Quinta-feira, 26 de dezembro de 2024 | Porto Velho (RO)

×
Gente de Opinião

Dante Fonseca

Pequena biografia do engenheiro Neville B. Craig, partícipe da tentativa de construção da EFMM em 1878


Por Dante Ribeiro da Fonseca

Pouco se sabe sobre esse engenheiro norte americano que trabalhou para a empreiteira P. & T. Collins na construção da ferrovia Madeira-Mamoré durante o ano de 1878, exceto as informações contidas em seu livro, onde narra sua participação nesse episódio. Contudo, a pessoa de Neville B. Craig está vinculada à História de Rondônia, primeiramente pela sua participação como engenheiro em sua curta e traumática passagem pelo rio Madeira; em segundo lugar, e principalmente, pelo relato dessa passagem, que escreveu e publicou nos Estados Unidos1. Podemos dizer que se a primeira razão resultou em um estrondoso fracasso a segunda foi um estrondoso sucesso, na medida em que até hoje é útil aos estudiosos do assunto. Esse livro, teve uma edição brasileira que, creio, seja a única, posto que nesses vinte anos de pesquisa nunca encontrei outra edição em português2. A esse engenheiro e aos seus associados, sobreviventes da expedição de 1878 a Santo Antonio do Rio Madeira, devemos o acréscimo de muita informação à nossa História sem a qual nossa já difícil tarefa se tornaria mais espinhosa.

Recentemente, ao buscar elementos para pesquisa que realizo sobre essa parte da nossa História, encontrei uma biografia de Neville Craig. Consta em uma publicação anual da prestigiosa universidade norte americana de Yale, considerada ainda hoje como uma das melhores universidades do Mundo, de pequena biografia dos graduados por aquela universidade, mortos no ano de 19263. Através dessa publicação, ficamos sabendo mais sobre esse personagem da nossa História: onde nasceu, um pouco da sua ancestralidade, onde morreu, casamentos, filhos e, principalmente, uma vida ativamente dedicada à engenharia, particularmente às hidrovias e ferrovias, e um pouco à memória e participação em sociedades históricas e geográficas. Podemos perceber, pela biografia, que os Craig integraram durante gerações aquele grupo social definido como pequena burguesia. Gente com cabedal suficiente para mandar seus filhos frequentarem universidades do porte de Yale e Princenton. Considerei que não seria de todo inútil o trabalho de publicar essa biografia em português. Quem sabe que tipo de informação algum pesquisador ande buscando por aí?

Finalmente, dedico essa pequena contribuição à confrade da Academia de Letras de Rondônia (ACLER) e ilustre intelectual rondoniense Yêdda Maria Pinheiro Borzacov, pelo muito que tem produzido e contribuído para a produção de conhecimentos sobre Rondônia.

Segue então a biografia:

“Obituário de Neville B. Craig.Nasceu em 1 de dezembro de 1847 na cidade de Allegheny (agora Pittsburgh, Pensilvânia) e faleceu em 08 de agosto de 1926, em Germantown (Pensilvânia). Era filho de Rebecca (McKibbin) Craig e neto por linha materna de Chambers e Jane (Bell) McKibbin, de Chambersburg (Pensilvânia). Seu pai, Isaac Craig, comerciante de madeira e historiador, era filho de Jane Ann (Fulton) Craig e de Neville B. Craig. O pai de Isaac Craig frequentou a Universidade de Princeton, onde estudou Direito e foi editor e proprietário do Pitttsburgh Gazette, o primeiro jornal publicado a oeste dos Montes Allegheny. Isaac Craig era neto do major Isaac Craig, que veio da Irlanda para os E.U.A. em 1766 e serviu com distinção durante a Guerra Revolucionária. O major Isaac Craig foi casado com Amelia, filha do general John Neville, um oficial do Exército Revolucionário, que comandou o Fort Pitt, e irmã do coronel Presley Neville, ajudante-de-ordens do general Lafayette, que foi eleito o segundo deputado de Pittsburgh4.

Neville B. Craig estudou na escola Trevillian (Sewickley, Pensilvânia) e na Academia de Pittsburgh. Durante essa parte da vida estudantil conquistou dois premios, nos certames anuais de matemática: no segundo ano conquistou o terceiro prêmio e no quarto ano conquistou o segundo prêmio. Estudou direito na Universidade de Yale durante os anos de 1870 a 1871. Posteriormente retornou a Yale onde fez um curso especial em engenharia civil na Escola Científica Sheffield (formado em 1873). Nessa universidade foi membro das fraternidades estudantis Linonia e Delta Kappa.

Trabalhou para U. S. Coast and Geodetic Survey, realizando levantamentos topográficos e hidrográficos do porto de New Haven e arredores de junho de 1873 a julho de 1875 quando foi nomeado Inspetor de melhoramentos daquele porto. Em dezembro de 1877 foi nomeado projetista da malfadada Expedição Collins, que partiu da Filadelfia para construir a Madeira & Mamoré Railway, no Brasil. Mais tarde foi promovido e atuou como assistente do engenheiro chefe dessa ferrovia. Durante os anos de 1879 e 1880 esteve envolvido em pesquisas realizadas no rio Delaware para a Coast and Geodetic Survey e foi assistente de pesquisa do Estado de Nova York sob a direção James T. Gardner. Nomeado assistente de engenheiro da Mexican National Railway em janeiro de 1881 foi posteriormente promovido a engenheiro residente, responsável pela construção de quarenta milhas da linha entre Morelia e Pátzcuaro. Em 1882 atuou por um tempo como engenheiro assistente, dirigindo as pesquisas em uma estrada de ferro projetada na Cidade do México, cujo percurso corria através de Jalapa, entre Vera Cruz e Rinconada. Desempenhou a função de assistente de engenheiro para a Mississippi River Commission entre 1882 e 1885. Ocupou-se em pesquisas para cidade de Filadélfia e em atividades para particulares de setembro de 1885 a maio de 1886. A partir dessa data até agosto de 1887, foi observador especialista na parte hidrográfica do H. L. Mandarim e assistente na U. S. Coast and Geodetic Survey. Foi também fiscal do departamento de manutenção de via da Union Pacific Railway em Omaha (Nebraska); engenheiro assistente encarregado das pesquisas no rio Red em Louisiana; engenheiro assistente na St. Louis & San Francisco Railway e chefe de equipe na Louisville Southern Railway. Foi contratado pela Commonwealth Title Insurance & Trust Company of Philadelphia de setembro de 1887 a março de 1888. Após pesquisas no Delaware foi contratado pela cidade de Filadêlfia, entre 1888 e 1890. Em novembro de 1890 foi nomeado engenheiro-chefe da Antioquia Railway (Colômbia, América do Sul), mas foi compelido a demitir-se após cerca de um ano, devido à severidade do clima. Foi assistente principal de pesquisas para o Philadelphia Department of Public Works entre 1892 e 1899.

Posteriormente envolveu-se em trabalhos literários de vários tipos. Publicou no Engineering News de fevereiro de 1898, um método novo e original de reduzir as observações da stadia do teodolito (leituras necessárias ao cálculo das distâncias horizontais e verticais) que ele tinha elaborado. Em 1907, a pedido da Madeira & Mamoré Association, composta por sobreviventes da expedição Collins, escreveu e publicou a sua história sob o título de “Memórias de uma malfadada expedição às nascentes do rio Madeira no Brasil” (vide nota 1). Em reconhecimento ao valor deste trabalho como uma contribuição para a literatura geográfica, foi logo depois de eleito membro de diversas associações: Royal Geographical Society of London, Society of the Cincinnati of Pennsylvania, Sons of the Revolution, St. Andrew's Society, American Academy of Political and Social Science, Pennsylvania Historical Society and First Presbyterian Church (Pittsburgh).

Casou-se em 1 de Janeiro de 1880, em Albany (New York) com Margaret E., filha de Daniel e Margaret (Coffee) Sullivan. Desse enlace teve os seguintes filhos: Margarita; Winifred Neville, que se casou com Walter S. Gee; Edith Oldham (Sra. Charles Russell Deare); Rebecca Eleanor e Lillian (que morreram na infância). A sra Craig morreu 19 de janeiro de 1910. Casou-se pela segunda vez em 02 de maio de 1911, em Wilkes Barre (Pensilvânia) com Gertrude Agnes, filha de Ellwood e Agnes Virginia (Dickson) Byers. Dessa união teve um filho, Neville B., que morreu na infância. Faleceu devido à arteriosclerose e foi enterrado no cemitério de Hollywood (Richmond). Deixou vivos a esposa, três filhas, seis netos e um irmão, Edward Gray Craig, de Pittsburgh e Baltimore. Outro irmão, Chambers M. Craig, morreu em 1909” (YALE UNIVERSITY, 1927, pp. 42-44).

Notas

1CRAIG, Neville B. Recollections of an Ill-Fated Expedition to the Headwaters of the Madeira River in Brazil. Philadelphia;London: J. B. Lippincott, 1907.

2CRAIG, Neville B. Estrada de Ferro Madeira Mamoré: história trágica de uma expedição. São Paulo: Nacional, 1947.

3Yale University. Obituary Record Graduates, including the record of a few who died previously, hitherto unreported. Number 86. New Haven: Yale University, 1927.

4Informações detalhadas sobre os antepassados do engenheiro Neville B. Craig podem se encontradas em: BOUCHER, John Newton (1854-1933); JORDAN, John Woolf (1840-1921). A century and a half of Pittsburg and her people; genealogical memoirs of the leading families of Pittsburgh and vicinity, compiled under the editorial supervision of John W. Jordan. Volume 3. New York: The Lewis Publishing Company, 1908.

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

Gente de OpiniãoQuinta-feira, 26 de dezembro de 2024 | Porto Velho (RO)

VOCÊ PODE GOSTAR

A História da Amazônia e de Rondônia, uma reflexão sobre sua dinâmica nos últimos 40 anos – 1984 – 2004

A História da Amazônia e de Rondônia, uma reflexão sobre sua dinâmica nos últimos 40 anos – 1984 – 2004

O ensaio que segue foi elaborado para ser apresentado na cerimônia de abertura do Seminário Integrado de Ensino e Pesquisa e a Semana de História –

Nota introdutória: Catalina o pássaro de aço nos céus da Amazônia

Nota introdutória: Catalina o pássaro de aço nos céus da Amazônia

Nesses tempos, quando a população de Rondônia se vê ameaçada pela suspensão de alguns voos e mudanças de rota das companhias aéreas que nos servem,

Todo boato tem um fundo de verdade: o Ponto Velho, o Porto do Velho e Porto Velho

Todo boato tem um fundo de verdade: o Ponto Velho, o Porto do Velho e Porto Velho

O último artigo que publiquei aqui tratou da figura do “velho Pimentel”, um personagem que, apesar de seu caráter até agora mítico, parece estar ind

A origem da cidade de Porto Velho e o velho Pimentel

A origem da cidade de Porto Velho e o velho Pimentel

Todos sabem que a origem da cidade de Porto Velho coincide com a última tentativa de construção da ferrovia Madeira-Mamoré em 1907. Naquele ano, ao

Gente de Opinião Quinta-feira, 26 de dezembro de 2024 | Porto Velho (RO)