Segunda-feira, 18 de novembro de 2013 - 16h21
Qual a diferença entre falar mal e dizer a verdade? Se eu dissesse que, apesar do baixíssimo IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) de Porto Velho, trata-se de uma cidade de gente boa e honesta, estaria dizendo a verdade. Se dissesse que as cidades do interior tiveram governantes melhores do que os da capital, estaria dizendo a verdade. Se dissesse que os governadores do interior investem muito mais lá, do que aqui, só diria o óbvio. Se fizesse como Rafinha Bastos, dizendo que aqui no Estado só tem mulher feia, seria um idiota cheio de preconceitos. Mas, se dissesse que aqui é o melhor lugar do Brasil para se viver, porque se ganha muito dinheiro, também diria uma tolice sem tamanho. É isso, a mentira vem recoberta de preconceitos, escondida pelo medo (hipocrisia) de dizer a verdade.
Outro preconceito local diz que as “pessoas de fora” só querem ganhar dinheiro e ir embora. Este preconceito diz que “os de fora” só querem dilapidar o Estado. É meia verdade, pois há pessoas que sentem isso mesmo em relação ao Estado. Aliás, são muitas vozes assim; um que conheço vive por aqui faz 25 anos, mas é um tubarão, pronto para rasgar qualquer instituição. De outro lado, há muitos – como eu – que vieram para trabalhar e não vão enriquecer às custas do povo; simplesmente porque trabalham e não tem tempo de ganhar dinheiro.
Em outro exemplo: outro dia, na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-local) presenciei o máximo do ufanismo. Cantou-se o hino do Estado a plenos pulmões, com coro, gestos e brados, mas na hora do hino nacional abaixaram os olhos e se lacraram os lábios. Quando vejo cenas como essas, lembro-me das Farroupilhas e dos “destemidos pioneiros”. Será uma coincidência, ilusão de minha parte ou é mesmo ufanismo? É a verdade inconfessável.
As pessoas que jogam geladeiras, sofás nos córregos, igarapés e que entopem os bueiros da cidade, elas nasceram onde? É preconceito dizer que o lixo está por toda parte? Não posso reclamar da lama que invadiu as ruas? Devo aceitar o perfume do esgoto a céu aberto? O hospital João Paulo, e seus leitos pelo chão, é um exemplo a ser seguido? Os que depredam e roubam as escolas públicas, são gente de fora? Os vereadores acusados e seus acusadores (absolvidos ou não de associação ao tráfico de drogas) vieram de fora? Os deputados – também acusados de tráfico de drogas e de influências (presos ou não) –, igualmente, nasceram e vivem onde?
Um dia peguei um taxi para comprar comida. O motorista me disse que a filha do dono do restaurante – uma criança especial – havia morrido há poucos dias por diagnóstico suspeito, em hospital particular e com os melhores planos de saúde. Quer dizer, a menina estava ótima, sentiu falta de ar, foi ao hospital e dias depois morreu: tendo recebido alta no interstício. Pergunto: os responsáveis por sua morte prematura foram formados onde, vivem aqui há quanto tempo, os professores dos médicos têm domicílio em que cidade?
Os juízes que soltam bandidos (de gravata ou de chinelo) e depois mandam prender os mesmos transeuntes do sistema penal, moram onde, pretendem passar seus dias em que local, educam seus filhos e netos em que cidade – será que vão fazer concurso fora do Estado? Os policiais que fazem segurança particular, usando a patrulha oficial, nasceram e vivem onde? Seus pais são daqui ou também vieram dilapidar o Estado? Todos os políticos corrompidos (presos ou não), primeiro nasceram em cidades espalhadas pelo país, em seguida formaram um consórcio do Mal, e só depois se uniram por essas bandas para procriar como em Gotham City?
Quando o Ministério Público não vê o trabalho escravo (e o que se dá em condições análogas à escravidão), quando fecha os olhos para os índios mortos à bala e não se apieda das crianças prostituídas, será que se pratica um tipo de choque cultural (em nome do diabo de Fausto) ou é a repetição de crimes sistêmicos, sistemáticos (locais e importados)? Não há crime maior do que o de Fausto (associou-se ao Mal, em pacto de sangue) para se tornar o maior dos ufanistas. Já estudei um pouco esse Ufano-Fausto para saber que isso corrói qualquer cérebro.
No meio dessa fumaça toda, está o povo, sempre o povo – manipulado e enganado pelos chavões da mídia local, humilhado pelas bravatas da mídia nacional –, e sempre dilapidado em seus direitos e interesses. Todo preconceito é fascista e o ufanismo é um dos piores. Quem é do Sul/Sudeste, como eu, sabe bem do que estou falando. Não há perversidade pior do que a das elites, sejam locais, sejam estrangeiras, com ou sem sotaques. Para falar do preconceito do outro, é preciso se livrar do seu. Apesar de ter as pernas curtas, detesto mentiras.
Nasci em Marília/SP – uma das cem melhores cidades do Brasil para se viver – mas, ao contrário da hipocrisia de lá, nunca acreditei em conto da carochinha. Os mais bobos e oportunistas dizem que a cidade não tem favelas. Isso não é preconceito, é crime social – porque as favelas derramam-se pelas encostas pobres da cidade. Dentre as mais de 30 favelas, não se vê a Vila Barros, a não ser que pague o pedágio do PCC (crime organizado) e assim conheça o barranco por onde escorre toda esperança. A cidade, Símbolo de Amor e Liberdade, nunca amou seus pobres e nem deu liberdade aos adversários do colonialismo. Nasci lá, moro aqui. Por isso me dou o direito de falar do que conheço e presencio. Não gosto de sol, mas menos ainda da peneira furada que não tapa nada. Cada um tem o engodo que merece e autoengano que melhor satisfaz.
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Vinício Carrilho Martinez (Dr.) Cientista Social e professor da UFSCar Márlon Pessanha Doutor em Ensino de CiênciasDocente da Universidade Federal de