Sexta-feira, 31 de maio de 2013 - 12h07
Corrupto bom é corrupto preso, certo? Errado, corrupto bom é aquele que foi empobrecido pela justa ação do Estado-Juiz, que teve de devolver o dinheiro roubado (porque é um tipo especial de crime, gravíssimo, de roubo social), e que só lhe restou a alternativa (“optatória”) de se ver “arrependido”, isto é, depois de encarcerado moralmente, teve de auxiliar o Estado a combater outros corruptos ainda soltos. Este seria o ideal e até pode ser a realidade de alguns países, como na Itália no curso da famosa Operação Mãos Limpas:
O convívio dos homens de honra ensinou-me que as lógicas mafiosas são tudo, exceto antiquadas ou incompreensíveis. Que elas são apenas e de fato as lógicas do poder. E que só devem ser interpretadas à luz de um único critério: o da sua funcionalidade em relação a um fim. Isso me incitou a ser mais direto, a encurtar a distância entre o dizer e o fazer. Como os mafiosos. Esses mafiosos parecem-me, em alguns momentos, os únicos seres racionais num mundo de loucos. Sciascia também dizia que, na Sicília, se escondem os piores cartesianos [...] Nos meus momentos de melancolia, interrogo-me às vezes, pensando no destino dos homens de honra: por que pessoas que possuem qualidades intelectuais tão evidentes são obrigadas a inventar uma atividade criminosa para poder sobreviver com dignidade? (Falcone, 1993, p. 61).
Ao contrário do juiz Falcone, morto brutalmente pela Máfia italiana, no Brasil, nosso Judiciário, historicamente (e salvo pequeníssimas exceções), serve-se apenas de sua origem social: as elites e as classes dominantes. Em todo caso, é um alento ver que Paulo Maluf, ex-prefeito de São Paulo – procurado pela Interpol, polícia internacional, e impedido de sair do Brasil sob pena de ser preso –, devolveu recursos ao erário. O único pecado é que a determinação não partiu da justiça brasileira, mas sim de Jersey (você já ouviu falar desse lugar?):
A Justiça da Ilha de Jersey determinou nesta semana o repasse à Prefeitura de São Paulo de 1 milhão de libras esterlinas, equivalente a cerca de R$ 3,3 milhões, que estavam depositadas em contas movimentadas por familiares do ex-prefeito e deputado Paulo Maluf (PP-SP)[1].
Particularmente, não vejo oportunidade na prisão, até porque não acredito que corruptores contumazes (“quanto mais, melhor”) possam ser ressocializados, pois não se aplica a eles as teses de Beccaria. Gente que rouba da saúde e por isso mata enfermos nas UTIs e CTIs é o pior tipo de psicopata, sem remorso e sem se por no lugar do Outro, porque não existe nada além de si. Em todo caso, o próprio jurista italiano recomendava a perda do bem: “É justo que aquele que rouba o bem de outrem seja despojado do seu” (Beccaria, 2003, p. 80). Eu não tenho fetiche por prisões, mas se quisessem prendê-lo, como fizeram com Jean Genet (imortalizado com seu “Diário de um Ladrão”), ou para relembrar o Pe. Vieira em Sermão do Bom Ladrão, por mim tudo certo.
Também confesso o gravíssimo crime de não ter lido Crime e Castigo, de Dostoiévski, mas vou ler – talvez a única vantagem de ser professor universitário (de escola pública) seja ter tempo para ler obras que a maioria nem sonha que existam. O melhor mesmo é sonhar um Brasil sem corruptos, grandes e/ou pequenos.
Bibliografia
BECCARIA, C. Dos delitos e das penas. São Paulo: Martin Claret, 2003.
FALCONE, G. & PADOVANI, M. Cosa Nostra: o Juiz e os “Homens de Honra”. Rio de Janeiro-RJ : Editora Bertrand Brasil S.A., 1993.
Vinício Carrilho Martinez
Professor Adjunto III da Universidade Federal de Rondônia
Departamento de Ciências Jurídicas
Pós-Doutor em Educação e Ciências Sociais
Doutor pela Universidade de São Paulo
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