Sábado, 4 de janeiro de 2025 | Porto Velho (RO)

×
Gente de Opinião

Vinício Carrilho

Lei Maria da Penha; Ensino obrigatório para meninos e meninas - Por Vinício Martinez


Lei Maria da Penha

ensino obrigatório para meninos e meninas

Como se sabe, Marília/SP esconde sua miséria humana nas encostas do vale que circunda a cidade. O visitante ou o morador alienado acha que a cidade não tem miséria avassaladora, salvo os andarilhos, porque não se vê facilmente suas favelas e guetos sociais. Literalmente, é preciso ir morro abaixo para se tocar da realidade de embrutecimento. E, salvo engano que requer prova em contrário, nenhuma legislatura da Câmara Municipal fez nada substancial a respeito.

Em todo caso, hoje vou tratar de ato louvável que tirou a Câmara Municipal de Marília das provas de recuperação em final de ano. Trata-se da aprovação de obrigatoriedade do ensino da Lei Maria da Penha nas séries fundamentais, em toda a rede municipal de ensino. Junto com a falta de quórum para a elevação do IPTU em 10%, a medida legislativa merece uma nota 9. Com o 5 que acumulava ao longo do ano, por hora, está com média 7. Não é uma maravilha, mas passa de ano. Na verdade, estava para ser reprovada com “Zero” (grande, redondo e grafado em vermelhidão) por retirar o atendimento preferencial a idosos e deficientes físicos. Enfim, mostra que há recuperação mesmo para os piores – todo professor sabe disso.

A ação municipal que institui a obrigação do ensino da Lei contra a violência doméstica ou pública da mulher – que não se confunde com o feminicídio (crime hediondo) – repactuou o município com o processo civilizatório. Ao contrário das seitas neo-nazistas que pregam a cura gay, dos fascistas que apoiam o ensino religioso confessional, fecham exposições de arte, proíbem shows para os Sem Tetos ou sentenciam o Enem sem direitos humanos, o legislador municipal revelou capacidade de emancipação político-jurídica.

Para se ter uma ideia do que é o processo civilizatório, pensemos que o Estado Social instituído a partir dos anos 1920 – constante da Constituição de Weimar de 1919 (debulhada por Hitler), sob o impulso da Revolução Russa, e seguida da Revolução e da Constituição Mexicana (1917) – trazia o Pacto da Sociabilidade. Qual seja: a função precípua do Estado de Direito deve ser a criação de condições exequíveis à sociabilidade. Sem isto, o poder e o direito não servem ao “homem social”. Alcançamos esta previsão somente com a Constituição Federal de 1988, desde o Preâmbulo (que o jurista não lê), e que hoje, infelizmente, encontra-se em franco desuso.

Sob o avanço do fascismo pelo país afora, dentro e fora do Estado, o exemplo da Câmara Municipal é mais do que notável, ainda que agora precise de realidade fática. Uma coisa é a previsão legal (um ganho), outra é sua efetividade (o grande obstáculo). Como sugestão, e imagino que as autoridades envolvidas já acionaram este curso de ação, indico o envolvimento direto das instituições de ensino que mantém cursos de Pedagogia e de Direito – incluindo a cidade de Garça/SP no roteiro –, a OAB Mulher municipal, todos os segmentos da Secretaria Municipal de Educação e demais advogados(as) engajados na sobrevivência do processo civilizatório.

Talvez a maior dificuldade operacional esteja em qualificar todos(as) os(as) professores(as), gestores, pessoal técnico-administrativo e demais trabalhadores em educação do município, em matéria jurídica tão necessária quanto especializada. Porém, não vejo como a Lei possa ser uma realidade sem que se promulgue a maior consciência jurídica possível – sem exceção – aos envolvidos na educação municipal.

A última sugestão que me parece lógica, neste mesmo sentido, é que, com a maturação do tempo, avalie-se a possibilidade de se ofertar o ensino de direitos fundamentais, nas escolas municipais, porque o racismo e o elitismo são tão nefastos quanto a misoginia. Portanto, ampliar-se-ia o leque do conhecimento jurídico elementar. Enfim, esse é outro capítulo.

Vinício Carrilho Martinez (Pós-Doutor em Ciência Política)

Professor Associado da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar

Departamento de Educação- Ded/CECH

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

Gente de OpiniãoSábado, 4 de janeiro de 2025 | Porto Velho (RO)

VOCÊ PODE GOSTAR

 Toda tese é uma antítese

Toda tese é uma antítese

A ciência que não muda só se repete, na mesmice, na cópia, no óbvio e no mercadológico – e parece inadequado, por definição, falar-se em ciência nes

A Educação Constitucional do Prof. Vinício Carrilho Martinez

A Educação Constitucional do Prof. Vinício Carrilho Martinez

Introdução Neste texto é realizada uma leitura do livro “Educação constitucional: educação pela Constituição de 1988” de autoria do Prof. Dr. Viníci

Todos os golpes são racistas

Todos os golpes são racistas

Todos os golpes no Brasil são racistas.          Sejam grandes ou pequenos, os golpes são racistas.          É a nossa história, da nossa formação

Emancipação e Autonomia

Emancipação e Autonomia

Veremos de modo mais extensivo que entre a emancipação e a autonomia se apresentam realidades e conceitos – igualmente impositivos – que suportam a

Gente de Opinião Sábado, 4 de janeiro de 2025 | Porto Velho (RO)