Quarta-feira, 2 de março de 2016 - 17h43
Recebi hoje cópia da palestra que proferiu nosso irmão Carlos Alberto Camargo Lima no ensejo do quinquagésimo aniversário do 5º. Batalhão de Engenharia de Construção sediado em Porto Velho. O Lima é um pioneiro desse batalhão com o qual até hoje mantêm ativo contato, do qual resultou recentemente o lançamento da obra "5° Batalhão de Engenharia de Construção - 50 anos".
Li a palestra e pensei que melhor seria publica-la por vários motivos. Primeiramente, porque expressa a visão política de um cidadão brasileiro formado no meio militar, e creio que devemos também ouvi-los e registrar, para o futuro, suas opiniões, afinal de contas são também cidadãos e brasileiros. Em segundo lugar porque conta um pouco da história desse batalhão e de sua importância para a região norte.
Embora tardiamente em relação ao evento, fica aqui registrada a palavra do nosso pioneiro, antes tarde do que nunca. Lamentavelmente, para muitos, a história do 5º. BEC apenas é lembrada quando se trata da pecha discutível de ter desmobilizado a EFMM. Discutível porque os militares apenas obedeceram as ordens de um civil, que estava na presidência da República. Não foram eles que decidiram promover o desmanche da estrutura ferroviária e de cabotagem no Brasil. Feito esse esclarecimento, fica aqui registrada a ação do 5º. BEC em benefício de Rondônia.
Parabenizamos, finalmente, ao Lima e ao comando do BEC, assim também a todos os militares que nele labutam em prol dos interesses desse nosso tão sofrido povo rondoniense. Segue a palestra.
5º BEC Palestra alusiva aos 50 anos
Carlos Alberto Camargo Lima (Pioneiro do 5º BEC. Palestra proferida em 29 de julho de 2015).
Srs. Oficiais, Sub Ten, Sargentos, Srs. Servidores Civis, ilustres convidados.
Vamos falar de 50 anos atrás. Como era naquele tempo. Sou até certo ponto suspeito, pois tenho uma formação positivista. Formação que adquiri em minha juventude, pelos livros que li e pela convivência com pessoas progressistas, que foi solidificada na instituição que tive a honra e o privilégio de pertencer e que ainda pertenço: a Engenharia do Exército Brasileiro.
Havia naquela época uma séria preocupação com a educação. Era meta de governo. A educação começa em casa, amplia-se na escola, no trabalho e na boa convivência. Só a educação, a competente formação e a vontade política podem fazer com que um país de dimensões continentais, com imensuráveis reservas naturais e minerais, com população expressiva e reais potencialidades podem levar um país a ser uma potência. Um país que seja admirado e respeitado. Aí a caserna nos ensina pelo exemplo. O exemplo vem de cima.
O governo daquele tempo queria que o Brasil fosse do tamanho de sua extensão territorial, de suas riquezas e de suas potencialidades. Do tamanho que o brasileiro merecia. Foram construídas ferrovias, rodovias, grandes usinas hidrelétricas geradoras de energia para alavancar o progresso brasileiro, com ordem, como consta do lema sagrado do pavilhão nacional. Foram criadas universidades, ampliou-se de forma extraordinária a indústria automobilística e de autopeças, foi criado o Setor Industrial da Zona Franca de Manaus, a previdência social, o projeto Rondon, as usinas nucleares e uma infinidade de benefícios que aqui não cabe enumerar, pois seria cansativo. Sobretudo havia ordem, respeito e segurança.
Ações efetivas foram providenciadas no sentido de integrar a Amazônia para não entregá-la a interesses e a cobiça internacional. As únicas vias de acesso permanente na Amazônia eram os rios e pelo ar, com aviões da FAB. A ligação aérea dos Territórios Federais de Roraima e Rondônia, e Estados do Amazonas e Acre era feita uma ou duas vezes por semana. De Rondônia e Acre só uma empresa. Devido a falta de recursos financeiros poucos tinham condições para utilizá-la e valiam-se do CAN - Correio Aéreo Nacional.
Em Porto Velho não havia asfalto. Em dois locais havia bloquetes: uns 100 metros na rua Presidente Dutra entre o Porto Velho Hotel e o Palácio do Governo e uns 50 metros na saída do aeroporto do Caiari, entre o estádio Aluízio Ferreira e o aeroporto. Poucas ruas calçadas com pedra irregular, no centro, no máximo uns 500 metros. O restante cascalho, em poucas ruas.
Era uma época em que a energia elétrica era fornecida por um grupo gerador, montado em 1.940, pelo engenheiro eletricista Anysio da Rocha Compasso. Funcionava das 06: às 08:00 horas e das 19:00 hs às 22:00 hs. Não havia televisão, fogão a gás, telefone, as raras geladeiras existentes na região eram a querosene, havia muito pouco veículos automotores. O único meio de comunicação existente era o rádio. Tinha que haver disponibilidade de rádio na origem e no destino, isto é, era imprevisível. O avião comercial, uma ou duas vezes por semana, trazia umas cinco revistas. Quem chegasse primeiro comprava.
Os grandes problemas na Região à época eram: a malária, o pium, a falta de saneamento básico, de água tratada, a falta ou escassez de alimentos apropriados, de meios de comunicações, o isolamento praticamente total, o clima tropical com elevadas temperaturas que favorece a indolência em trabalhos ao ar livre. No período de estio a seca, a poeira e no período das águas a umidade excessiva e a lama. A malária, a diarreia e a febre negra enchiam hospitais e cemitérios na época da construção da EFMM. Nos primórdios do BEC não era diferente.
Tive a honra e o privilégio de ter servido sob o comando dos três primeiros comandantes do 5º BEC: Cel. Weber, Ten. Cel. Noronha e Cel. Athos. O primeiro comandante do Batalhão, Cel. Carlos Aloysio Weber era um condutor de homens livres. O efetivo, no primeiro comando, amparado pela Portaria 378, era composto por voluntários, inclusive os civis de outros órgãos que passaram a disposição do Batalhão o fizeram voluntariamente. Aquele que não quisesse poderia escolher outro lugar para ser lotado. Após cumprido o prazo legal qualquer um poderia pedir transferência e teria amparo para escolher o lugar onde servir. Por justo reconhecimento o BEC leva o nome de seu primeiro comandante.
A chegada do 1º comboio do Batalhão a Porto Velho foi uma epopeia que durou 35 dias. Comboios formados por 46 viaturas, dentre elas três moto niveladoras. No dia seguinte a chegada já estava o Batalhão trabalhando na recuperação da BR 29.
Acomodando-se provisoriamente na Guarda Territorial, no estádio Aluízio Ferreira, no Colégio dom Bosco, ao lado da catedral e no DRF onde hoje é o HGPV.
Inicialmente a missão era construir a rodovia ligando Porto Velho a Rio Branco e Cruzeiro do Sul, no Acre, em direção a Pucalpa, no Peru, ligando o Brasil a Rodovia Pan-Americana. De início ampliou a necessidade de reconstruir a BR 29 que passou a denominar-se BR 364 no trecho Cuiabá - Porto Velho com 1521 km. Vale salientar que as condições para construir e manter uma rodovia na Amazônia Ocidental são as mais adversas possíveis devido a elevadíssima densidade pluviométrica que provoca erosões destruindo aterros e dificultando o trabalho de equipamentos pesados. O trabalho de construção de pilares de pontes foram obras consideradas pioneiras devido a inconsistência do solo arenoso.
Posteriormente recebeu outras missões como a ligação Abunã - Guajará Mirim, Humaitá - Lábrea, parte da Transamazônica, recuperação da Manaus - Porto Velho, da BR 163 Cuiabá - Santarém e outras, além de trabalhos em parceria com municípios e Estados da Região. A missão do Batalhão envolvia três Estados e um Território Federal. Estados que cada um é maior que muitos países da Europa.
Para supervisionar os trabalhos o Batalhão dispunha de dois aviões, um Piper Aztec bimotor e um Cesna monomotor.
O BEC construiu a primeira estação de captação e tratamento d´àgua de Porto Velho e a do Batalhão, adquiriu um geradores, construiu e fez funcionar uma granja, como parte do SAS - Serviço de Assistência Social, para suprir as necessidades básicas do pessoal militar e civil da Unidade bem como para atender a população de Porto Velho, vendendo a preço social. Em Porto Velho e demais locais na região os alimentos eram muito difíceis, principalmente carne. A granja produzia carne de frango, de suínos, de peru, leite, ovos, manteiga e linguiça. Possuía ordenhadeira mecânica, sala asséptica para receber o leite, desnatadeira, manteigueira, fábrica de rações, criadeira e setor para administração. Tinha: 288 vacas de aptidão leiteira, de alto padrão genético, Holandesas e Girolando; um touro reprodutor, girolando; 30.000 aves de corte; 5.000 aves de postura; 300 suínos de aptidão de corte das raças Duroc e Landrace. Produzia 170 dúzias de ovos por dia. Isto perdurou até que a região criou as condições e a iniciativa privada assumiu o seu papel no comércio.
A população de Porto Velho costumava, aos fins de semana, vir passear na REO - Residência Especial de Obras, que era o lugar modelo, o cartão de visita da cidade. A REO construiu e manteve as instalações da Sede do Batalhão em Porto Velho, vilas para militares e civis, compreendendo toda a infraestrutura como redes de esgoto, hidráulica, muros etc.
O reconhecimento do êxito alcançado pelo Batalhão Pioneiro da Engenharia Militar na Amazônia ensejou a criação de mais quatro Batalhões de Engenharia e o deslocamento da 1ª Companhia do 1º BEC do Rio Grande do Norte para São Gabriel da Cachoeira, no Estado do Amazonas, na Cabeça do Cachorro. O 6º BEC em Boa vista - RR, o 7º em Cruzeiro do Sul - AC (hoje em Rio Branco), o 8º em Santarém - PA e o 9º em Cuiabá - MT.
Quando o Batalhão aqui chegou a população de Rondônia era de 30.000 habitantes. Tinha dois jornais: Alto Madeira e O Guaporé. Hoje a capital tem mais de 400.000 habitantes e o Estado quase 2.000.000 de habitantes. O censo é feito de 10 em 10 anos. Rondônia tem hoje aproximadamente doze milhões de cabeças de gado bovino, na maioria, de alto padrão genético. É corredor de exportação de grãos, principalmente soja e materiais os mais diversificados.
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