Sábado, 7 de setembro de 2013 - 14h03
Havia um programa humorístico de TV que parodiava a inscrição da bandeira de Minas Gerais, ao dizer: “Liberdade à Tardinha”. Hoje, quando vi cenas do 7 de Setembro no Rio de Janeiro, com manifestantes invadindo a faixa do desfile e centenas, milhares de policiais correndo, jogando bombas de gás, prendendo, primeiro achei ridículo que meia dúzia fizesse tanta bagunça, depois senti vergonha ao ver a polícia defender o que há de pior na política.
Em todo caso, a polícia tinha mesmo de defender as “autoridades” (sic) ali presentes, porque estavam no exercício de suas funções e, até a próxima eleição, representam o Estado do Rio de Janeiro. Isto é, bem ou mal, sejam podres poderes ou não, este é o governo e, democraticamente, entendo que a única forma de deixar o cargo é com novas eleições ou se houver renúncia. Do outro lado, estavam jovens pseudo-anarquistas (Black Blocs mascarados) que deveriam ler W. Reich – Escuta Zé Ninguém!
Os mascarados não me representam, não representam o pensamento anarquista, não representam os indignados no país – aliás, não sei se representam interesses inconfessáveis. Em todo caso, estavam lá e suas ações ajudam a confundir a opinião pública. Primeiro, cometem um erro primário ao confundir governo e Estado. Não conseguem canalizar sua insatisfação contra o governo do Estado em que vivem – e que também pode ser São Paulo ou Minas Gerais – e assim denigrem o Estado como se fosse o governo.
Os mascarados não têm conhecimento para análise política e atingem os prédios públicos (ou seus servidores) como se fossem o governo. Não sabem que o governo é transitório, partidário, limitado pela(s) ideologia(s) que controlam o poder. Confundem governo com governabilidade (condições da função) e, ainda mais primariamente, com a função de governar: cumprimento do dever legal. Imaginam que “implodindo” o Estado (sic) estarão destruindo o Princípio da Autoridade e que, sem Estado, também não haverá governo ou organização social. Em sua infantilidade política, sonham com um mundo cor de rosa (ou preto) em que não haja controle social. Deveriam estudar a sociologia básica do ensino médio para saber que não há sociedade sem poder ou então fazer terapia para entender o papel dos pais.
Depois, confundem conjuntura com estrutura. A crise de moralidade porque passamos, em nenhum momento, foi fermento para uma revolução social. Respeito muitos que pensam o contrário, mas os mascarados não sabem nem definir em que se fundamenta este chamado direito à revolução. Mas, o pior, confundem a ira contra Sérgio Cabral com a crítica ao capitalismo monopolista de Estado. É claro que essa análise é chata e não querem nem saber o que é isso.
Os mascarados não sabem que o Estado é uma instituição que tem por missão representar e garantir a organização social. Na democracia, o Estado deve ser tratado como “organização” e, desse modo, é fácil notar que a própria produção do direito que nos rege (a todos) se dá de forma orgânica, sistêmica. No regime democrático, o direito se produz de maneira organizada e sob a visão de mundo que se quer mudar a realidade organicamente, sem abalos ou em total desordem das instituições. Em seu infantilismo, os mascarados recusam toda forma de heteronomia. Neste anarquismo primário, confundem individualismo (fazer o que quiser, contra todos) com autonomia (dar regras a si mesmo). Parece que ainda lutam contra a figura paterna.
Pode-se inquirir se o Brasil é democrático (é claro que não é!), pode-se duvidar da seriedade das autoridades, pode-se ter medo das instituições que nos cercam (afinal, há pouca regularidade ou segurança jurídica), mas o que não se pode confundir, de modo nenhum, é insatisfação com despolitização. Quando os mascarados quebram os prédios como neoluditas pós-modernos – nem sonham quem foi Ned Lud – apenas inibem o povo em sua vontade de sair de casa, para participar das marchas pela ética e pela vergonha pública. Aquele um milhão de pessoas que saiu em São Paulo e no Rio de Janeiro voltou para o sofá, exatamente, quando os pseudo-anarquistas começaram a depredar e espoliar o espaço público.
Como se diz com ponderação, não precisamos de mais máscaras, aliás, precisamos é tirar todas as máscaras sociais para desvelar o malfeito, a corrupção, a hipocrisia, a opressão social. Se gostasse de máscaras iria assistir Zorro – não vou porque já passou a idade e porque prefiro Sancho Pança ao Sargento Garcia. Sancho Pança presa a ironia social e a recusa da manipulação. Aliás, Zorro não agredia ou expunha seu povo ao perigo. Parece piada, mas sua intenção quando atacam a polícia com estilingue é de que haja o revide contra o povo desarmado, gerando mais insatisfação contra os aparelhos do Estado. Outra piada: estilingue?
No fundo, gostaria de viver num país educado, porque não estaria descrevendo a banalidade política. O certo é que não se faz política com ignorância. Historicamente, já aprendemos, a pior política é aquela embalada pelo espontaneísmo, oportunismo.
Vinício Carrilho Martinez
Professor Adjunto III da Universidade Federal de Rondônia - UFRO
Departamento de Ciências Jurídicas/DCJ
Pós-Doutor em Educação e em Ciências Sociais
Doutor pela Universidade de São Paulo
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Vinício Carrilho Martinez (Dr.) Cientista Social e professor da UFSCar Márlon Pessanha Doutor em Ensino de CiênciasDocente da Universidade Federal de