Terça-feira, 30 de abril de 2024 - 16h40
Nesses tempos, quando a população
de Rondônia se vê ameaçada pela suspensão de alguns voos e mudanças de rota das
companhias aéreas que nos servem, apesar de modernos aeroportos existirem nas
mais importantes cidades da Amazônia, caiu-me às mãos essas memórias. Lembrança
daqueles tempos que a saudade imprimiu na música do mineiro Milton Nascimento a
emoção de voar nas “Asas da Panair”. Do outro lado do Brasil também a memória
guarda a existência heroica dos primórdios da navegação aérea comercial na
Amazônia. Na falta de pistas de pouso aquela empresa aérea providenciou os
hidroaviões Catalina, para servirem nossa população. No rastro vieram outras: a
Varig, a Cruzeiro do Sul ... Após o avento dos campos de pouso, eram
necessários dois dias de viagem, do litoral para as regiões fronteiriças da
Amazônia, com pernoite em Cuiabá. As dificuldades eram grandes, superadas porém
pelos sentimentos de serviço à população e de brasilidade, que integrava a
todos os brasileiro.
Soluções no passado, mesmo que
precárias, dificuldades no presente, foram essas reflexões trazidas a mim pela
memória do autor do artigo que segue abaixo, que se confundem com as memórias
desse grande intelectual amazônida chamado Isaac Benchimol.
Abrahim Baze é jornalista,
graduado em História, especialista em ensino à distância pelo Centro
Universitário UniSEB Interativo COC em Ribeirão Preto (SP). Cursou Atualização
em Introdução à Museologia e Museugrafia pela Escola Brasileira de
Administração Pública da Fundação Getúlio Vargas e recebeu o título de Notório
Saber em História, conferido pelo Centro Universitário de Ensino Superior do Amazonas
(CIESA). É âncora dos programas Literatura em Foco e Documentos da Amazônia, no
canal Amazon Sat, e colunista na CBN Amazônia. É membro da Academia Amazonense
de Letras e do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas (IGHA), com 40
livros publicados, sendo três na Europa.
Como ex funcionário dos Serviços
Aéreos Cruzeiro do Sul, nos idos anos de 1970, quando com frequência o trabalho
ocasionava meu contato com as bases da empresa na Amazônia, que eu jamais
pensei que conheceria, a crônica de Abrahim Base me emocionou. Desejei então
compartilha-la com outros, especialmente os antigo aeroviários aqui residentes.
Com a autorização do autor replico então o texto abaixo.
Catalina o pássaro de
aço nos céus da Amazônia
A Amazônia recebia a
presença da Panair do Brasil como elo de brasilidade perdida na vastidão do
território amazônico.
ABRAHIM BAZE - LITERATURA@AMAZONSAT.COM.BR
O pouso fora feito com segurança e os agentes que
representavam a Panair do Brasil em qualquer lugar da Amazônia, se encontravam
a bordo de uma pequena e frágil canoa. Era o primeiro contato com aquele enorme
avião, que trazia passageiros e mercadorias da civilização. Tudo ocorria como
previsto, a tripulação permaneceu em seus postos para eventuais emergências e
naturalmente para fatos inesperados. Havia piranhas em volta da embarcação e
naturalmente o perigo era eminente, como o caso um acidente no qual a canoa
virasse. O avião afastava-se lentamente levado pela correnteza, contudo, com
auxílio dos motores era feita a correção, a fim de permitir sua atracação junto
da boia e o hidroavião parou novamente no ponto de translado para desembarque
de passageiros e mercadorias.
Foram
momentos importantes daquele período com o sentimento de desafio e naturalmente
o começo de muitas descobertas. Outro fato interessante era a comunicação por
rádio com navios estrangeiros que promoviam o dialogo crescente e de
cordialidade, na verdade, uma troca de conhecimentos, de emoções e de histórias
que por muito tempo fariam parte do imaginário daqueles navegantes com os povos
da floresta e de seus visitantes.
Normalmente
suas chegadas no interior do estado era no amanhecer e que permitia aquela
população ribeirinha assistir ao transitar frenético de passageiros e
tripulantes em direção ao flutuante, em meio de pacotes, mercadorias, malas,
baús e gaiolas que amontoavam à espera de acomodação no interior do hidroavião,
sua tripulação de uniforme azul e branco impecavelmente vestida, ao mesmo tempo
que se ouvia uma passageira contar a lenda do Uirapuru, observava aquelas
pessoas que quase isoladas do restante do país aguardavam a lembrança de um
parente, uma encomenda, a esperança de um remédio, ou simplesmente a
oportunidade de receber noticias de um mundo desconhecido.
Foram muitas as celebrações, que se
renovavam a cada passagem da Panair do Brasil desde sua chegada inaugural em 25
de outubro de 1933, até sua partida três décadas mais tarde. Na verdade, era a
celebração da solidariedade, da amizade e principalmente muitas saudades do
encontro de porções diferentes de pessoas de um mesmo Brasil.
A
Amazônia recebia a presença da Panair do Brasil como elo de ligação de
brasilidade perdida na vastidão do território amazônico:
“[…] Quando o caboclo olhava o céu
e nele via cruzar a certeza da boa nova, a resposta para sua espera ouvia
apenas a marcação do meio dia, aproximação no meio da tarde e o anunciar do
entardecer”.
Fonte:
As asas da história. Lembranças da história da Panair do Brasil. 1996. Pág.:
13.
“O Amazonas, sob o impacto de nossa
vontade e trabalho, deixará de ser um simples capítulo na história do mundo e,
tornado equivalente a outros grandes rios transformar-se-á em capítulo na
história da civilização. Tudo que foi feito até agora no Amazonas, seja na
agricultura ou na indústria extrativista deverá ser transformado em exploração
nacional, discursava o Presidente Getúlio Vargas em 1940, quando de sua visita
a Manaus”.
Fonte:
As asas da história. Lembranças da história da Panair do Brasil. 1996. Pág.:
15.
A bem da verdade, a Panair do
Brasil antecipou-se a este projeto e com muita sabedoria contribuiu nos idos
dos anos 40, quando os Estados Unidos da América entraram na guerra e foi
firmado o acordo de Washington (1942), no qual o Brasil se comprometia em
fornecer borracha, matéria prima estratégica. A campanha da borracha começava e
utilizava a estação de rádio da Panair do Brasil em Canafa, Estado do Amazonas,
e os planos de viagem da Bacia Amazônica contratados pela Rubber Development
Company.
Fonte:
Idem página 15.
Ao sabor do balanço das águas os hidroaviões não se
perturbavam diante dos novos desafios. Singravam pioneiros os ares da Amazônia,
acompanhando o serpenteado rios até por medida de segurança. E a cada
decolagem, a certeza de um pouso mais distante como quem tem a missão de tocar
fundo o coração da floresta. A tarde caia, e com ela o vento trazia o sabor da
tarefa cumprida. Era comum, os passageiros alegres, experimentando a recepção
afetuosa de parentes e amigos em seguida acomodados na canoa, que sumia nas
curvas do igarapé, levando consigo a lenda de outros pássaros da floresta.
A tripulação tinha sua bagagem
arrumada em outra canoa e preparava-se para mais uma pernoite, e o rapaz de
uniforme impecável percorria com os olhos a paisagem, possivelmente encantado
ou à espera de um canto especial, ao seu lado, um caboclo sorria apenas sorria,
agarrado à um pacote que haviam depositado em suas mãos. O sol tocava o
horizonte em uma cena incomparável e mais uma vez testemunhava as expectativas
e sonhos dos povos da floresta embarcados num pássaro de prata, cujo, destino
estava escrito na sorte de chegar aos lugares esquecidos do Brasil.
O sentimento de desafio daqueles
heróis era de grande valia para nossa Amazônia naquele período, sempre cercado
por moradores da área, que por curiosidade, permitiam uma crescente
cordialidade e naturalmente uma troca de conhecimento, de emoções e histórias
que por muito tempo fizeram parte do imaginário dos povos da floresta em
especial do jovem Samuel Isaac Benchimol que acabara de completar seus dezoito
anos.
Samuel Isaac Benchimol guardava essas
lembranças como uma celebração, que se renovava a cada chegada e saída da
Panair do Brasil, que fez sua primeira chegada inaugural em 25 de outubro de
1933. A celebração da solidariedade, da amizade e de algumas saudades que ele
não cansava de comentar, como se fora ao encontro de poções diferentes de um
mesmo Brasil. A presença da Panair do Brasil na Amazônia, de brasilidade
perdida na vastidão do nosso território serpenteado pelas águas. Samuel Isaac
Benchimol na sua juventude, sob o impacto do seu primeiro trabalho descreveu um
capitulo da sua historia da Panair do Brasil.
Foi um período rico da nossa historia,
ao sabor do balanço das águas, aquele pássaro de alumínio não se perturbava
diante de novos desafios e singrava os céus da Amazônia e o serpentear dos rios
e a cada decolagem a certeza de um novo pouso em um espaço mais distante da
Amazônia. Foram muitas vezes que a tripulação da Panair do Brasil fazia seu
pernoite em alguma cidade da Amazônia e, mais uma vez, testemunhava
expectativas e sonhos dos povos das barrancas dos rios, fatos como esses marcaram
profundamente o inicio da carreira profissional do jovem Samuel Isaac
Benchimol.
O
apego à vida laboriosa mostrava o que seria, mais tarde, aquele jovem. Ele
acreditava no itinerário de vida, explorando ações empreendedoras procurando
construir o próprio caminho. Rica e intensa foram suas experiências despachante
de bagagem da Panair do Brasil.
[…] Relembro com saudade e emoção que
neste tempo eu era humilde despachante de bagagem da Panair do Brasil,
exercendo funções no flutuante ao lado Roadway da Manaós Harbour onde atendia
os passageiros dos hidros aviões da Panair e da Pan Amarican, que transportavam
borracha dos seringais para suplemento das Forças Aliadas na Guerra. Trabalhava
no expediente da madrugada, das 3horas às 6horas da manhã. Às 7horas já estava
na Faculdade de Direito assistindo aulas. Era meu companheiro de trabalho
Francisco Xavier de Albuquerque, que fora Ministro do Supremo Tribunal Federal.
À noite lecionava Economia Política na Escola de Comércio Solon de lucena.
Fonte:
BENCHIMOL, Samuel. Amazônia: Um Pouco-Antes e Além-Depois. Manaus: Calderaro,
1977. Pág.: 31 e 32.
O porto situado as margens do Rio
Negro, era naquele período a porta de entrada daquela cidade. Cercado de
prédios construídos no período do látex, emoldurado pelo verde da mata. É nesse
espaço físico que brota o aprendizado nas vertentes da vida e que
proporcionaria uma excelente oportunidade para o desenvolvimento da cidade de
Manaus.
O ensaio que segue foi elaborado para ser apresentado na cerimônia de abertura do Seminário Integrado de Ensino e Pesquisa e a Semana de História –
Todo boato tem um fundo de verdade: o Ponto Velho, o Porto do Velho e Porto Velho
O último artigo que publiquei aqui tratou da figura do “velho Pimentel”, um personagem que, apesar de seu caráter até agora mítico, parece estar ind
A origem da cidade de Porto Velho e o velho Pimentel
Todos sabem que a origem da cidade de Porto Velho coincide com a última tentativa de construção da ferrovia Madeira-Mamoré em 1907. Naquele ano, ao
Ciclos econômicos e migração marcaram a história de Porto Velho desde a sua criação
Há mais de 100 anos um trecho do alto Madeira presenciava o surgimento de uma nova povoação, em razão do início da construção da Estrada de Ferro Ma