Terça-feira, 1 de outubro de 2024 - 07h53
O
metafísico foi incumbido de defender uma tese vermífuga no Supremo Tribunal
Federal (STF) e foi pro bono, quer dizer, de graça.
Sua
causa, porque ele não sabe o que é uma tese jurídica, requeria um brilhante
direito de negar a Ciência, a realidade, o conhecimento que crianças educadas
aprendem no ensino fundamental – o que o autor da ação chama de 5 série.
Pois
bem, com a ação em mente (há que se perguntar onde), o metafísico queria luzes
e ribaltas para suas redes antissociais. Ledo engano, tadinho, porque já na
chegada o detetor de metal o impediu de adentrar no recinto com seu ilustrado
chapéu de alumínio.
Depois
do 8 de janeiro de 2023, nenhum metal é aceito no STF, ainda que o boçalismo
ainda seja levado até à Corte Suprema do país. Mas, o metafísico não sabia
disso, porque havia regressado de Nárnia naqueles dias.
Para
ajudar na iluminação da defesa do metafísico, subitamente, a gravação daquela
sessão foi interrompida. Seu voto quixotesco (no Brasil estaria montado num
jegue – não há alazões suficientes), intitulado “O direito de livre expressão
da mentira grotesca”, pensava o metafísico, deveria fundamentar a seguinte
“tese”: “Há uma bizarrice jurídica que deve ser externalizada, sob pena de
sermos calados”. (sic, sic, sic).
Quando
se preparava para soltar o verbo, seu tempo de gloriosos cinco minutos foi
acionado, e os ministros (todos) saíram, abandonaram o metafísico. O pobre,
que, aliás, pagou todas as custas elevadíssimas em Brasília, passagens aéreas e
tudo mais, correu contra o tempo. Mesmo sozinho, forçou sua crença e pensou bem
alto (o gari da rua ouviu e nos relatou): “hoje vou ‘correr atrás do prejuízo’,
me idolatrar como o maior metafísico da história jurídica”. Realmente, o
metafísico logo descobriria a força atrativa da lógica pois, quem corre atrás
do prejuízo logo, logo, o encontra.
Ao
final dos mais longos cinco minutos da história da humanidade, os ministros
voltaram e (por sorteio) um deles leu um breve voto “em definitivo” – sem
apelação, mesmo para aqueles que apelam. E dizia mais ou menos assim:
“Vermes
não causam diabetes”.
“Diabetes
não se cura com vermífugo”.
“Todo mundo sabe disso,
até crianças bem educadas. Essas crianças, vacinadas, também sabem (já sabiam
em 2020) que os mesmos vermífugos não inibem ou combatem a COVID-19. Porém,
alguns adultos – movidos pela negação da lógica mais simples ou por interesses
ocultos (dinheiro ou falta de inteligência) – ainda pensam que sim.
Tivemos
que esperar o Supremo Tribunal Federal (STF) intervir para remover de
circulação uma decisão judicial sem noção da realidade, sem amparo em nenhum
dado infanto-juvenil acerca do Ensino de Ciências.
Com
certeza, decisões como essas não deveriam chegar ao crivo da Corte, pois que
lhes faltam condições essenciais de racionalidade. Sem contar a gama infinita
de violações de princípios do próprio direito – a começar pelo fato do
Judiciário não poder decidir contra a Ciência e a Ética, em favor de algum
negacionismo muito pior do que O Alienista e em desfavor da saúde pública. Em
outras palavras, o STF teve que remover a aplicabilidade de uma Fake News
criada pelo próprio Judiciário – e que deveria nos defender das mentiras
públicas.
Não
é essa a função do Supremo, tanto quanto a obviedade deveria ser a marca das
decisões judiciais. Como a segunda pedida é bastante inusitada, difícil de ser
alcançada, resta ao STF agir como protetor da realidade mais prosaica e da
sanidade do povo, desatando-se os engodos da ideologia vermífuga de alguma
extrema direita.
Porém,
além disso, nesta decisão, o Supremo ainda está a corrigir distúrbios jurídicos,
uma vez que, por óbvio, não existe nenhuma suposta liberdade de propagandear
alucinações – como curar diabetes com vermífugo – e menos ainda teria valia se
confrontada (essa “liberdade de expressar a não-ciência”) com a obrigação do
Poder Público em defender a saúde pública, a incolumidade física e mental do
povo brasileiro.
Se
tudo corresse como se espera no ensino fundamental, com apreço ao Ensino de
Ciências, também é suficientemente claro, nosso voto não estaria sendo apresentado.
E nenhum texto seria publicado em reprovação à decisão da magistratura, já
constante do rol das pérolas e gargalhadas do Judiciário. Todavia, o que seria
de nós, privados de sabedorias assim – sem que Machado de Assis tivesse escrito
seu próprio Alienista?
Como
se diz, a arte copia a realidade – ou será o contrário, se pensarmos que o
Judiciário de 1ª instância, neste caso, superou com folgas a obra do nosso
maior gênio literário?
Mas,
querem saber quando o STF será blindado de casos e decisões desse tipo? Nunca.
A certeza negativa vem do fato de que, o mesmo STF ainda criminaliza a mãe que
venha furtar um chocolate, uma caixinha de leite para alimentar seu bebê que
está literalmente morrendo de fome.
Não
é impossível, sequer é difícil, analisar a lógica que compõe esse poder. É
fácil notar que a redoma retira a noção de realidade, salvo exceções. E, se há
exceções, nesta hipótese, parece que apenas confirmam as regras jurídicas
alienistas.
E
antes que se diga, já me adianto.
Mudanças
no “ensino jurídico”, por si, não resolvem o problema de descolamento da retina
jurídica – a exemplo dessa tese vermífuga trazida pelo metafísico e apoiada por
decisão judicial de 1ª instância. Afinal, não é depois de adulto que se irá
ensinar a obrigação de não se furtar à realidade, para outra dimensão –
exatamente porque não há outra dimensão ou universo paralelo.
Enquanto
disciplinas como português, matemática, ciências, sociologia, filosofia, Ética,
são abduzidas, e crescem as margens negacionistas (fascistas) de escolas
cívico-militares, do ensino religioso (abusando, assediando o Estado Laico) e
da educação financeira (para crianças e jovens que tem os pais desempregados),
o desiderato seguirá sendo nossa bússola moral”.
Por
fim, concluiu o ministro eloquente:
“O único verme que pode nos abater, na seara da inteligência jurídica, é o Taenia solium, transmitido pela ingestão de carne de suíno contaminada. Esse, sim, se aloja e procria no cérebro – corroendo-o em seu juízo mediano. O resultado, como se sabe, é o boçalismo”.
De
minha parte, nada tenho a acrescentar.
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