Terça-feira, 1 de junho de 2021 - 06h00
Bagé, 01.06.2021
Expedição Centenária Roosevelt-Rondon
1ª Parte – VIII
Theodore Roosevelt – II
O Paiz, n° 10.594 ‒ Rio de Janeiro, RJ
Quinta-feira, 09.10.1913
A
Vinda do Sr. Roosevelt
Está em viagem para o Brasil o Sr. Theodore Roosevelt, que deve ser
acolhido aqui com manifestações excepcionais de apreço, tanto pela radiação do
seu nome notável no domínio do pensamento, como na arte de governar, e pelo que
a sua personalidade tem de intensamente representativa da civilização
americana. “Deve ser” não
significa uma deliberação já assente por parte das autoridades ou dos centros
intelectuais da metrópole brasileira, mas a obrigação em que uns e outros se
acham de manifestar ao grande estadista e vigoroso escritor o alto conceito em
que tem a sua obra de democrata, a sua capacidade de diretor da política de uma
grande nação, o seu talento de publicista possante e original.
É tempo de se pensar na melhor maneira por que se há de acolher o
Ex-presidente dos Estados Unidos, espírito de renome e influência universal, e
que tão particulares testemunhos de interesse mostrou pelo progresso da nossa
República.
São visitas desta ordem, espontâneas, ditadas pela curiosidade
intelectual por um visível sentimento de simpatia, que nos devem lisonjear. O
Sr. Roosevelt tem um grande público que admira a sua independência de caráter,
a justeza das suas observações, a superioridade do seu critério, e, assim, o
que da sua pena sair sobre a situação da nossa terra, sobre os problemas que o
preocupam, sobre os traços especiais da nossa evolução social, política e
econômica, sobre o pitoresco das nossas paisagens e dos nossos costumes, há de
atrair para o Brasil uma larga atenção, produtora mais tarde de
excelentes frutos.
Não é por esse lado somente que a sua vinda deve ser apreciada, embora
não fique mal a nenhum povo, como a nenhum indivíduo, pensar nos proveitos
nobres que pode colher de um incidente, para o qual não concorreu, mas que,
inteligentemente aproveitado, lhe pode determinar resultados utilíssimos. O que
acima de tudo, é claro, nos impõe o grato encargo de festejar o advento do Sr.
Roosevelt é a compreensão que todos temos da grandeza da sua ação política, do
seu amor à paz universal, do seu empenho pela concórdia e pela prosperidade
americana. Os Estados Unidos devem ao grande homem monumentos de verdadeiro
orgulho patriótico, tão brilhante foi o concurso que trouxe ao acréscimo do seu
prestigio internacional.
Ao gênio político de Roosevelt deve a poderosa República grande parte da
influência de que dispõe no concerto das potências e o ambiente de confiança e
admiração com que nos principais países do continente passaram a ser, julgadas
as suas ideias e tendências em relação às Repúblicas latinas, por cuja
integridade ela sempre zelou, fiel ao compromisso tradicional de Monroe.
O período da sua administração constitui uma das páginas mais vibrantes e
gloriosas da história daquele admirável país. A paz entre a Rússia e o Japão,
trabalho do Presidente daquela República, bastaria para dar à sua
individualidade uma fulguração imorredoura. Não há, nos últimos tempos, exemplo
de uma tão grande autoridade envolta em tão larga, carinhosa e entusiástica
estima, como aquela de que gozou o eminente democrata durante os anos de sua
fecundíssima presidência. O cortejo que algumas monarquias poderosas fizeram ao
chefe dessa deslumbrante democracia, disputando-lhe as graças e enaltecendo-lhe
o valor, dá a medida do êxito dessa administração inolvidável.
Este artigo não visa, porém, a reconstituição dos serviços que, em escala
espantosa, prestou ao progresso do seu país e ao aumento da civilização
universal. Não chegou ainda a hora do cumprimento desse dever; o que se quer é
simplesmente relembrar a imponência desse vulto, que, fora do poder, e por ele
tão nobilitado, ainda exerce sobre os espírito dos governantes e dos povos a
fascinação do talento, como condutor perspicaz que foi das energias e das
aspirações da sua vigorosa e liberalíssima nacionalidade.
O Sr. Roosevelt, dissemos atrás, mostrou sempre pelo Brasil um grande
interesse, acompanhando os seus progressos e prestando-lhe até o auxílio da sua
boa vontade na solução das dificuldades que para o problema do Acre criara a fundação
do Bolivian Syndicate.
Sem a intervenção do Governo Americano, esse grupo financeiro não teria
aberto mão dos seus direitos ao verdadeiro domínio do território em que se
instalara, escudado numa “Carta” do
gênero das grandes companhias exploradoras dos Sertões africanos.
A solicitude com que a Chancelaria da grande República, interpretando os
sentimentos de cordialidade do Sr. Roosevelt com o nosso país, procurou obter a
acomodação da empresa aos desejos de Rio Branco, recomendou logo o grande estadista
ao apreço nacional.
A viagem de Elihu Root ao Brasil, para assistir à inauguração da
Conferência Pan-Americana, obedeceu ao pensamento do Chefe do Estado que se
esforçava por manifestar à opinião Sul-americana o seu espírito de amizade
sincera, dissipando velhos e desarrazoados preconceitos sobre o caráter
autoritário e imperialista da política dos Estados Unidos, em relação aos povos
latinos do continente. Se o Sr Root percorreu diversas Repúblicas, não há negar
que só pensou nessa visita depois de resolvida a viagem à metrópole brasileira.
Era claro que essa audição a uma República Sul-americana, motivada pelo
fato da reunião da Conferência Internacional, devia ser tomada pelas outras
como uma prova da perfeita amizade que os Estados Unidos lhes votavam, alheados
por completo de qualquer ideia de preponderância, num futuro mais ou menos
próximo. O Sr. Root quis, porém, ser gentil com as principiais, para que não
houvesse entre elas motivo para ciúmes, e prolongou a sua excursão de
proveitosa e inteligente confraternidade.
O Brasil não pôde esquecer, porém, o empenho que o Governo de Roosevelt
pôs em lhe patentear o seu afeto por essa ocasião, delicadeza que o povo
compreendeu naturalmente emocionado, festejando por forma verdadeiramente
entusiástica o seu eminente auxiliar de Governo. Além do dever em que nos
achamos, como sociedade culta, de demonstrar a nossa admiração por um dos
espíritos mais notáveis do tempo, com uma bela folha de serviços à liberdade, à
paz, à civilização, ilustre nas letras, grande na política, soldado heroico e
pensador profundo, há ainda a consideração especial do reconhecimento que nos
cumpre prestar pelas suas provas de estima, tão sinceras como úteis. [...] (O
PAIZ, n° 10.594)
O Paiz, n° 10.602 ‒ Rio de Janeiro, RJ
Sexta-feira, 17.10.1913
Roosevelt
A
Sua Próxima Chegada a Esta Capital
A próxima visita do Sr. Theodore Roosevelt, o brilhante estadista “yankee” e antigo Presidente da grande
República do Setentrião, vai ser, dentro de uma semana, a nota sensacional da
vida brasileira. Além de se tratar de um homem notável por todos os títulos,
político, pensador e tribuno, “sportman”
consumado e perfeito “gentleman” em
toda a extensão do vocábulo, hoje de nomeada mundial, conquistada
vitoriosamente desde o seu vigoroso Governo nos Estados Unidos até as suas
múltiplas excursões pelos diversos continentes, em cujo coração se há
entranhado em curiosos e interessantes estudos, tem ainda para nós um outro
encanto – é haver sido sempre um grande amigo da nossa Pátria.
O Governo, em nome do Brasil, vai recebê-lo com todas as honras, se bem
que a sua vinda ao nosso pais se revista de caráter puramente particular, tendo
mesmo, por principal escopo, estudar o nosso meio e as nossas coisas, como tem
feito em outros países, o que exige uma certa tranquilidade de ânimo e, para
que não dizer logo, requer, acima de tudo, uma justificada liberdade de ação.
Seria assim insensato que se pretendesse entre nós, quer pelo mundo
oficial, quer pelas outras classes da nossa sociedade, tomar-lhe o tempo
inteiro; de que dispõe, e que não é muito, com festas sobre festas e
intermináveis homenagens, transformando-o em um simples prisioneiro de
Exagerados carinhos privando-o de satisfazer a natural curiosidade científica
que o atrai principalmente às nossas plagas.
Não há dúvida que é dever nosso cercá-lo do grande afeto, de que fez jus
por mais de uma ocasião, quer como simples cidadão, quer como chefe supremo de
seu país, dando-nos constantes e evidentes provas de alta estima e consideração,
e concorrendo com isso a reafirmar as cordiais e fecundas relações que sempre
ligaram as duas maiores potências da América, desde que ambas se tornaram
independentes das respectivas metrópoles. [...]
Tudo isto justifica a satisfação com que o Governo da República e os
brasileiros em geral receberão tão ilustre e prezado hóspede; estamos certos de
que o acolhimento que terá de todos será tanto mais sincero e expressivo,
quanto não se revestirá de excessivas exibições, que não estão mais ao nível de
nossa cultura, e que nos reduziriam, diante do seu olhar perscrutador de
sociólogo e cientista, às ridículas proporções de certos povos que, conto mesmo
nos descreve, teve ensejo de visitar em algumas regiões pouco civilizadas.
Se o Governo brasileiro adotar para a recepção do grande estadista o
protocolo “Yankee” se não
servilmente, ao menos em suas linhas gerais, em se tratando de um ex-chefe de
Estado, o seu desembarque se deverá realizar no Arsenal de Marinha, onde, em
sala especial, receberá os cumprimentos do representante do Presidente da
República, Ministros das diversas pastas, Presidentes do Senado e da Câmara,
com as respectivas comissões de diplomacia; embaixador americano e seus
secretários; diplomatas estrangeiros que o desejem cumprimentar; altos
funcionários da República; Presidente e demais diretores do Instituto
Histórico, no qual vem especialmente fazer uma conferência e delegados de
outras instituições de ciência, letras e comércio. [...]
Além da recepção em que, naturalmente, deverá apresentá-lo à sociedade
brasileira o Sr. Edwin Morgan, e das festas promovidas pela colônia
norte-americana, é possível que o Sr. Ministro das Relações Exteriores lhe
ofereça um “garden-party” em um dos
nossos soberbos parques, e as Comissões de diplomacia do Senado e da Câmara lhe
deem um grande baile.
O ilustre estadista terá assim ensejo de se achar em contato com a nossa
sociedade culta durante alguns dias; e, depois de fazer a sua Conferência no
Instituto Histórico, é possível que passe a visitar, além do Instituto Oswaldo
Cruz, alguns dos nossos grandes estabelecimentos fabris, para fazer ideia do
progresso real das nossas indústrias, seguindo a percorrer um dos Institutos de
instrução agrícola, fundados pelo Ministério da Agricultura, e uma ou duas das
nossas colossais fazendas de café.
A sua demora nesta cidade será agora curta, partindo depois para S.
Paulo, onde passará alguns dias, e visitando talvez Minas Gerais.
Deixando sua ilustre família em companhia de seu filho, em S. Paulo, o
Sr. Roosevelt irá por terra, através do Paraná, S. Catarina e Rio Grande do
Sul, até Montevidéu, passando-se daí para Buenos Aires e seguindo, finalmente,
até ao Chile.
Daquela República, onde ficará uma semana talvez, regressará ao Brasil,
onde virá encontrar-se com o Coronel Rondon, com este empreendendo uma longa
excursão pelos nossos Sertões, devendo percorrer zonas até hoje jamais
transitadas por estrangeiros, sendo possível que com o seu intrépido
companheiro faça a exploração de um Rio que nunca foi estudado. Essa viagem
será para Roosevelt talvez a mais bela página das suas ousadas aventuras pelas
florestas. Chamado pelo Governo, é provável que chegue hoje a Manaus o Coronel
Rondon dali partindo hoje mesmo em um dos paquetes do Lloyd, devendo aqui
aportar poucos dias depois daquele ilustre viajante. [...] Seja bem-vindo o
grande amigo do Brasil. (O PAIZ, n° 10.602)
Bibliografia
O
PAIZ, n° 10.594. A Vinda do Sr. Roosevelt – Brasil – Rio de Janeiro, RJ
– O Paiz, n° 12.594, 09.12.1913.
O
PAIZ, n° 10.602. Roosevelt - A Sua Próxima Chegada a Esta Capital –
Brasil – Rio de Janeiro, RJ – O Paiz, n° 10.602, 17.10.1913.
Solicito Publicação
(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de
Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;
· Campeão do II
Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)
· Ex-Professor
do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA) (2000 a 2012);
· Ex-Pesquisador
do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);
· Ex-Presidente
do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);
· Ex-Membro do
4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)
· Presidente da
Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);
· Membro da
Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);
· Membro do
Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);
· Membro da
Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)
· Membro da
Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
· Comendador da
Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)
· Colaborador
Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).
· Colaborador
Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
· E-mail: hiramrsilva@gmail.com.
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