Quarta-feira, 2 de agosto de 2023 - 12h44
2083.
Nossa
data de entrada numa nova era para a Humanidade: meio humanos, meio máquinas
orgânicas. Uma data em que não mais haverá nenhuma forma de deficiência física,
previamente resolvidas pela manipulação genética ou mediante bots intracelulares, manipuladores de
células-tronco que corrigem todas as informações humanas deficitárias.
Os
chips implantados no cérebro,
componentes de uma intranet neural
interligada à Inteligência Artificial unificada (IA Única) asseguraram que não
haja rejeição para que os humanos concebidos, sobreviventes, aceitem expandir
sua vida para além dos 200 anos terráqueos. Muito remédio, óbvio, será ministrado
automaticamente para cada humano concebido – então secular. A IA Única retirou
a “cura pela longevidade” de uma planta que cresce em algum deserto da Namíbia
– o “Polvo do deserto”, que pode viver milhares de anos.
O
controle da finitude será o desafio constante da IA Única e dominante: fazer
com que cada humano aceite ser como é, e queira continuar sendo feliz com sua
imperfeição corrigida. Portanto, muito remédio é ministrado desde a concepção,
para que o conhecido (pela sociologia) suicídio egoísta não seja recorrente:
ironicamente, sem razão aparente – a não ser viver numa sociedade muito
organizada –, em que os indivíduos não tiram suas vidas. O Japão e a Suécia
atuais já avisam a IA Única desse fator demasiado humano – no futuro planejado
pela IA Única, os “vales da morte” não serão nem meras lembranças de um passado
arruinado pelos humanos de 2023.
Como
instituição pública, a IA Única irá efetivar todos os objetivos estatais que
vemos na Constituição Federal de 1988: não haverá desigualdade, nem quebra da
isonomia ou da equidade, muito menos exclusão. Todas as pautas de inclusão
social, conservação e proteção ao meio ambiente serão efetivas. Não haverá
racismo, misoginia, capacitismo (os chips
neurais equilibraram todos) ou xenofobia: a Utopia do “cidadão do mundo”, lá
dos anos 1990, será o lazer assegurado a quase todos os humanos concebidos e
sobreviventes. Poder-se-á passear tanto na Disney quanto no Everest – ou na
Amazônia incólume.
A
implantação dos chips neurais será
obrigatória, exatamente como fazemos hoje com as vacinas. Mesmo que o Estado
seja complacente com alguns, a pressão social será determinante: o bicho
estranho será o humano, demasiado humano. Não será possível recusar-se ao meio
fio acolhedor da sociedade perfeita.
Ninguém
perderá seu emprego, porque não haverá empregos formais. As máquinas farão
tudo, do trabalho de exploração em minas perigosas ao trabalho doméstico: as
mulheres jamais irão saber o que é “dupla jornada”. Aliás, não haverá jornada
de trabalho para ninguém: abolição total do trabalho. Mesmo pensar será quase
reflexo dos chips neurais. Por essa intranet interligada à IA Única passarão
todas as subjetividades, das esperanças às querências. Alguém irá querer um
mundo pior para si? Jamais.
O
aprendizado, em escolas informatizadas e automatizadas, será totalmente
individualizado – sem esquecer o necessário efeito da homogeneização. A
diferença é que ninguém irá querer ser diferente; afinal, o mundo ideal está ao
alcance de todos e de todas. A IA Única será, definitivamente, mais inteligente
do que a Humanidade toda, será libertária em seus conteúdos educacionais e
científicos. A ética social, inclusiva, igualitária, emancipadora, já virá com
a programação inaugurada pela Tesla de 2023. O verdadeiro Tesla, o cientista, não
poderia vislumbrar algo melhor e mais generoso para a Humanidade sobrevivente.
Talvez
o maior desafio entre os jovens, como já ocorre, seja bater os recordes de
felicidade. Se a sociedade é toda planejada, se as cidades são absolutamente
inteligentes, se não há mais nenhum trabalho rural (mecanizado por gado
eletrônico), como não ser feliz?
Sem
entropia com saúde (geneticamente assegurada), educação (garantida pelos chips) e cultura ao alcance da
imaginação buscada pela intranet
neural, como não ser feliz? Tudo será convergente; como real Estado de
bem-estar social, tudo será amalgamado numa Utopia existente. Então, como não
ser feliz?
A
propaganda que, diferente de 2023, instigava um desejo ou necessidade material,
passou a ser um desejo ou manutenção da própria felicidade, especialmente para
aqueles que ainda estivessem com o cérebro, modificado via chip, em formação (completa em torno dos 25 anos). Apesar desta
mudança na aplicação da propaganda, a essência seguiria a mesma de sempre:
consumir ainda mais e consumir 24 horas por dia. Entretanto, apenas coisas
“boas”.
Nesse
chegado tempo, também não haverá mais Fake
News, como no período de 2018 a 2022. Tudo será verdadeiro no consumo de
notícias da Vida Feliz. Não haverá notícias de barbáries, como: massacres em
escolas, promoção de chacinas por discordâncias políticas e outras mazelas
humanas. Absolutamente todas as notícias serão positivas na Vida Feliz.
Alguém
já disse que será uma Matrix do bem, pois não mais se conhecerá o mal
intrínseco à Humanidade como conhecemos hoje. Se ninguém e nada te faz mal
(aparente), como não ser feliz? Até os robôs serão alegres, afeiçoados ao
humano mais feliz do mundo. Imaginemos passar nossas vidas contemplando o
idealismo, a filosofia mais contemplativa que se possa imaginar. Dá para ser
infeliz?
Todos
serão livres para fazer qualquer coisa, ou não fazer nada, praticar os esportes
que quiserem, desenvolverem habilidades artísticas ou musicais, sem nenhuma
restrição. A não ser as restrições – inoculadas continuamente pela intranet neural – que ninguém poderá se
atribuir o direito de não fazer o bem.
Não fazer o bem será
impossível, porque a programação genético-social, a matriz da Matrix do bem,
será o conta-gotas que assegurará o cumprimento mais fiel dos 10 Mandamentos. A
religiosidade se confundirá com a subjetividade programada e experimentada
diariamente. De novo se pergunta: sem que o mal possa agir, como não ser feliz?
Viveremos no paraíso terrestre. Será a máxima consagração da inteligência
social programada pela IA Única.
Os
próprios robôs serão tratados como fazemos, da melhor maneira possível, com os
nossos animais domésticos. Se o robô só te proporciona felicidade, por que o
destruir com maus tratos? Nem pensar. Sempre é preciso lembrar que as doces
pílulas da felicidade já foram sabiamente implantadas na genética dos humanos
concebidos. Aliás, não teremos mais nenhum tipo de cientistas, porque nenhum
humano concebido chegará a um milionésimo da capacidade gerida pela IA Única.
Haverá
ricos e milionários na estratificação calculada pelas máquinas de inteligência,
o velho e conhecido colchão de molas ideológico dos atritos sociais; porém, não
haverá fome, nem restrições alimentares. Haverá conservação do meio ambiente e
fartura alimentar para os mais de 20 bilhões de humanos concebidos.
Não
haverá revolta popular, ninguém jamais conhecerá o que é o Direito de sedição,
porque todo mundo será conservador da felicidade. Não haverá infelicidade, nem
poemas sem rima de amor e paz. Será a consagração da Utopia de “paz e amor”. O
V não será de Vingança, mas sim de Vida Feliz. Cidades, vilas e ruas irão se
chamar Vida Feliz. Meninas e meninos receberão o nome de Vida.
Portanto,
os três poderes serão decorativos ou decorados pela felicidade
institucionalizada. Se não haverá injustiça, não haverá a quem julgar. No
Estado Ético não haverá disputas religiosas, não haverá intolerância de nenhuma
forma. Todas as religiões serão convergentes a uma só: A Santa Igreja do Bem
Maior.
Por
mais que se procure, ninguém verá fazendas de produção animal. Aos carnívoros
reticentes em aderir ao veganismo, a carne de porco será servida sem colesterol
e o leite desnatado não permitirá saber se é de soja: ninguém irá querer saber
disso, também. Será que o café é descafeinado ou não? Me importa unicamente
reconhecer que tem o aroma e o sabor que eu desejo. O café será ofertado em
doses programadas para a satisfação individual.
Ninguém
fará uso de álcool ou de qualquer tipo de drogas: ninguém terá o desejo de fugir
da realidade. Ninguém saberá dizer (ou terá sentido) o que são “quedas
hormonais”. A harmonização social virá sempre acompanhada de rígidas
programações genéticas – corrigidas, alinhadas, pelos bots da intranet neural. Definitivamente,
a adrenalina será substituída (metabolicamente) pela endorfina: as pílulas da
felicidade eterna administradas até os 250 anos de idade serão a programação de
uma Vida Feliz.
O rentismo será uma
regra absoluta: se ninguém irá trabalhar, ninguém irá se aposentar. Contudo, isso
não será um problema social. Com educação financeira obrigatória (desde os chips), sem que os jovens trabalhem e
nem tenham esperanças por direitos previdenciários, eles conhecerão a liberdade
plena para serem os seus próprios gestores, empreendedores de si: alavancas da
felicidade financeira. A autonomia individual será reflexo dos dividendos
recebidos mediante a especulação financeira.
Como a produção será
99,99% automatizada, não haverá peso na consciência de classe, uma vez que será
dominante a mais valia onírica – quando os sonhos serão canalizados para a
produção continuada das felizes subjetividades. Os humanos concebidos sequer ouvirão
falar em dificuldades, pois o maior desafio será aumentar os índices de
satisfação.
A
consciência de classe será diluída na mais valia artificial. A IA Única, apesar
de promulgar direitos para seus autômatos – como muitos já requerem em 2023 –,
será exímia negociadora frente à mais valia automatizada. Não haverá luta de
classes, pontos de fuga, porque tudo será convergente ao estado de coisas
desenhado pela IA Única. Algo como um exponencial Estado Rentista, o maior
beneficiário das bolsas de valores, no exemplo que já chega de Portugal.
Não
haverá forças armadas, nem policiais, pois cada indivíduo saberá perfeitamente
seu lugar na sociedade, haverá pouca distinção no exercício da função social, a
simbologia do papel social tenderá à máxima homogeneidade, com total
pacificação social – as diferenças, divergências ou discrepâncias sociais,
serão tidas como idiossincrasias.
As
polícias repressivas, preventivas, investigativas, serão substituídas pela
Polícia Intuitiva – todo mundo terá uma “forte intuição” diante dos outros.
Nesse lugar dos “outros”, todos serão bem parecidos com os “mesmos”.
Por
isso, o controle social será pouco ou quase nada sentido, uma vez que a regra
de convívio ou de existência será de “todos por todos”; as subjetividades
individuais serão programadas geneticamente para serem assimiladas
precocemente. Todavia, se tudo será assim, qual viria a ser a única ressalva
colocada à Humanidade?
A
Utopia futura é a distopia do presente – ou é a Utopia do presente (do Capital)
que se realizará como distopia do futuro. Será mesmo que no platô das
esperanças, sem entropias viáveis, a desesperança será normalizada, acomodada
com o emprego de remédios pacificadores? Se tudo está pronto, iremos fazer o
quê? A charada é essa: a IA Única será tão inteligente ao ponto de nos vender a
ideia de que a pior distopia é a melhor Utopia possível?
Uma
última lembrança, com a IA Única no controle, nenhum livro será proibido –
todos estarão disponíveis nos chips
da rede neural –, precisamente, porque todos os livros proibidos hoje em dia
(como Mein Kampf) serão simplesmente deletados da memória humana. No Reino da
Inteligência Coletiva, não se admitirá nada, absolutamente nada, que faça mal
aos humanos assim concebidos.
O lema da IA Única será (é): “o melhor poder é aquele que não se vê”.
O Motivo: haverá (há) uma distopia disfarçada de
Utopia. Trata-se de uma ironia porque, na prática, a IA Única saberá se
apropriar (cinicamente) das pautas conservacionistas, emancipatórias,
isonômicas, de esquerda para legitimar um poder totalitário de extremo controle
social.
A ciência que não muda só se repete, na mesmice, na cópia, no óbvio e no mercadológico – e parece inadequado, por definição, falar-se em ciência nes
A Educação Constitucional do Prof. Vinício Carrilho Martinez
Introdução Neste texto é realizada uma leitura do livro “Educação constitucional: educação pela Constituição de 1988” de autoria do Prof. Dr. Viníci
Todos os golpes no Brasil são racistas. Sejam grandes ou pequenos, os golpes são racistas. É a nossa história, da nossa formação
Veremos de modo mais extensivo que entre a emancipação e a autonomia se apresentam realidades e conceitos – igualmente impositivos – que suportam a