Terça-feira, 2 de fevereiro de 2016 - 05h03
Uma das modalidades aproveitadas do termo genérico Estado de Emergência é sua aplicação diante do boicote/blecaute econômico enfrentado pela Venezuela. As razões são muitas e se trata de mais uma modalidade da forma-Estado de Exceção, quando são viabilizadas condições jurídicas e institucionais não-usuais para debelar um problema também não-convencional. Portanto, uma medida de exceção para um problema excepcional.
Também é comum sua aplicação nas situações de epidemia, pandemia, desastre natural ou grave crise social ou de insegurança pública localizada. No Brasil, como há guerra civil ou social intensa e extensa, na medida de exceção, sugerem-se mudanças constitucionais que permitiriam, por exemplo, maior emprego das Forças Armadas na contenção da guerra generalizada, como um tipo de Estado de Emergência societal.
Ou, no combate ao mosquito aedes, em outro caso, em que a entrada à força nas residências foi autorizada[1]. Na mesma linha do descontrole da saúde pública, mas em modalidade um pouco mais inusitada, temos um Estado de Emergência mundial, decretado pela OMS, no "combate" ao Zica vírus[2]. São medidas de exceção. O problema é quando, de exceção, de transitoriedade, tornam-se regras impositivas e permanentes.
Além do bloqueio econômico imposto a Cuba, por décadas, pelos EUA, destaca-se o boicote econômico imposto ao governo de Salvador Allende, no Chile de 1970 a 1973, especialmente no corte da distribuição de bens, produtos e mercadorias básicas à vida de milhares de pessoas. O que agravou a crise social e “motivou” forte reação de civis e militares para perpetrar um Golpe de Estado e implantar uma ditadura sanguinária. É óbvio que todas as forças que se prestam a golpes dessa natureza tiveram e têm ampla participação nos preparativos que agravam uma suposta crise já instaurada. Isto é, criam instabilidade para propor o golpe.
No caso da Venezuela, a crise de desabastecimento, a derrota das eleições proporcionais e o enfrentamento ao sistema capitalista esgotaram as vias de manutenção econômica. Fosse um regime político alinhado ao poderio dos Estados Unidos e, certamente, a economia seria estável. Como faz oposição cerrada ao Império, enfrenta bloqueios econômicos internos e externos. Sua reação política à economia que agoniza, agora, conhece um novo desfecho: o Estado de Emergência Econômica[3].
No Brasil, a Carta Política de 1988 não reconheceu tal estatuto jurídico; pois trata da “situação de emergência”. O suposto Estado de Emergência – na verdade, situação de emergência – é regulamentado pelo Decreto Nº 7.257, de 4 de agosto de 2010.
“Art. 2o Para os efeitos deste Decreto, considera-se: III - situação de emergência: situação anormal, provocada por desastres, causando danos e prejuízos que impliquem o comprometimento parcial da capacidade de resposta do poder público do ente atingido”.
Esta anomalia jurídica – pois que não se dirige a situações de normalidade cotidiana – deveria servir para proteger ou assegurar a sobrevivência das pessoas atingidas. Em todo caso, o governo federal poderá ser invocado para repatriar verbas ou aditivos de socorro emergencial.
Sem licitações, para ganhar tempo, o dinheiro público deveria minorar o sofrimento dos que perderam quase tudo. E aí começa outro problema, o da salus publica, uma vez que a saúde do erário já é comprometida havendo controle apertado, imagine com regras frouxas.
Note-se, por preciosismo, que o decreto não retrata um Estado de Emergência, empregando-se somente a expressão composta de “situação de emergência”; bem como prevê o “estado de calamidade pública”. Sendo a situação de emergência mais extensa e sem tempo determinado.
Porém, como os institutos da situação de emergência e da calamidade pública, via de regra, são manuseados pelo mesmo Poder Público que deu origem ao problema a ser debelado – por incapacidade, improbidade ou negligência –, o Decreto 7.257/2010 acaba tendo efeitos muito mais políticos do que socorristas e humanitários.
Propositalmente, o texto constitucional também não emprega Estado, em maiúsculo, para que não haja confusão com o Estado de Defesa (artigo 136) e o Estado de Sítio (artigo 137), visto que são institutos propriamente políticos, voltados, por exemplo, à segurança das instituições públicas e à integridade nacional.
No caso da Venezuela, impõe-se mais um capítulo no encerramento da democracia liberal-representativa. E sobra a lição, recuperada da história, de que a luta contra o capital hegemônico não é isenta de duras represálias.
Vinício Carrilho Martinez
Professor Ajunto IV da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar/CECH
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Vinício Carrilho Martinez (Dr.) Cientista Social e professor da UFSCar Márlon Pessanha Doutor em Ensino de CiênciasDocente da Universidade Federal de