Domingo, 2 de abril de 2017 - 13h42
Inicialmente, pode-se aventar – com honestidade intelectual e moral – que o Parlamentarismo é superior ao Presidencialismo como forma-Estado de se gerir institucionalmente a República. E será ainda mais superior em qualquer tipo de análise frente ao atual modelo de Presidencialismo de Coalizão. Em nosso caso, como se sabe perfeitamente, temos um sistema de colisão frontal e perda total dos interesses públicos.
Ao contrário do bom senso, a última proposta de reforma política, ao criar uma lista pré-ordenada de candidatos indicados pelos partidos políticos para receberem o voto indireto dos eleitores, empossando-se primeiramente os caciques, na hierarquia descendente, é uma falácia de intenções antirrepublicanas.
As tratativas de composição político-partidárias podem ser o ideal em sistemas de governo representativos e parlamentaristas (puros ou mistos). Também seria bem encaixado em regimes presidencialistas honestos e muito menos arcaicos do que o nacional: um tipo de presidencialismo misto.
Pela reforma da lista pré-ordenada, não é difícil perceber que a votação para os cargos do Legislativo será indireta – mais ou menos como no Colégio Eleitoral nos EUA, só que lá é para escolher o presidente. Os defensores da tal lista alegam que o fundo de campanha – com financiamento público (70%) e privado (30%) – será partidário, efetivamente, pois os partidos farão campanha para suas legendas (ou chapas prontas) e que não servirá, como hoje, para candidatos, individualmente, isoladamente.
No entanto, este ideal ocorreria apenas em dimensões inexistentes no país:
1º) Se o Brasil não fosse presidencialista e se o eleitor pudesse escolher dentre quatro ou cinco partidos políticos com programas de governo distintos entre si e já consolidados.
2º) Se o parlamentar eleito seguisse o mandato como um mandamento, na forma de um “mandato delegado” que o obrigasse a seguir o plano político-ideológico previamente determinado.
3º) Se os objetivos do projeto em pauta no Congresso Nacional fossem idôneos, como, por exemplo, banir o caciquismo que sustenta o Presidencialismo de Colisão.
4º) Se tivesse a chancela de quem quer revigorar os quadros políticos – sem personalismo –, a fim de se inverter a lógica dos atuais Partidos de Massa (de manobra) para incrementar as metas dos Partidos de Quadro.
5º) Se a moral política resiliente, de fato, almejasse um voto mais programático e menos pragmático, como atualmente. Constituindo-se como voto partidário na essência de quem “toma partido numa causa”. Em suma, ter-se-ia um voto verdadeiramente ideológico.
Mas, como bem sabe o homem médio em sua vida comum, o objetivo nosso de cada dia na política brasileira é, só, alimentar o “toma lá, dá cá”. No realismo dos fatos políticos, na guerra entre barões e peões, na tal lista pré-ordenada, a hierarquia política entre o alto e o baixo clero terá no topo os velhos e novos caciques. Os mesmos de hoje em dia, de todos os tipos, cores, idades e naipes. Caciques brancos, ricos e, majoritariamente, homens. Há algumas poucas mulheres nas piores bancadas congressuais.
Logo, os maiores beneficiados, os primeiros a se elegerem serão, exatamente, os que deveriam ser banidos da vida pública. Basta recordar que os mais perigosos são, hoje e sempre, os mais desacreditados e que, nas próximas eleições, teriam enormes dificuldades para se elegerem e, assim, livrarem-se dos processos criminais.
Na eleição direta convencional como a conhecemos hoje são os velhos caciques que ocupam lugar de destaque em outra lista; são campeões em citações de outros criminosos: os mais famosos depoentes em infinitas delações premiadas. Com a lista ordenada por seus interesses criminais diretos, uma vez eleitos, assegurariam a preferência do foro privilegiado. Seriam julgados (se fossem) por tribunais especiais. Porém, recorde-se que alguns desses processos estão na gaveta do Judiciário há 10 anos.
Para muitos, causa espanto ver esquerda e direita apoiando esse pacote político embrulhado em antiética. Contudo, para uma parte da esquerda sabatinada nas eleições de 2016 (pelo voto direto), vê-se aí um canudinho de oxigênio; a direita atende pela lógica simples: prefere-se o foro privilegiado de Brasília a conviver com Tiradentes na República de Curitiba.
Alguns pensam em escapismo político; mas, não é. Simplesmente é César fazendo política com todos os punhais que detém. Por isso, mais uma vez a cúpula dos três poderes – em adesão ao projeto antirrepublicano – está alinhada nesta pauta antiética.
Vinício Carrilho Martinez
Professor Adjunto IV da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar/CECH
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Vinício Carrilho Martinez (Dr.) Cientista Social e professor da UFSCar Márlon Pessanha Doutor em Ensino de CiênciasDocente da Universidade Federal de