Domingo, 2 de agosto de 2015 - 21h27
Essa forma cínica de evitar alguns problemas e de superfaturar outros é típica do fascismo tupiniquim. É pior, mais grave, lamacenta, do que a prima-irmã: a indignação seletiva. Neste tipo, o sujeito (sujeitado) vê apenas o que lhe interessa e massacra quem o acusa de seleção imoral e de imolação do correto, justo ou direito.
Na indignação restritiva se pratica o racismo, não se registra empregado(a) doméstico(a), mas se arvoram de defensores da República: a todo custo, inclusive. Defende-se a intervenção militar, mas se desculpa a corrupção municipal. Perdoa-se o fato de que as velhas elites (hoje mais empobrecidas de dinheiro e de valores) fabricaram o primeiro presidente da era moderna a sofrer impeachment: Collor.
Claro que também não se considera a sonegação de impostos e a evasão de divisas como crimes contra o Povo. Tudo isso é bem ruim, mas o pior é o fato de que, sob o fascismo cultural, o(a) indignado(a) restritivo(a) não admite e ainda impede (sobretudo com o uso da lascívia, da intimidação e da força física) que os normalizados pela crítica ampla possam se indignar contra a seletiva do mal-público.
Portanto, restritivamente, esses indignados de meias-verdades são intolerantes, incapazes de suportar o peso da verdade de que, no fundo, são incapazes de se indignar contra os verdadeiros males que os geraram e que degeneram a sociedade atual.
Em especial, os praticantes da indignação restritiva não suportam aqueles que se indignam com o proto-fascismo que, os seus pares seletivos, plantam todos os dias em sua miopia política: só têm olhos para os outros. A “trave”, a sujeira nunca se revela na visão distorcida, de “esgueia”, que lançam sobre os lucros que deixaram de obter – porque não foram convidados para o butim.
Têm, evidentemente, um olhar atravessado sobre a República; desconfiam, sobremaneira, quando se diz que a coisa pública é de todos, pois equivale a colocar os pobres de riqueza material ou despossuídos de poder diante das lentes republicanas. Os eletivos usam lentes bifocais: reservam pra si o perdão de quem só olha o próprio umbigo.
Na linguagem popular, jamais admitiriam que “pau que bate em Chico, também bate em Francisco”. Por si, consideram-se donos da via de mão única e, não por acaso, são críticos do típico “pensamento único”. Monotemáticos, criticam apenas a corrupção dos outros. Não é, por certo, uma questão de tolice ou de analfabetismo político, uma vez que sabem perfeitamente “recortar o real”, pinçar o que lhes interessa.
Na melhor das hipóteses, é oportunismo. Pode-se, assim, defender show de pagode ou sertanejo – custeado com dinheiro público – mesmo havendo falta de merenda escolar adequada. O restritivo – de crítica dócil – pouquíssimas vezes insurge-se contra o nepotismo, por exemplo; afinal, sempre há a possibilidade de lá chegar ou, se for o caso imediato, de lhe cair no colo um cargo comissionado.
Se na evolução das espécies o maior mérito deve ser premiado, de acordo com a indignação restritiva, o jeitinho brasileiro deverá colocar as coisas em seu devido lugar. Daí o senso propalado de que o ser honesto é tolo, idiota, ao fazer as escolhas erradas e não se juntar à indignação imoral e seletiva. Praticantes de uma política tosca, para os restritivos, Direito é sinônimo de privilégios; se têm prestígio, então, a lei deve ser privatizada para “contornar” outros problemas criados pela mesma lei.
O ser imoral é aquele que se insurge porque, na retribuição de favores, o pacto da canalhice foi quebrado e um outro qualquer (ainda mais “esperto”) levou suas benesses. Se você leu o texto até aqui, pode apostar que acabei de fazer muitos inimigos sem sequer os conhecer – e que o deus da política permita que seja sempre assim, que eu jamais os conheça.
Vinício Carrilho Martinez
Professor da Universidade Federal de São Carlos
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Vinício Carrilho Martinez (Dr.) Cientista Social e professor da UFSCar Márlon Pessanha Doutor em Ensino de CiênciasDocente da Universidade Federal de