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Gente de Opinião

Vinício Carrilho

Para uma Sociologia Política do fascismo



- O fim do sublime Político

- Ou o início de uma “nova” era da sublimação da política

É preciso não confundir a política com o Político; nem a “politização da justiça” (partidarização) com a “judicialização da política” (necessária). O risco é enorme, pois com a deslegitimação da representação ganha força a "terceira via": o fascismo.

A exceção daí nascente não permite a livre-manifestação política das classes, das nações, dos grupos, das camadas, dos estratos e dos setores político-sociais que compõem a sociedade nacional.

O Político, para ser exato, tanto se idenfica na luta pelo direito, quando os pais exigem que seus filhos não sejam maltratados na escola por uma diretoria negligente, quanto nas reivindicações de classe social dos trabalhadores do campo e da cidade.

O Político incluiu, na esteira da filosofia grega clássica de Aristóteles, a organização de bairros, a negociação familiar de poder entre homem e mulher, a consciência política que distingue status e papel social, a votação no vereador, a definição das atribuições do prefeito, do governador e da Presidência da República.

Quando se define, constitucionalmente, cargo e função pública também verifica-se o mesmo sentido expresso (ontológico) dessa instância da vida humana chamada de Político. Quando se premia o sistema financeiro, quer dizer, improdutivo, com mais-direitos e, ao revés, pune-se as classe trabalhadoras com a desqualificação dos direitos fundamentais trabalhistas, pranteia-se uma política que minimiza o Político.

Hoje, com a política representativa e partidária em frangalhos, o Político – a humanização pela prática política –, na sobra dos problemas diários, desfaz-se e, em seu lugar, (re)surge a redenção, o salvacionismo; obrigando-se ao papel ou função social previsto na origem das classes sociais: com a equivalência do status atribuído.

Sob uma análise funcionalista, significa que os atores societais reduzem o status assumido (o que se almeja para si) ao status que fora atribuído na sociedade capitalista desde a origem do indivíduo. Com a divisão das classes produtivas, burguesia e proletariado, é clara a mensagem de que pobre nasceu para ser pobre; rico, para ser rico.

Na análise crítica, implica em ver que essas mesmas classes (fundamentais) estão em luta política acesa, mas em polos contrários, antagônicos, refratários. As classes fundamentais sempre estão em processo luta de classes, porque seus interesses são excludentes: “vita mea, mors tua”.

Em outros termos, diante desse fato estrutural do capitalismo, anterior aos tempos de Jonh Locke, o liberal clássico, as sociedades têm se regido basicamente de duas formas: democracia ou fascismo.

No país atual, caminhamos do fim do Estado de Direito para o fascismo – e neste não há o Político. A próxima lição da história nos dirá que, sem a prática política, não há o humano. Excluir classes, grupos, pessoas da política implica em condená-los à menoridade moral, intelectual e política.

Por isso, ao se confundir propositalmente a política praticada diante do poder, em total descrédito, com o Político – e sem exceção para se definir quem é parte ativa –, todos são considerados falhos, impuros, corruptos, e não-merecedores de se tornarem “seres políticos”: zoonpolitikón.

Desse modo todos acabaremos tutelados, regidos por um ser superior – um homem de estafe – que acumula o controle do Estado: o Poder Político. Do alto de sua galhardia poderá dizer – como editos de poder absoluto – o que é melhor para todos: atribuindo e conferindo o status previsto no atual estágio da sociedade nacional, para cada um dos seres sociais.

Na menoridade moral, intectual, política, o pretenso ser político-social deverá obedecer ao pai: ele sabe o que é melhor para todos. Filhos menores, crianças e presos (políticos) têm algo em comum: os primeiros não têm maturidade para fazer escolhas próprias; o segundo grupo recebeu direitos, mas perdeu a nomenclatura do Político ao se insurgir contra o status quo.

No entanto, os grupos sociais têm tratamento díspare: menores e crianças recebem direitos especiais; presos políticos são apartados do Político e do Estado de Direito. Alguns recebem a pena do exílio político, outros vão parar em Guantánamo.

Este é um dos lados do misticismo do poder que se constrói com o fim do Político. No lugar da política, em que as classes sociais revelam sua concepção de poder e lutam para anular as condições impostas pelas classes sociais dominantes, também surge a identificação total entre status e papel social.

Vale frisar que a dinâmica social do capitalismo é regida pela luta de classes; quer seja ao tempo do liberalismo inglês, quer seja na era da assim denominada pós-modernidade.

Porém, com suas funções bem definidades ad eternum, a classe trabalhadora tem o papel de reproduzir socialmente a si e ao capital. Sua função ou papel social, portanto, não inclui a organização política; daí que o status que se projeta é o da subalternidade.

No outro polo da cadeia alimentar do poder de comando do capital vigora a mesma regra, mas com efeitos contrários: os detentores ou gestores do capital têm elevado status social (projeção de poder) como forma de representação do poder que aglutinam; exatamente, porque gerem o eixo do sistema, são informadores do capital.

A esteira de rolagem, a exemplo da antiga linha de produção do capital e da política, é simples: trabalho subalterno (manual) versus gestão do poder e intelectualização no alto comando da cadeia produtiva.

Desse modo, os gestores do capital colocam-se como os únicos capacitados intelectualmente para manifestar inclinações políticas e legitimados a orquestrar o Estado e definir as principais políticas públicas.

Em resumo, com a identificação entre a política e o Político, e entre status e papel/função social, os únicos despersonalizados são os frequentadores das classes trabalhadoras e/ou subalternas. Sob o capitalismo, o Político sempre foi refém do capital, dos grupos hegemônicos de poder e, agora, nesse país, inclina-se ao fascismo.

Vinício Carrilho Martinez

Professor Adjunto IV da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar/CECH

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