grupos e os indivíduos rivais que fazem uso de regras moderadoras. Às vezes, a democracia pode falhar e – nesses casos, há previsão constitucional de implantação de regimes de exceção: Estado de Defesa; Estado de Sítio.

Teoricamente, estamos emburrecendo

A principal diferença entre os regimes de exceção admitidos na Constituição Democrática e as ditaduras está na lei. A ditadura, como foi o nazismo (Estado de Sítio) e o Brasil pós-1964, faz vigorar uma Lei de Plenos Poderes (AI-5). O Estado de Exceção, regulado constitucionalmente por regras democráticas (exceto os regimes fascistas), tem uma forma muito específica de se portar: salvaguarda-se o retorno à normalidade logo após se veja transcorrido o tempo determinado pela suspensão de certos direitos, exceto os direitos fundamentais; observando-se, inclusive, o disposto rigidamente em lei e sob a vigilância do Legislativo e do Judiciário.

Desde a Constituição de Weimar, em seu polêmico artigo 48, o Estado Moderno passou a assegurar, sob circunstâncias excepcionais, o Estado de Exceção e amplos poderes ao presidente para suspender seções da Constituição e o próprio Parlamento e de intervir com a ajuda das forças armadas. Note-se a diferença: aboliu-se a separação de poderes, em favor da estratocracia. Na ditadura – e seria redundância dizer que vige ali um tipo qualquer de Lei de Plenos Poderes – os três poderes são resumidos a um só: um super-executivo: Kaiserpräsident. Em que pese o nefasto AI-5, o Kaiserpräsident não é tão visível desde a Constituição de Bonn, de 1949.

Contradição ou desinteligência jurídica

Alguns advogados (ou bacharéis em direito) que se escoram na ditadura – “porque lá havia regra” – deveriam lembrar que o nazismo impôs uma ditadura com leis duras (sic), sendo a mais conhecida a própria ordem de se acabar com os judeus, e sob a legalidade de um Decreto do Holocausto. Mas, o pior mesmo é esta confusão mental que nos atormenta como esquizofrenia jurídica; pois, em seu proselitismo e tautologia intelectual, tais advogados da ditadura não percebem defender a lógica de um regime de exceção montado em regras. O erro conceitual, mental, lógico, moral está em desconhecer que: 1) a exceção é inserida como regra; 2) a exceção desfaz a regra; 3) a exceção vira regra.

Se isso é fácil ou difícil de entender não é culpa da democracia e nem da Filosofia Jurídica. O não entendimento dessa lógica, entretanto, é um perigo real para todos nós. Afinal, o caos fervilhante de advogados de lógica dúbia (em que a premissa maior está torta), na defesa do fim das regras democráticas, é um sinal vermelho de que a esquizofrenia jurídica nacional está muito pior do que já foi. Na falta de expressão melhor, há contradição ou desinteligência jurídica em seus argumentos preconceituosos. Como dizem os franceses, sua lógica está limitada pelo non sense. Desmoralizou-se o direito, e agora temos pela frente o embrutecimento da lógica. Toda ditadura é péssima, mais ainda por abolir a lógica para ficar com a desinteligência.

Vinício Carrilho Martinez

Professor Adjunto III da Universidade Federal de Rondônia – UFRO, junto ao Departamento de Ciências Jurídicas/DCJ. Pós-Doutor em Educação e em Ciências Sociais e Doutor pela Universidade de São Paulo. Bacharel em Ciências e em Direito. Jornalista.

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