Quinta-feira, 27 de maio de 2021 - 06h00
Bagé, 27.05.2021
Expedição Centenária Roosevelt-Rondon
1ª Parte – V
Frases
de Roosevelt – Observações de Roosevelt sobre o Brasil e os Brasileiros
Roosevelt era espirituoso e alegre, não parecendo incomodar-se muito com
os enxames de abelhas e de mosquitos, que, às vezes, lhe cobriam as mãos,
enquanto, impassível, escrevia as suas impressões e a sua correspondência ([1]) durante
as refeições e ao terminá-las, detinha-se a palestrar conosco, em francês, e
distinguia com evidente simpatia o admirável palestrador que é também o Comandante
Heitor Xavier Pereira da Cunha, distintíssimo oficial da Marinha de
Guerra, hoje reformado, nosso companheiro durante o começo da Expedição.
Pereira da Cunha deleitava-nos com a sua verve ([2]), ao
mesmo tempo em que provocava inteligentemente as opiniões de Roosevelt, mas sempre
correto e gentil, como um homem de fina educação que é.
Em uma dessas palestras, a propósito dos japoneses, Roosevelt declarou
formalmente condenar a emigração desse povo para o seu país, porque lhes
observara as tendências acentuadas para a absorção e para o predomínio sobre o
elemento nacional.
Por condenar as violências de seus patrícios, para repelir e expulsar os
japoneses da América do Norte, estes interpretaram os seus atos como respeito
aos japoneses, que eram formidáveis! Esta arrogância teve como resposta ao pé
da letra o celebérrimo “raid” ([3]) da
esquadra norte-americana, com passagem obrigatória pela Ásia. (MAGALHÃES, 1942)
Vamos
reproduzir, a seguir, parte do Anexo 5 ‒ Relatório apresentado ao Sr. Coronel
Cândido Mariano da Silva Rondon pelo Capitão Amílcar Armando Botelho de
Magalhães, Ajudante da Expedição Científica Roosevelt-Rondon, publicado em
1916:
Capítulo
1 – Sob a Vossa Chefia imediata
02 a 05.12.1913: Em 2 de dezembro desse mesmo ano,
obedecendo a tão honrosa indicação, parti em vossa companhia pelo noturno de
luxo, às 21h30. No dia 3 chegamos a
S. Paulo, com um atraso de 02h20 e às 20h13 partimos pela Estrada de Ferro
Sorocabana.
Às 10h30 do dia 4 chegamos à
estação Bauru, onde nos aguardava um trem especial, posto a vossa disposição;
às 11h50 partimos de Bauru e às 21h00 desembarcamos em Araçatuba, onde pernoitamos,
visto não estar em certo trecho consolidada a linha, de modo a permitir que se
viajasse à noite. Em caminho para Araçatuba, fez-se uma pequena parada na
estação provisória “Heitor Legrue”,
onde os índios Kaingangs, esses mesmos considerados ferozes e cuja pacificação
foi feita pessoalmente por vós, em época bem recente, vieram documentar
vivamente a injustiça de que eram vítimas, festejando a vossa passagem pelas
suas terras.
Às 03h00 do dia 5 partimos
para Itapurá onde apenas demoramos 20 minutos; às 09h00, desembarcamos na
estação provisória de Jupiá. Às 12h00 desatracou o “ferry-boat” conduzindo-nos para a margem direita do Rio Paraná, o
que vale dizer, transportando-nos do Estado de S. Paulo para o de Mato Grosso.
Reorganizado o trem sobre os trilhos da outra margem, partimos às 14h00 para
Três Lagoas onde almoçamos às 14h30. Às 15h30 retornamos ao trem e às 20h30
desembarcamos na estação do Rio Verde, última estação inaugurada nesse trecho e
na qual fizemos a nossa segunda refeição.
06 a 09.12.1913: Às 05h00 de 6 partimos para a ponta dos trilhos; às
08h00 saltamos do “wagon” e às 09h30
partimos montados, da ponta dos trilhos, com destino ao Rio Pardo, onde apeamos
às 16h05 ([4]) em Rio
Pardo, onde às 19h00 fizemos a única refeição desse dia, aguardamos a chegada
da tropa, que só apareceu às 22h00, recebendo ordem vossa de prosseguir viagem,
substituindo-se alguns animais cargueiros que davam mostras de cansaço.
Às 02h00 do dia 7 iniciamos a
nova marcha, aproveitando a claridade das estrelas e, às 10h15, apeamos junto
ao Córrego Campo Alegre, onde tomamos a única refeição desse dia; às 16h10
prosseguimos viagem. No dia 8 às
02h30 apeamos em um sítio pertencente ao Cel Sebastião de Lima, a uma légua de
Campo Grande, aí pernoitando. Às 08h35 do mesmo dia oito, chegamos à Vila de
Campo Grande onde aguardamos a vinda dos cargueiros que conduziam nossa
bagagem, o que só se deu às 13h00.
Nesse mesmo dia partimos às 18h00 e à 01h00 do dia 9 chegamos ao acampamento da construção
do outro trecho da Estrada de Ferro Noroeste. Ainda a 9, às 06h15 partiu o trem especial posto à vossa disposição para
vos conduzir a Porto Esperança. Adiante da vila de Aquidauana o trem parou
alguns minutos, junto à estação provisória “Visconde
de Taunay”, onde um numeroso grupo de índios “Terenas”, soltando foguetes e cantando na sua língua, dava mostras
do quanto os alegrava a vossa presença entre eles. Não me posso furtar ao dever
de citar episódios como esse, visto envolver o assunto de tão grande interesse
para a nossa Pátria, ferindo o grande problema das relações do homem civilizado
com o homem que habita as selvas. É curioso assinalar, como nota probatória do
prestígio em que é tida a vossa pessoa entre eles, o fato de trazerem as mães,
de muito longe, os seus filhinhos recém-nascidos, para receberem o ósculo
afetuoso que lhes imprimíeis, fato a que também se liga o sentimento afetivo do
índio. Desembarcamos às 22h00, em Porto Esperança ([5]),
passando-nos com as bagagens para bordo do paquete “Nyoac”, onde afinal a urgência da marcha permitiu que fosse tomada
uma refeição nesse dia. Às 23h30 partia o “Nyoac”,
Rio Paraguai abaixo, com destino à foz do Apa.
10 a 11.12.1913: No dia 10, às 04h00, paramos defronte ao nosso
legendário Forte de Coimbra ([6]),
glorioso baluarte da honra nacional, teatro de um choque armado da bravura
paraguaia contra a bravura brasileira e onde se imortalizaram Portocarrero e o
pequeno grupo de obscuros, mas heroicos defensores da nossa Pátria.
Às 05h30, prosseguimos viagem a bordo do “Nyoac” e no dia 11, 05h30, arriamos ferro em frente a Porto Murtinho ([7]),
pequeno povoado mato-grossense da margem esquerda do Rio Paraguai. De Porto
Murtinho partimos às 08h05 e às 09h50 encontramos navegando contra nós o
paquete “Brasil” de cujo bordo
retiramos as nossas malas de fardamento fino, embarcadas no Rio de Janeiro
conjuntamente com a carga destinada à Expedição, fazendo-nos ao largo novamente
às 10h30. Ancoramos às 13h30 do dia 11,
defronte embocadura do Rio Apa onde aguardamos a chegada do Sr. Roosevelt,
olhando simultaneamente as terras brasileiras da sua margem direita e as terras
paraguaias de sua margem esquerda. Nessa expectativa passamos a noite do dia 11, estabelecendo o serviço de
vigilância e conservando-nos de “prontidão”
segundo a terminologia militar.
12.12.1913: No dia 12 às 10h40 foi assinalada, a jusante,
a fumaça de um navio no extremo do estirão
([8]) em que
nos encontrávamos e às 11h10 ([9])
ancorava a bombordo a canhoneira paraguaia “Adolpho
Requielme”, em que viajava o Sr. Roosevelt. Após os cumprimentos de estilo,
levados a bordo da “Riquielme”,
partimos às 12h10 comboiando com o “Nyoac”
aquele navio de guerra ([10]).
(MAGALHÃES, 1916)
Bibliografia
MAGALHÃES, Amílcar A. Botelho de. Anexo
n° 5 – Relatório Apresentado ao Sr. Coronel Cândido Mariano da Silva Rondon –
Chefe da Comissão Brasileira – Brasil – Rio de Janeiro, RJ – Papelaria
Macedo, 1916.
Solicito Publicação
(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de
Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;
· Campeão do II
Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)
· Ex-Professor
do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA) (2000 a 2012);
· Ex-Pesquisador
do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);
· Ex-Presidente
do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);
· Ex-Membro do
4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)
· Presidente da
Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);
· Membro da
Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);
· Membro do
Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);
· Membro da
Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)
· Membro da
Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
· Comendador da
Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)
· Colaborador
Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).
· Colaborador
Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
· E-mail: hiramrsilva@gmail.com.
[1] O “The Outlook”, um dos grandes diários de
New York, pagava-lhe os artigos à razão de um dólar por palavra!
[2] Verve:
oratória.
[3] Raid: ataque.
[4] Tínhamos feito,
nessa primeira marcha a cavalo, vinte léguas ou 120 quilômetros, contados pelos
marcos da estrada quilometrada! (MAGALHÃES, 1942)
[5] Porto Esperança:
19°36’35,71” S / 57°27’22,98” O.
[6] Forte de
Coimbra: 19°55’13,35” S / 57°47’31,70” O.
[7] Porto Murtinho:
21°41’55,10” S / 57°53’22,57” O.
[8] Na Imagem 02 podemos notar que o processo de assoreamento da Foz
do Rio Apa, em decorrência da remoção da vegetação ciliar da sua Bacia,
projetou a margem esquerda sobre a ilha frontal à boca eliminando-a, numa
extensão de mais de 2 km rumo Oeste e os sedimentos foram carreados, na maior
parte, para SO em virtude da corrente do Paraguai. O desvio do talvegue do Rio,
em consequência, dirigiu a torrente contra a margem direita que foi
paulatinamente solapada ampliando a curva à direita que já existia. Podemos
afirmar, então, que o encontro dos expedicionários deu-se, aproximadamente, nas
coordenadas 22°05’24,48”S/57°58’21,01”O, pois a lógica nos leva a considerar
que os nautas abrigar-se-iam da correnteza ancorando a embarcação ao Sul da
margem direita do Boca do Apa ao mesmo tempo que esta localização facilitava a
visão do Estirão que se alongava no sentido SSE (Susudeste). As cartas antigas
mostram uma ilha, ou banco de areia, na vazante, na Boca do Apa que com o
passar dos anos foi progressivamente incorporada ao continente pelos
sedimentos.
[9] Há uma
diferença de 7 minutos entre os cronômetros do Cap Amílcar (11h10) e do Telegrama
enviado pelo Cel Rondon (11h17) ao Ministro Lauro Müller. Nas suas Conferências
no Teatro Fênix, por sua vez, Rondon afirma que: às 11h30, a “Riquielme” estava a bombordo do “Nyoac”. O que nos leva a poder
considerar que o “Riquielme” ancorou,
portanto, após as 11h00 à bombordo do “Nyoac”.
[10] Telegrama do Cel
Rondon publicado, no Jornal “O Paiz”:
Porto
Murtinho, 14.12.1913 – Participo a V. Exª termos chegado, no dia 11, às
13h30, e ancorado na Foz do Rio Apa, onde aguardamos a passagem do Coronel
Roosevelt, e sua comitiva. Às 11h17 do dia 12, ancorou a nosso bombordo a
canhoneira Adolpho Requielme, a cujo bordo veio o ilustre Ex-presidente
norte-americano. Após cumprimentos, levados pela Comissão Brasileira, a bordo
do navio paraguaio, levantamos ferro Rio acima, comboiando aquela embarcação.
(O PAIZ, n° 10.662)
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