Quinta-feira, 13 de março de 2014 - 12h16
Deveríamos realizar uma pesquisa realmente científica que apurasse a incidência do pensamento fascista entre os advogados, membros da Magistratura e do Ministério Público. Talvez valha a analogia com os defensores da pena de antecipação da morte. Em todo caso, é surpreendente a “evolução” dos argumentos entre os bacharéis em direito que são adeptos dos regimes de exceção. Analogamente, entretanto, o pior está por vir, pois se a exceção ganha vulto entre aqueles que deveriam defender o direito (e suas correções) e a justiça, por força da lógica jurídica, imagine-se o que este sentimento significa na vida comum do homem médio.
A dificuldade de a democracia dar respostas condizentes e na velocidade que o povo requer, a insuficiência jurídica de um direito em boa parte anacrônico, a limitação material de concretização da Justiça pelos Tribunais, a atuação capenga de juízes afetos ao pragmatismo e não à obtenção da justiça, a má formação de profissionais do direito forjados aos quilos, sem cultura geral e sem amadurecimento social, enfim, tudo isso, e outras mazelas intelectuais, provocam uma sensação de injustiça e de impotência crescentes.
O homem médio pratica linchamentos públicos, com apoio e estímulo da grande mídia e os fiscais da lei nada fazem. É preciso lembrar que os veículos de comunicação, mesmo sob controle da iniciativa privada, são concessões públicas. Logo, se esses veículos agem ao arrepio da lei, incitando o cometimento de crimes, seus apresentadores e supervisores deveriam ser chamados judicialmente, bem como a empresa deveria ser averiguada e intimada a depor sob a conduta criminosa.
Nada justifica, entretanto, o controle da mídia mediante legislação infraconstitucional que vise limitar o direito à liberdade da informação, que, sabemos, não é princípio absoluto, nas sábias lições de Robert Alexi.
Mas, pouco se faz, pois dentre todos os males, o custo da democracia – ao invés de gerar um esforço global pela solução dos conflitos – anima apenas o sentimento de revolta e de incompetência. É passada a hora de melhor avaliar se esses profissionais também são formados com seriedade e isto implica em rever a política de orientação dos cursos de direito fazendo a seguinte questão: para onde estamos caminhando?
Com a crescente inoperância do Judiciário e o desprezo pela Justiça Social – afinal quem decide mais ganha uma menção do Tribunal ou do Conselho Nacional de Justiça pelas metas cumpridas (interpretação fajuta e apressada das lições do italiano Mauro Cappelletii) – diminui não só a sensação de justiça, como a própria expectativa do direito. O direito pode ser líquido e certo, mas é incerta a análise realizada por operadores do direito insensíveis diante da realidade social. Também por isso a antítese diante da inoperância do Judiciário é uma tese para a ditadura.
A antítese, no direito, deveria ser representada pelo direito de ampla defesa e assim corresponder à plenitude do contraditório. Entretanto, se a exceção elimina o contraditório, “o direito de dizer-não”, então, a antítese se curva à força, como se a força bruta fosse a única tese possível. Neste sentido, o pior está por vir, porque o homem médio é bombardeado com essas mensagens, mas logo estará na Intifada e em nova marcha pela Família e Propriedade – depois de praticar uma meia dúzia de linchamentos públicos. O pensamento de exceção na Intifada tupiniquim combinará o tribunal do crime com a pena de apedrejamento.
Esse espírito de Macunaíma nacionalista intumescido nas artérias jurídicas só pode dar errado, seguindo a seguinte fórmula: as saídas mais rápidas, menos custosas, são as adotadas; os hectoquilos de bacharéis malformados todos os anos engrossam as fileiras do desemprego com canudo na mão; o Estado passou do limite de absorção dessas pessoas; o descontentamento é absoluto; as perspectivas são pequenas. Se nem o bacharel em direito consegue salvar seu desejo de justiça (pessoal), o que se dirá dos demais – muitos na condição de seus clientes?
O resultado não poderia ser diferente, como já ocorrera em outros países: culpar o(a) Outro(a), aquele que vem de fora, o desconhecido; tornar inimigo quem não compartilha dos mesmos anseios, ou quem está marginalizado. Estamos falando do Brasil? Sim, mas a fórmula é a mesma para ditaduras de esquerda e direita. Basta lembrarmo-nos de Stalin, da ascensão reacionária de Franco e de Hitler na Europa no início do século XX, do Imperialismo estadunidense, da pseudodemocracia plebiscitária esquerdista na Venezuela de hoje, entre tantos outros.
A OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), por sua vez, deveria avaliar a conduta de seus advogados, sobremaneira aqueles que se manifestam publicamente (mais ainda na Internet) em favor da barbárie social, dos linchamentos, da volta dos regimes de exceção e que, desse modo, violem toda a Constituição Federal. Não comete crime contra a sociedade, defenestrando a ordem jurídica democrática, apenas os golpistas de fato, mas incidem na mesma espécie de crime os ideólogos da ação.
Alguns serão os mandantes; contudo, a maioria será apenas massa de manobra, alucinados e recalcados com a perda do status de golpistas que um dia ostentaram. Esses baixios do golpe nunca tiveram poder de fato, apenas um status de mandatários.
Podemos citar, apenas a título de exemplo, o Código de Ética e Disciplina da OAB, ao classificar como dever do advogado a abstenção de vinculação de seu nome a empreendimentos de cunho manifestamente duvidoso, emprestar concurso aos que atentem contra a ética, a moral, a honestidade e a dignidade da pessoa humana, ou mesmo na afirmação de sua obrigação de pugnar pela solução dos problemas da cidadania e pela efetivação dos direitos individuais, coletivos e difusos, no âmbito da comunidade.
A lição do art. 3º do referido diploma axiológico é não menos importante: “O advogado deve ter consciência de que o Direito é um meio de mitigar as desigualdades para o encontro de soluções justas e que a lei é um instrumento para garantir a igualdade de todos”. De todos! - não apenas do que estão no mesmo patamar social, profissional, étnico, religioso, judicioso.
Podemos citar diversos outros deveres e privações ético-funcionais na Lei Orgânica da Magistratura e do Ministério Público que confluem no mesmo sentido das normas citadas e aplicadas à OAB, e todas confluem na máxima de que tais profissionais são indispensáveis à administração da justiça pela sua posição dentro do Estado Brasileiro, devendo agir com zelo e responsabilidades inerentes aos postos ocupados.
Nossa desinteligência jurídica nos impede de perceber que, na exceção, com o fim do contraditório (antítese), a tese se converte – por meio da força – em síntese, pois não se admite que o resultado possa ser diferente da proposição inerente ao poder de exceção. O pensamento único é próprio à exceção e é fácil de perceber que, sem a antítese, a tese se converte em síntese: o fluxo do poder não reconhece obstáculos ou alternativas e por isso a democracia incomoda. Os portadores de pensamento único (analógico) têm enorme dificuldade para compreender as sutilezas da democracia – de forças, dimensões e fluxo digital. Por isso o pensamento fascista sempre soa como um convite aos incautos e incultos.
A grande gama das relações havidas - entre os indivíduos componentes do todo social - globalmente, ensejam uma nova maneira de ver o direito, não da forma anacrônica como alhures mencionado, com pensamentos cartesianos dos operadores do direito - que se está verificando atualmente -, estes sim, importantes para a mudança do todo social, contudo a formação humanística destes profissionais deve ser aprimorada, a subsunção pura e simples não mais dá a resposta que a sociedade deseja, a sensação de impunidade nunca esteve tão presente, e tal sensação acaba culminando nas situações escabrosas que verificamos por parte da população, que acaba acreditando que pode fazer justiça com as próprias mãos, que relega a vida a um segundo plano, que faz com que o sentimento do valor incalculável de uma vida esvaia-se entre os dedos.
Cada vida humana é insubstituível, e assim sendo é deveras importante que cada caso seja analisado, como único, cada peculiaridade seja verificada, sob pena de se cometer injustiças.
Vinício Carrilho Martinez
Professor Adjunto III da Universidade Federal de Rondônia – UFRO, junto ao Departamento de Ciências Jurídicas/DCJ. Pós-Doutor em Educação e em Ciências Sociais e Doutor pela Universidade de São Paulo. Bacharel em Ciências e em Direito. Jornalista.
Marcus Vinícius Gazzola
Advogado. Pós-graduado em Direito do Estado com ênfase em Direito Constitucional pela Universidade Estadual de Londrina. Mestre em Direito Público pela UNIVEM de Marília. Conselheiro Assessor da 22ª Turma do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB/SP. Professor de Direito e Processo do Trabalho.
Vinicius Menegol
Possui graduação em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade do Oeste de Santa Catarina - UNOESC. Especialização em direito Previdenciário pelo Centro de Excelência em Direito - UNOESC. Advogado atuante no Estado do Mato Grosso.
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Vinício Carrilho Martinez (Dr.) Cientista Social e professor da UFSCar Márlon Pessanha Doutor em Ensino de CiênciasDocente da Universidade Federal de