Quarta-feira, 28 de abril de 2021 - 06h05
Bagé, 28.04.2021
Navegando o Tapajós ‒ Parte XVIII
Cerâmica Santarena V
Frederico Barata (1950–1954)
Frederico
Barata nasceu no ano de 1900 em Manaus, onde permaneceu até concluir o curso
primário. Em Belém, cursou o secundário no Colégio Paes de Carvalho. Em 1922,
mudou-se para a Cidade do Rio de Janeiro a fim de cursar a Faculdade de
Medicina, a qual abandonou no quinto ano para dedicar-se ao jornalismo. Iniciou
sua carreira de jornalista trabalhando no Rio Jornal, Brasil Matutino e Jornal
do Povo.
Em
1925, passou a trabalhar na redação de “O
Jornal”, onde cobria os acontecimentos da Câmara e Senado. Segundo Carlos
Alberto Rocque, conhecido como o “Repórter
da História”, Barata possuía perspicácia e agudeza na sua interpretação dos
fatos políticos. Neste jornal, tornou-se secretário e depois diretor. A
carreira jornalística de Frederico Barata está ligada à expansão dos Diários
Associados, construído por Assis Chateaubriand a partir de 1921 com a aquisição
de “O Jornal”. Em 1924, Barata
participou da criação do jornal “Diário
da Noite” e, em 1928, integrou a equipe fundadora da revista “O Cruzeiro”, ambos empreendimentos dos
“Diários Associados”. Como um dos
diretores desta empresa, recebeu a incumbência de dinamizar vários jornais do
país, como o “Diário de Pernambuco”,
em Recife, e “O Estado de Minas”, em
Belo Horizonte.
É
em uma destas missões que retorna a Belém, em 1947, para fundar e depois
assumir a direção do jornal “A Província
do Pará”. A seguir, foi nomeado Superintendente dos Diários e Rádios
Associados em toda a Amazônia. Além da “Província”,
criou as emissoras de rádio e “TV
Marajoara”. Frederico Barata interessava-se por arte, ciência e literatura.
Era um profundo conhecedor das artes plásticas, tanto que, em 1944, publicou o
livro Elizeu Visconti e sua época. É dentro desse espectro cultural que surgiu
seu interesse pela Arqueologia. No Rio de Janeiro, ainda em 1944, publicou “Os Maravilhosos Cachimbos de Santarém”
em Estudos Brasileiros. Em Belém, tornou-se membro do Instituto de Antropologia
e Etnologia, que reunia intelectuais interessados em Antropologia, Folclore,
Etnologia e Arqueologia e tinha como sede provisória o Museu Paraense Emílio
Goeldi. Em 1949, conquistou o título de sócio efetivo deste Instituto com a
publicação do artigo “A língua dos Tapajó”
no jornal Província do Pará.
Mais
tarde foi um dos Presidentes e “seu maior
impulsionador”. Era em suas viagens de navio de Belém a Manaus, para supervisionar
um dos jornais integrantes dos Diários, que Barata passava pela Cidade de
Santarém. Permanecia lá um ou dois dias, cavando os quintais das casas no
Bairro de Aldeia, em busca de material arqueológico, ou comprava objetos já
retirados pela população local. O material era trazido para Belém, onde ele o
lavava e tentava fazer a reconstituição dos objetos fragmentados. Foi dessa
maneira que Barata formou a coleção, a qual, em 1959, veio a vender ao CNPq que
a depositou no Museu Goeldi para guarda e conservação.
A
observação e a pesquisa intensiva deste material resultou nas seguintes
publicações:
– A Arte Oleira dos Tapajó I:
Considerações sobre a Cerâmica e dois tipos de Vasos Característicos, Revista
do Instituto de Antropologia e Etnologia do Pará em 1950;
– A Arte Oleira dos Tapajó II:
Os Cachimbos de Santarém, Revista do Museu Paulista em 1951;
– Arqueologia Brasileira e Cerâmica
Santarena: um capítulo do livro “As
Artes Plásticas no Brasil” de Rodrigo Mello de Andrade, publicado em 1952.
– Uma Análise Estilística da Cerâmica
de Santarém: Revista Cultura em 1952;
– A Arte Oleira dos Tapajó III:
Alguns Elementos novos para a Tipologia de Santarém, Revista do Instituto de
Antropologia e Etnografia do Pará em 1953;
– O Muiraquitã e as Contas dos
Tapajó: Revista do Museu Paulista em 1954.
Além
da intensa produção escrita sobre o assunto, Frederico Barata divulgava seus
conhecimentos através de aulas práticas na disciplina Etnologia do Brasil na
Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade do Pará. O trabalho
pioneiro desenvolvido por Barata, na década de 1950, a respeito da Cerâmica de
Santarém, tem reconhecimento nacional e internacional e estabeleceu conceitos
que ainda hoje são largamente usados por todos aqueles que desejam estudar o
assunto.
Ele
não foi um mero colecionador de objetos, mas a sua maneira e com os recursos de
sua época, foi um pesquisador de visão científica apurada. Resumindo: é
impossível falar da Cerâmica de Santarém sem citar Frederico Barata. Frederico
Barata faleceu em 08.05.1962 no Rio de Janeiro.
Frederico
Barata em uma de suas publicações, “A
Arte Oleira dos Tapajós: I” faz a seguinte citação:
A Cerâmica dos Tapajó era tão pouco
conhecida, mesmo em tempos recentes, que até 1823 não se tinha a menor ideia da
forma completa de qualquer dos seus vasos típicos. O Volume VI dos “Anais do Museu Nacional [1895]” quase
todo dedicado à Cerâmica amazônica, é paupérrimo de informações sobre a de
Santarém à qual fazem vagas referências apenas Hartt que a denomina “Louça de Taperinha” ou “dos moradores do alto”, Ferreira Pena e
Ladislau Neto, este último reproduzindo equivocadamente um fragmento santareno
que descreve e classifica como de Marajó. A coleção Rhome, incorporada ao Museu
Nacional, é fraquíssima e mal dá noção da monumental variedade de formas da
louça dos Tapajó, pois não possui uma única peça inteira característica. Foi em
1923 que Curt Nimuendaju, trabalhando para o Museu de Gottenborg, revelou ao
mundo científico, coletando peças completas e grandes fragmentos, o ineditismo
e a beleza dessa soberba arte primitiva. Helen Constance Palmatary, repetindo
Linné, descreve a descoberta da Cerâmica de Santarém por Nimuendaju como
meramente casual. Segundo esses autores, em consequência da chuva, com forte
poder erosivo, deixou a descoberto considerável porção de terrenos altos, pondo
à mostra fragmentos estilizados e às vezes lindamente desenhados.
Afortunadamente – acrescentam – estava em
Santarém, no momento, Curt Nimuendaju e, graças aos seus esforços, muito desse
material foi salvo.
Tal versão não é rigorosamente exata.
Desmentiu-a em palestra comigo, em agosto de 1945, no Rio de Janeiro, o próprio
Curt Nimuendaju. Tivera ele notícia, por um Padre alemão, seu amigo [do qual
infelizmente não guardei o nome], de que em Santarém as crianças apareciam
frequentemente brincando com pedaços de Cerâmica indígena, aos quais chamavam “caretas” e que encontravam na Cidade.
Ficou interessado e, logo que lhe foi possível, dirigiu-se a Santarém,
especialmente para estudar a Cerâmica que lhe fora descrita como originalíssima
e diferente de todas as conhecidas. Verificou logo sua importância e iniciou
pesquisas para as quais, entretanto, não encontrou o menor apoio.
Contou-me na mesma ocasião Curt Nimuendaju
que, certo dia, tendo localizado na Aldeia um terreno cheio de fragmentos,
começou uma escavação e achou indícios de boa Cerâmica. Na manhã imediata,
voltando ao local para prosseguir no trabalho, encontrou lá um português,
residente nas vizinhanças, que tudo inutilizara cavando ativamente.
Irritado, perguntou-lhe por que estava
fazendo aquilo e obteve esta resposta: – “Estou
procurando o tesouro; se o senhor pode achá-lo eu também posso!”
O buraco estava enorme e a Cerâmica
perdida. Com esse exemplo, quis Nimuendaju demonstrar-me o quanto é difícil
preservar as nossas riquezas arqueológicas, dada a incompreensão absoluta do
homem do interior, que, ou tem medo dos objetos dos Índios e os destrói, ou por
eles tem desprezo. (BARATA, 1950)
Em
relação à falta de apoio ao trabalho de Nimuendaju apontado por Frederico
Barata, podemos afirmar que o governo do Município destacou um funcionário para
negociar com os proprietários dos terrenos a serem escavados.
Cerâmica de Santarém
A
Arte da Cerâmica evoluiu, consideravelmente, quando deixou de se dedicar
somente a objetos do cotidiano, e partiu para a manufatura de ídolos e adornos
religiosos quando cada peça passou a ser tratada como uma obra de arte
especial, dedicada aos antepassados ou aos guias espirituais. Os detalhes
artísticos, em relevo, eram obtidos com a aplicação sobre a peça de uma fina
camada de argila que era trabalhada e recortada delicadamente. A complexidade e
a diversidade da Cerâmica de Santarém não têm precedentes e o significado de
suas imagens e símbolos continua desafiando os pesquisadores.
A
argila misturada ao cauxi e, eventualmente, a outros elementos antiplásticos,
os grafismos pintados com pigmentos orgânicos e inorgânicos através de variadas
técnicas, como a incisão, a marcação com malha, a inserção de apliques, a
pintura, embora poucas vezes empregada, utilizava uma técnica que incluía o uso
da bicromia e da tricromia. As vasilhas apresentam contornos complexos
associando harmoniosa e regularmente a representação de figuras humanas e de animais.
Os objetos mais significativos, da grande variedade apresentada na Cerâmica de
Santarém, são os vasos de cariátides, os vasos de gargalos, as estatuetas e os
cachimbos.
Bibliografia
BARATA, Frederico. A Arte Oleira dos Tapajó: I – Brasil – Belém, PA – Revista do
Instituto de Antropologia e Etnologia do Pará, 1950.
Solicito Publicação
(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de
Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;
· Campeão do II
Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)
· Ex-Professor
do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA) (2000 a 2012);
· Ex-Pesquisador
do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);
· Ex-Presidente
do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);
· Ex-Membro do
4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)
· Presidente da
Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);
· Membro da
Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);
· Membro do
Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);
· Membro da
Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)
· Membro da
Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
· Comendador da
Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)
· Colaborador
Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).
· Colaborador
Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
· E-mail: hiramrsilva@gmail.com.
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