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Gente de Opinião

Vinício Carrilho

Princípio da não-retroatividade moral



O repertório de retroação moral sob os tempos de golpe parecem infinitos, mas listemos uns poucos: cristofobia, apologia aos crimes raciais e de ódio, alimento midiático febril à cultura da torpeza, seletividade policial e judicial, atentados aos direitos fundamentais individuais e sociais, sonegação acachapante da Constituição Federal de 1988.

Como há pessoas que se dedicam a estudar em profundidade o impacto do golpe de 1964 nas populações indígenas, sem delongas, basta dizer que os militares jogavam roupas infestadas de vírus ou de bactérias letais para que morressem e, assim, colonizassem seus territórios com posseiros e latifundiários.

Portanto, um militar que defende o Estado de Exceção – em 2016 – não pode ocupar a direção da FUNAI (Fundação Nacional do Índio)[1]. Pelo simples fato de que esses métodos e outros poderiam ser utilizados a qualquer hora e, novamente, com o escudo de autoridade fornecido pelo Poder Público adormecido pelos meios de exceção.

Este é um dos muitos exemplos de retroação moral que vivemos sob a Ditadura Inconstitucional. De todo modo, é preciso recuperar outro princípio que – derivado da moralidade civilizatória – aplica-se ao bem estar democrático do povo: Princípio da Vedação ao Retrocesso Social.

Neste caso, basta-nos recordar dos direitos trabalhistas subtraídos em proveito do capital. Ou seja, se a greve é um direito constitucional – ou era, antes do golpe –, e se um ato grevista não tiver sido julgado ilegal, por juiz competente, os trabalhadores não podem ter os salários retidos em “estado de greve”[2].

            Por sua vez, os princípios citados devem ser apostos a outros: prevenção e precaução. Tomemos de empréstimo um quadro explicativo:

Princípio da prevenção

Princípio da precaução

Certeza científica sobre o dano ambiental

Incerteza científica sobre o dano ambiental

A obra será realizada e serão tomadas medidas que evitem ou reduzam os danos previstos

A obra não será realizada (in dúbio pro meio ambiente ou in dúbio contra projectum)[3]

Vejamos agora o que reza a PEC 65/2012: “a partir da simples apresentação de um Estudo de Impacto Ambiental (EIA) pelo empreendedor, nenhuma obra poderá mais ser suspensa ou cancelada”[4].

Pensemos, por analogia, que mediante um “laudo de idoneidade” ou atestado de boas intenções, conferido por qualquer advogado, ninguém mais poderia ser revistado ou preso.

Contudo, no lapso civilizatório de nossa atual Ditadura Inconstitucional, ainda há a permissão para pulverização em aéreas urbanas. Não é preciso nem dizer como serão afetados humanos e animais domésticos[5].

Na conjuntura, não apenas o direito e seus povos são feridos de morte, também o bom senso, a justiça mínima, a regulação e a regularidade moral. Na Ditadura Inconstitucional, como não poderia deixar de ser, o retrocesso é gutural e expansivo.

Nosso modelo ilegal e ilegítimo coincide com o que o líder do Partido Comunista Italiano, nos anos 1930, Antonio Gramsci, denominava de cesarismo regressivo.

Quanto mais de regresso à barbárie teremos de aturar para ver o óbvio?

Vinício Carrilho Martinez (Dr.)

Professor Ajunto IV da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar/CECH

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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