Quarta-feira, 15 de dezembro de 2021 - 06h01
Bagé, 15.12.2021
A Imprensa, n°
810
Rio,
RJ – Quarta-feira, 19.12.1900
O
Acre
Documento Importante
Propostas Rejeitadas
O nosso colega de redação, que acaba de regressar
de Manaus, onde fora exclusivamente para acompanhar de perto os trabalhos da
nova Expedição Acreana, e assistir ao seu embarque, recebeu uma carta do
Coronel Rodrigo de Carvalho, datada do 16 de novembro último, contendo as
seguintes revelações, cujo interesse os leitores julgarão:
Às 2 horas da manhã de 13, partiu o “Solimões” e às 3 deu-se o assalto à “Alonso” [hoje “Ruy Barbosa”]. O sucesso foi esplendido. Eu e o infatigável, Dr.
João Araripe a tudo assistimos... A tripulação seguiu prisioneira. Às 7 horas
da manhã de hoje, três dias depois de ter saído deste porto, o meu bom Orlando
Lopes, Chefe da Força de Terra, deverá abrir a minha “carta de prego” ([1]) e tenho certeza que será totalmente cumprida.
O Purus será bloqueado, não se consentindo que
adiante do “Solimões” naveguem
lanchas ou vapores. Eu e os Drs. Deocleciano de Souza e Ribeiro de Castro, meus
auxiliares no governo do Acre, assim como o Dr. Ayres, médico da Expedição, partimos
hoje ao encontro do “Solimões”.
Iremos a bordo do vapor “Isidoro Antunes”.
Mudei de ideia relativamente a seguir no “Mucuripe”,
porque o comandante Bandeira telegrafou-me dizendo que o Dr. Paes de Carvalho
impediu a saída desse vapor, alegando ter recebido ordens expressas do Dr.
Campos Salles. Haja o que houver, ou o Acre volta a ser brasileiro, ou os 300
homens que se acham a bordo do “Solimões”
e mais os que vão nos Avisos de Guerra morrerão a meu lado. Havemos de mostrar
ao Brasil que somos briosos e patriotas, e não políticos de campanário ([2]) ... Se perdermos na luta que vai ser travada, nunca mais o Amazonas
será nada.
Enojam-me as traições, e tenho a registrar mais
uma de pessoa altamente colocada no comércio do Pará, que sempre se mostrou
muito amiga dos acreanos e que acaba de se pôr ao serviço da Bolívia, dizem-me
que para obter uma comissão, que lhe renderá dez ou quinze contos de réis! Não
sei explicar a atitude do Governador do Pará relativamente ao “Mucuripe”, que vem repleto de mercadorias,
não para a Revolução, mas sim para serem vendidas no Acre, em nome e por conta
de casas aviadoras do Pará. Não fossem estas notícias desagradáveis, partiria
para o Acre, com o coração cheio de alegria. Nesta minha Expedição procurarei
agir com prudência, evitando sempre o derramamento de sangue, desde que isso
não prejudique a energia necessária quando se tem que ver com inimigo
ardiloso...
A publicação destes artigos e a narração
minuciosa feita nas colunas da “Imprensa”
trouxeram ao conhecimento do Sr. Salinas Vega; Ministro da Bolívia, tudo
quanto o seu Delegado Montes e os Vice-cônsules em Manaus e Pará ainda não
tiveram ocasião de comunicar-lhe, preocupados com outros gêneros de interesses.
À medida que o diplomata boliviano se ia informando da importância da nova
Expedição Acreana; desde que provávamos com todos os detalhes a veracidade das
notícias telegráficas que o nosso representante especial nos enviara do Pará e
de Manaus, notícias que o mesmo Sr. Salinas Vega qualificou injustamente de
inverídicas, em carta dirigida ao eminente diretor da “Imprensa”, foi se forjando no seu espírito a ideia que o ilustre
governador do Estado do Amazonas era conivente na agitação acreana.Qual a razão
que assim o impelisse a pensar, não conhecemos. Entretanto, nada mais injusto.
O Coronel Silvério Nery, supremo magistrado do
Amazonas, poderá parecer ao Sr. Salinas Vega um aliado dos acreanos, porque
para S. Exª o são todos os que se não colocam incondicionalmente ao serviço da
Bolívia, ou os que exercendo cargos públicos na Amazônia, não servem os
interesses bolivianos, com prejuízo do Brasil, ou não se acomodam às exigências
ou aos caprichos de S. Exª. O que não resta dúvida, porém, é que o Sr. Nery,
tendo a perfeita noção dos deveres e das responsabilidades inerentes ao seu
cargo e, tendo perfeita compreensão dos deveres que impõe o patriotismo, não
precisa e despreza quaisquer advertências ou censuras que por ventura lhe sejam
feitas, assim como soube rejeitar dignamente tentativas de diversos sindicatos
e propostas do mencionado Sr. Salinas Vega, Ministro da Bolívia acreditado
junto ao nosso governo, propostas relativas ao Acre, visando privar Governador
do Amazonas de agir com independência.
E como o Sr. Salinas Vega chegou a formular
queixas perante o Sr. Ministro das Relações Exteriores contra o Cel Silvério
Nery, parece-nos a hora das reivindicações. Embora sem a competente
procuração, agindo com espontaneidade e em defesa da justiça, a “Imprensa” defenderá com provas a atitude
de inteira independência com que tem agido o governador do Amazonas perante a
agitação acreana. Como se defenderá, porém, o Sr. Salinas Vega contra as
insinuações contidas no artigo publicado no dia 16 do corrente na “Federação”, de Manaus, órgão oficial do
Estado? Como contestará S. Exª a afirmação autorizada pelo Coronel Silvério
Nery? É o que vamos ver e de que teremos a tratar em subsequentes artigos.
Antes de terminar, devemos contestar, a bem da
verdade, um tópico da notícia publicada pelo “Jornal de Belém” na sua edição de 23 de novembro último,
relativamente a terem feito parte da Expedição Acreana alguns súditos italianos. Não é
exato que seguissem para o Acre, nos vapores da Expedição, estrangeiros, da
qualquer nacionalidade. A Expedição compõe-se
totalmente de cidadãos brasileiros. É verdade que alguns italianos,
espanhóis e peruanos se alistaram. A Comissão, porém, agradecendo a espontaneidade
do concurso oferecido, dispensou os serviços dos estrangeiros alistados. Isto
é o que realmente se deu. Podemos afirmá-lo. (A IMPRENSA, N° 810)
A Imprensa, n°
811
Rio,
RJ – Sexta-feira, 21.12.1900
O
Acre
Expedição Rodrigo de Carvalho
Prisão de D. Lucio Velasco
Enquanto reunimos e coordenamos os elementos de
prova para a completa defesa do integérrimo Coronel Silvério A. Nery contra as
injustas acusações formuladas pelo Sr. Ministro da Bolívia nesta capital, hão
de permitir os leitores que chamemos a sua atenção para as últimas notícias do
Acre, de que foi ontem portador o paquete “Alagoas”,
do Lloyd Brasileiro. Ocupa o primeiro lugar, entre as notícias mais
importantes, a da prisão de D. Lucio Velasco, atual Vice-presidente da Bolívia
e um dos chefes superiores do Expedição Militar que o seu país mandou ao Acre,
para ali garantir o seu domínio.
Na edição da “Imprensa”
correspondente ao dia 13 deste mês referindo-nos às posições que ocupavam as
Forças de D. Lucio Velasco, acampadas em Capatará e as de Gentil Norberto, o
Chefe acreano incumbido da resistência à dominação boliviana, tivemos ocasião
de escrever:
Gentil Norberto, a fim de cortar a
retirada de Velasco, estendera uma linha de valentes soldados bem armados e
municiados ao Sul de Capatará. Contra o próprio Vice-presidente da Bolívia
expediu o Dr. Gentil Norberto uma ordem de prisão.
Sempre nos julgamos dispensados de provar a
veracidade das notícias publicadas nestas colunas, ainda quando isso nos seja
contestado por entidades superiores como o Sr. Salinas Vega. Por isso mesmo,
não faremos maior número de comentários à notícia que ontem nos chegou do
Amazonas, relatando minuciosamente a prisão de D. Lucio Velasco pelo Dr. Gentil
Norberto, tal como este Chefe se propusera a realiza-la. É do “Commercio do Amazonas”, cuja fonte de
informações é fidedigna, que transcrevemos a seguinte notícia, publicada em sua
edição de 23 de novembro:
Por carta fidedigna vinda no “Antonio Olyntho” sabemos que o Dr.
Gentil Norberto que é o chefe da Expedição Acreana, com dez companheiros, conseguiu
aprisionar D. Lucio Velasco, Vice-presidente da república da Bolívia, quando,
este descia o Rio Acre, com pequeno séquito em demanda de Puerto Alonso,
julgando achar-se tudo pacificado.
O Dr. Gentil Norberto, obtendo, porém, a palavra
do prisioneiro de que não voltaria a Puerto Alonso, deu-lhe liberdade e aos
seus companheiros. Consta, porém, que D. Lucio Velasco, desesperado com a
façanha dos heroicos moços acreanos, jurou vingar-se. Não juraria vingar-se,
garantimo-lo nós, se no lugar do Dr. Gentil Norberto estivesse o Coronel
Rodrigo de Carvalho... E dizemos isto porque lhe conhecemos as ideias. Se por
ventura D. Lucio Velasco ou outro chefe da Expedição Boliviana lhe cair nas
mãos, não voltará a Bolívia senão depois de preenchidas certas formalidades,
muito em uso em casos de guerra.
Pelas últimas notícias de Manaus, sabemos que o
vapor nacional “Labrea”, saído do
Pará a 13 do mês findo com destino ao Alto Purus, foi detido ali por ordem da
alfândega, para averiguações no seu carregamento, visto haver sido denunciado
que o mesmo vapor conduzia víveres e armamento para os bolivianos que operam no
Acre.
O comandante do “Labrea”, Sr. João Baena, lavrou um competente protesto.
Chegaram boas notícias do Coronel Rodrigo de
Carvalho e de seus abnegados companheiros de Expedição.
A polícia de Manaus mandou abrir inquérito a
respeito da saída clandestina da lancha blindada “Alonso”, ficando provado que esta lancha, tripulada por soldados
bolivianos, depois de se ter posto à fala com o vapor “Labrea”, na boca do Rio Negro, e de ter recebido carregamentos, que
lhe foram transportados daquele vapor, subiu o Solimões em demanda do Purus. A
polícia do porto multou os seus consignatários em 100$000.
O inspetor da alfândega de Manaus multou em 500$
os proprietários do vapor “Solimões”
por ter sido este encontrado rebocando a lancha “Alonso”. A esse respeito escreveu o “Amazonas Commercial”:
Fomos ontem já tarde, informados que o Sr.
inspetor da alfândega desta capital multou na importância de 500$, os armadores
do vapor “Solimões”, que deste porto
saíra legalmente, na noite de 14 do corrente.
Baseou-se o chefe da repartição aduaneira
para assim proceder, em ter, diz S. S., a citada embarcação, levado a reboque a
lancha boliviana “Alonso”, que,
segundo a Imprensa noticiou, desapareceu deste porto na mesma noite. Em que se
baseia o Sr. inspetor da alfândega para assim proceder, quando S. S. já deve
ter conhecimento de um inquérito procedido na polícia de que resultou saber-se
que a lancha boliviana se evadira deste porto, isso provado pelos depoimentos
conhecidos?
S. S. agravou uma situação; deu direito a
notas diplomáticas; menoscabou de um inquérito policial feito com severa
imparcialidade e obriga-nos a perguntar por que não exerceu a sua atividade,
quando a embarcação boliviana estava neste quadro, com armamentos, tendo, até,
à proa, um canhão de tiro rápido. (A IMPRENSA, N° 811)
Bibliografia
A IMPRENSA, N° 810. O Acre – Documento Importante ‒ Brasil ‒ Rio de Janeiro, RJ ‒ A
Imprensa, n° 810, 20.12.1900.
A IMPRENSA, N° 811. Expedição Rodrigo de Carvalho – Prisão de D. Lucio Velasco ‒ Brasil
‒ Rio de Janeiro, RJ ‒ A Imprensa, n° 811, 21.12.1900.
Solicito Publicação
(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de
Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;
· Campeão do II
Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)
· Ex-Professor
do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA) (2000 a 2012);
· Ex-Pesquisador
do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);
· Ex-Presidente
do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);
· Ex-Membro do
4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)
· Presidente da
Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);
· Membro da
Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);
· Membro do
Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);
· Membro da
Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)
· Membro da
Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
· Comendador da
Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)
· Colaborador
Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).
· Colaborador
Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
·
E-mail: hiramrsilva@gmail.com.
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