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Gente de Opinião

Vinício Carrilho

Ditadura Constitucional


                                                                                      

            A ditadura já está instalada;

imagine se tudo não está louco

e com o tempo correndo rápido demais

Vinício Carrilho Martinez (Dr.)

Professor Ajunto IV da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar/CECH

Marcos Del Roio

Professor Titular de Ciências Políticas – UNESP/Marília

Hoje, já vivemos sob a névoa de um Fascismo Institucional. Mas pode e será pior – quando vierem as já (de)cantadas mutações constitucionais: sem ser exaustivo, refluirão constitucionalmente os artigos 6º, 7º e parte do artigo 5º da Constituição Federal de 1988.

Os presos políticos já estão por toda parte; contudo, em breve haverá permissão constitucional e legislação ordinária regulamentadora do Estado de Exceção (Agamben, 2004). Se o golpe do impeachent (11/05/2016) é abusivo, o futuro do fascismo constitucional será extensivo.

A este efeito – com base em 55 medidas em tramitação no Congresso Nacional – já se antecipa uma Ditadura Constitucional, que soterrá em definitivo a Constituição Federal de 1988 e as prerrogativas e as defesas dos direitos fundamentais[1].

Uma reforma constitucional decente poderia ter trazido um novo modelo político, que conferisse maior estabilidade funcional ao governo e punição exemplar as ações de políticos profissionais corruptos, por exemplo.

Todavia, a mutação constitucional entoada por todos os bolsonazis e Macunaímas só terá híbridos em sua prole: tribunais, como o de MG, já proíbem e penalizam quem "fala" contra o golpe.

Leis estaduais proibem professores de manifestarem desacordo ideológico com as ações violentas de tomada de poder (Alagoas[2]), como é o caso da violência cometida contra a democracia e o Estado de Direito no processo de impeachment.

Imagine quem age! Aliás, foi como vimos acontecer aos estudantes secundaristas do Estado de São Paulo, por se rebelarem contra a inação do Judiciário em investigar a fraude da merenda – encaminhada de dentro do governo estadual[3].

Não há – dentre os não-esquizofrênicos e/ou psiopatas – quem fique feliz em dizer isso, mas a mutação irá gerar uma Ditadura Constitucional. Se em 1988 conhecemos a Constituição Cidadã, a partir de agora teremos outra, apelidada de A Mosca: como fora a Constituição Polaca de Getúlio Vargas, em 1937.

Pouco importa se as previsões legais estaram impressas na Constituição, se foram seguidos os ritos do Parlamento, o fato é que se irá legitimar (como direito positivo) dispositivos constitucionais antidemocráticos e antipopulares. Uma Constituição formulada com base no antidireito (Filho, 2002), como freio à democracia, é apenas a base legal de uma Ditadura.

De todo modo, ainda por contar um sem número de leis estaduais que viriam depois, o país estaria varrido pelo fascismo legal que se incorporará à Ditadura Constitucional. A polícia federal[4] já age sob esse escudo, à espera de mais leis de exceção.

Esta forma de repressão, acelerada para manter o poder tomado com a força do fascismo, será aprovada pelo Congresso na forma de PEC (Proposta de Emenda à Constituição) ou em Miniconstituinte.

            Engana-se quem fala que estas são características e/ou condições do Estado de Direito burguês. Uma olhada rápida pela história do Estado e do direito burguês simplifica a discussão: Constituição de Weimar, na Alemanha de 1916; Constituição de Bonn (1949): Estado Democrático alemão; Constituição Iugoslava (1953); Constituição Portuguesa (1976): Estado de direito democrático; Constituição Espanhola (1978): Estado social e democrático de direito (Miranda, 1990).

Em suma, o Estado de Direito burguês pode produzir duas ramificações básicas: democracia ou fascismo (bonapartismo). Em curso de retrocesso e regressão, desembarcamos da democracia (ao menos formal) para um fascismo muito atuante.

            Desse modo, pode-se dizer, esta mutação constitucional já em andamento conhece muito bem o cesarismo regressivo (Gramsci, 2000): interna corporis ao Judiciário (seletivo e autocrático) e no Legislativo (o que valia para os adversários, agora é crime de responsabilidade).

            No Judiciário, em raras situações de confronto ideológico ao fascismo institucional já operante no país, em que as regras e as bases do Estado de Direito estão demolidas, juristas e juízes – poucos, repita-se aqui – interpelam a chamada politização/partidarização do Judiciário[5].

Por sua vez, ao invés de se dar resposta condizente aos questionamentos institucionais, Ministros da Suprema Corte ironizam, dão de ombros, à democracia e ao direito fundamental de se valer do Princípio do Contraditório[6].

A sequência virá com o bonapartismo (Marx, 1978): prevê-se o uso das forças armadas para reprimir e desalojar sem-tetos, sem-terras e populações indígenas. Certamente, tudo será amparado em lei – como é o caso da PEC 215. Pois bem, a mutação constitucional de A Mosca em nada se diferirá da constituição fascista de Mussolini.

O que, em suma, caracteriza a Constituição Fascista – como vestimenta da Ditadura Constitucional – é a incorporação do antidireito como cláusula pétrea em defesa da Razão de Estado. A Constituição Fascista (A Mosca) é uma constituição fechada (Haberle, 2008) ao povo, ao trabalhador, ao pobre, aos negros, às mulheres – porque desconhece a inclusão social, econômica, jurídica e política.

Por fim, é fato de que a mutação constitucional já aprisiona o Político, para que o político profissional não seja incomodado. Também não gostaríamos de dizer isso, mas já vemos fissuras totalitárias.

Bibliografia

AGAMBEN, Giorgio. Estado de Exceção. São Paulo : Boitempo, 2004.

FILHO, Roberto Lyra. O que é direito. 17ª edição, 7ª reimpressão. São Paulo : Brasiliense, 2002.

GRAMSCI, Antonio. Cadernos do Cárcere. (Org. Carlos Nelson Coutinho). Volume III. Nicolau Maquiavel II. Rio de Janeiro : Civilização Brasileira, 2000.

HÄBERLE, Peter. Pluralismo y Constitución: estudios de teoría constitucional de la sociedad abierta. Madrid: Tecnos, 2008.

MARX, Karl. O 18 Brumário e cartas a Kugelmann. 4. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978.

MIRANDA, J. Textos Históricos do Direito Constitucional. Lisboa : Imprensa Nacional – Casa da Moeda, 1990.


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