Sexta-feira, 15 de julho de 2016 - 14h10
Em tempos de terrorismo avançado, de Estados ou de “lobos solitários”, é preciso pensar o poder, o direito, a política, o Político fora/além dos paralelos do domínio político-jurídico (potestas) ou da dominação racional: lógica, “processo civilizatório”, ética, teleologia.
Em tempos de profunda recessão dos padrões civilizatórios, especialmente a orquestra badalada pela Bancada BBB (boi, bala, bíblia), é urgente pensarmos o direito que nos cerca e que advirá. Neste exato momento, até mesmo a rotina do Congresso Nacional é regulado por uma mentalidade fascista.
Portanto, a formulação política de Benjamin (2013) volta-se contra o capital e o Estado repressor, especialmente os movimentos retrógrados que sentia sob o avanço do nazismo. O fato é que se movimenta largamente uma cultura da exceção.
As ações só se transformam em violência quando interferem em relações éticas, ou seja, quando são designadas como Direito e Justiça. A etimologia germânica para o conceito de Direito é expressiva: KRITIK - "delimitação de limites". Sendo ainda derivada do verbo KRINEIN (grego) para expressar os sentidos de "critério" e de "crise".
O poder-direito (GEWALT) com origem na violência (fonte privilegiada do direito), e no bojo da luta política pelo direito, transparece na oposição entre Estado e lutas sociais (na requisição de direitos políticos); na contradição inaugural do Estado de Direito, entre o "poder-como-violência"- do Estado ("monopólio jurídico do uso legítimo da força física") e do Direito (Poder Extroverso: gestão dos aparatos administrativos, ideológicos e coercitivos do Estado) - e a "violência-como-poder" (Poder Constituinte; greve geral).
Neste último sentido, GEWALT personifica o verbo-conceito arcaico WALTEN (imperar, reinar, "ter poder sobre"): no processo civilizatório equivale à passagem da dominação patriarcal à dominação racional-legal. Na forma de POTESTAS (GEWALT), refere-se à dominação pelo Poder Político, também perceptível no substantivo composto STAATSGEWALT (autoridade ou poder do Estado); como VIS, implica no uso/abusivo da força/violência.
Desse modo, trata-se da crítica do poder como violência, retratando-se a crítica do Estado (KRITIK, GEWALT) e do Direito (a coerção como VIS). É uma crítica que recupera a tradição clássica de que "direito é poder"; pois, referencia-se no poder fundamental instaurador.
Sob o Poder Constituinte - poder instituinte da "violência organizada" (Poder Político) - deriva o Direito como ordenamento jurídico que corresponde ao Estado (POTESTAS). Portanto a origem do poder (GEWALT) e do Direito (VIS) é a violência inaugural (URSTAAT).
Diz-se que o Estado de Direito deve regular a violência: controle social, império da lei. Contudo, se o Estado de Exceção é parte integrante do Estado de Direito (pois, a exceção figura como regra de direito) – e se a exceção é a pura violência (GEWALT) – não se apresenta aí uma contradição nos termos?
Afinal, se o direito é a violência (“direito sem coerção é como arma sem munição”), e se o Estado de Direito está inoculado de meios de exceção, é de se concluir que o direito não é o meio mais adequado para conter a violência (dada sua origem: KRITIK).
Diante dos pressupostos anunciados nas questões, como definir (juridicamente) um sentido para o Estado de Direito que esteja livre dos meios de repressão/coerção? Se de fato houver um conceito válido juridicamente de Estado de Direito – submerso na exceção –, por outro lado, não será a contraprova de que o direito é capturado pelo realismo político designado pelo próprio Estado de Exceção que lhe assegurou a origem ou sobrevida?
E, nesse caso, não será concludente o fato de que não haverá direito de exceção (ainda que sob a marca legalista do Estado de Direito) que possa ser legitimado? Em conclusão, pode-se admitir que toda exceção serve ao poder (realismo político) e que, por definição, é ilegítimo e injusto – posto que serve tão-somente aos Grupos de Poder Hegemônico?
O Estado de Direito guarda as ferramentas do poder adicional requerido pelo Estado de Exceção e, após sua decretação (Lei Marcial), instaura-se outro tipo de Estado de Direito (tutelado, juridicamente, é claramente regressivo quanto às garantias dos direitos fundamentais) e, assim, submerso em regras típicas e precisas do Poder Político que se torna absoluto no manejo do direito (retraindo-se, portanto, a ação do Legislativo e do Judiciário, suspende-se a autolimitação do poder), o Estado de Direito define-se como repressivo (politicamente).
Validado como Estado de Direito de Exceção (para além do Estado de não-Direito: lastreado por leis injustas), o medium que daí decorre comprova o fato de que o direito responde à violência dominada pelos grupos de poder hegemônicos; o direito exarado corresponde ao embate sob o manto do realismo político. Por fim, estabelece-se a natureza da lógica jurídica do Estado de Direito: submerso em regras constitucionais (anteriores) e em leis de exceção (positivadas posteriores).
Ou, dito de outro modo: a natureza jurídica do Estado de Direito responde ao comando do soberano que edita leis de exceção. Esta é a precisão de uma lógica jurídica exarada da lógica política de conquista ou de manutenção do poder absoluto. Sob o (co)mando da exceção, o Estado de Direito é absolutista – e talvez esta tenha sido a maior engenhosidade do liberalismo político: conter os reclamos populares por participação política com a recuperação e o manuseio dos meios de controle social editados pelo Absolutismo (ou cesarismo).
De toda forma, resta convicta a conclusão de que o Estado de Direito não é uma fórmula vazia, pois, preenchida de poder de exceção, não interroga ao poder que lhe deu vida e manifestação pela via forma absolutista. A única regra absoluta no Estado de Direito de Exceção é, (in)justamente, a obrigação de o Estado de Direito não admoestar o Poder Político (STAATGEWALT).
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Bibliografia
BENJAMIN, W. Para a crítica da violência. IN : Escritos sobre mitos e linguagem. São Paulo : Editora 34, 2013.
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Vinício Carrilho Martinez (Dr.)
Professor Ajunto IV da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar/CECH
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Vinício Carrilho Martinez (Dr.) Cientista Social e professor da UFSCar Márlon Pessanha Doutor em Ensino de CiênciasDocente da Universidade Federal de